domingo, 27 de agosto de 2023

A DIALÉTICA ENTRE ETIQUETA E ÉTICA.

Analisar a Etiqueta numa perspetiva filosófica será algo, provavelmente, inusitado, principalmente para quem considera a Etiqueta como um “adorno cultural” das relações públicas sociais e também privadas, muito bem desempenhada pelo género feminino, havendo, até, quem faça “chacota” das regras que são próprias daquele ramo do saber, principalmente as pessoas do sexo masculino, para quem o importante é apenas o saber-fazer, noutras áreas.

Portanto, parece pertinente refletir, um pouco, sobre um domínio das relações humanas e sociais que tem sido tão maltratado, como aliás outras áreas importantes da boa convivência, como é, por exemplo, a que resulta das boas-práticas de cidadania, entre outras.

Atualmente, estes dois domínios do conhecimento, estão tão interligados que, estudados até às últimas causas, e posteriores consequências, aos quais se poderia acrescentar a ética e a moral, seria relativamente fácil concluir que eles, como que constituem os fundamentos das relações humanas e sociais, em quaisquer contextos e que por sinal, dada a delicadeza, exigem muita prudência.

Aqui, porém, pretende-se, refletir sobre a importância da Etiqueta, como intervenção genuinamente humana, suportada, obviamente, com abordagens de outras áreas do conhecimento, que podem justificar a necessidade das boas práticas, com suporte dos diversos ramos da filosofia, recorrendo-se a diferentes temas, ao longo do tempo, e de alguns autores especialistas nas respetivas matérias.

 A Etiqueta, tal como quaisquer outras atividades, exige competências específicas, não abdica do máximo rigor, da maior sinceridade e, acima de tudo, de grande delicadeza. Intervir, por exemplo, num evento, ou no contexto de uma profissão, pressupõe uma competência e maturidade acima da média, o que implica que: «Para sermos adultos maduros e autoconfiantes, temos de ser diferentes, sendo verdadeiros e segundo algumas diretrizes. Podemos ser diferentes de todo o mundo se adotarmos padrões mais elevados de conduta em nossa própria vida pessoal e profissional. Além disso, podemos nos apresentar melhor, mais limpos e mais bem arrumados do que as pessoas que nos rodeiam. É muito mais conveniente comparecer a um evento ou a uma reunião com uma aparência um pouco melhor – e não um pouco pior – que a dos outros.» (POLE, 1998:54).

Naturalmente que tais diretrizes não deveriam ser forçadas, encenadas ou premeditadas, sob pena de, a qualquer momento, o “verniz” que delas resulta “estalar” e deixar a descoberto a verdadeira natureza da pessoa que utiliza tais recursos. Pretende-se, isso sim, Etiqueta com Ética, com profissionalismo, espontaneidade e franqueza. Então, conduzindo este domínio do saber para um modo de agir, para uma intervenção eficaz, mas também afável, onde se destaque uma conduta correta, os resultados, mais cedo ou mais tarde, far-se-ão sentir pela positiva.

O importante é que se tenha sempre presente que: «A Conduta ou postura é a maneira de agir, atuar, comportar-se em observância a princípios, valores, orientações e regras. Este fator possui uma caraterística interessante: é o único que todas as pessoas podem possuir em igualdade de condições, independentemente da posição ou formação, pois é fruto apenas da vontade.» (RESENDE, 2000:45).

A conduta, para uma Etiqueta adequada às diversas circunstâncias da vida, depende, portanto, da vontade de cada pessoa, a que se acrescentaria, desejo no sentido de aprender e interiorizar regras e costumes de delicadeza, de amabilidade, de boas-maneiras, até porque, pensando bem, nada se ganha com atitudes bruscas, ofensivas e indignas.

São incompreensíveis, e inaceitáveis, certos comportamentos, em diversos contextos, pelos quais se verificam violações aos mais elementares direitos das regras de cortesia, tornando esta sociedade, já em pleno século XXI, uma verdadeira incógnita quanto ao futuro, que se deseja o melhor de sempre, para as atuais gerações.

Quando se analisam reações face a determinadas situações, torna-se difícil compreender que elas ainda posam acontecer. Não se percebe, como é possível determinados extratos da população, dos diversos quadrantes políticos, sociais, culturais, desportivos, religiosos, profissionais, empresariais, escolares e financeiros, entre outros, terem comportamentos tão radicais, abaixo da racionalidade humana. Que garantias pode, hoje, a comunidade do futuro apresentar, quando esta sociedade não se preocupa com as boas-práticas dos valores essenciais à boa conivência, aqui no sentido Ético, imbuído de regras mínimas de Etiqueta?

Obviamente que se aprecia: a formação tecnológica; que se considera imprescindível a investigação científica; e que se coloquem em prática todos os resultados a que se chegar. A tecnologia e a ciência, moderadas pela bioética, são dois dos pilares para um mundo com melhor qualidade de vida, porém, não serão, porventura, os únicos.

 

Bibliografia

 

POLE, Timothy, (1998). Ser Você. Tradução, Arlete Dialetachi. São Paulo: Editora Angra, Ltda.

RESENDE, Enio, (2000). O Livro das Competências. Desenvolvimento das Competências: A melhor Autoajuda para Pessoas, Organizações e Sociedade. Rio de Janeiro: Qualitymark

 

 

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domingo, 20 de agosto de 2023

ESTADO PEDAGÓGICO

 A problemática que se pretende analisar é tremendamente acessível, tão simples que a grande maioria dos cidadãos, quando em confronto com o Estado, quase sempre perde a questão que deu origem à divergência, porque o próprio Estado se escuda na Lei que ele mesmo elabora, aprova, fiscaliza, executa e sanciona, sempre que pode, a seu favor, invocando o argumento que o protege a ele mesmo e culpabiliza o cidadão, sob a forma do princípio jurídico-legal, segundo o qual: “A ignorância da Lei não aproveita ao seu infrator”, logo, “todos devem conhecer a Lei”. O Estado raramente utiliza processos pedagogicamente fiscalizadores e corretores de situações anómalas, preferindo, na maior parte dos casos, a intervenção repressiva e punitiva.

Mas o Estado, na circunstância que se deseja abordar, tem o rosto dos respetivos dirigentes que, antes e depois das correspondentes funções, transitoriamente desempenhadas, justamente à custa da confiança que o cidadão-eleitor neles depositaram, seja no grupo político, seja diretamente no próprio governante.

No exercício das funções que lhes foram cometidas, tais cidadãos, agora investidos de poderes especiais, devem ser os primeiros a cumprir a Lei: com equidade, com tolerância, compreensão e pedagogia preventiva, sem estratégias e processos persecutórios, sem espírito punitivo e, quantas vezes, injusto.

Os titulares de cargos públicos, por eleição, são os legítimos representantes do povo e, em Democracia Representativa, o valor Justiça deveria funcionar sempre nos dois sentidos, tal como o valor igualdade de tratamento, de tolerância e da responsabilidade recíproca.

O Estado representativo, em Democracia, e num regime jurídico justo, deve cumprir, tal como exige ao cidadão comum, quando este se prontifica a obedecer à Lei, depois de chamado à atenção, inclusivamente, com efeitos retroativos, se isso for legal, então, de igual forma, o Estado, através do Departamento competente que ao caso couber, deve cumprir, também ele, retroativamente, tudo o que for devido ao cidadão.

Instituir taxas, impostos, derramas e outros instrumentos de cobrança, por serviços prestados, estabelecer normas fiscais sobre atividades, rendimentos e penalizações, entre outras tarefas, são funções que o Estado Democrático de Direito tem competência, legitimidade e legalidade para exercer, e que deve fazê-lo com equidade e oportunidade, dentro dos prazos, incluindo as respetivas tolerâncias. 

O Estado deve dispor de receitas suficientes, que lhe permitam desenvolver os programas: sociais, económicos, educativos, saúde, acessibilidades, transportes e tantos outros domínios da esfera pública. O Estado, através dos respetivos titulares dos diversos Departamentos, deve ser o exemplo da sobriedade, do rigor, da austeridade, transparência, isto é, o paradigma da boa e justa governação e de pessoa de bem.

A aplicação da Lei, pelos Órgãos competentes do Estado, deve ser igual para todos, e quando o Estado legisla, em favor de um determinado grupo económico, desportivo, cultural ou outro, ignorando o cidadão anónimo que, quantas vezes, tem mais dificuldades em pagar os seus impostos, do que um grupo empresarial ou instituição desportiva está a discriminar, pela negativa, o cidadão, individualmente considerado, o que não é justo.

Num estado Democrático de Direito, a dimensão cívica dos cidadãos deve ser garantida e salvaguardada, pelo exercício pleno da cidadania que, obviamente, se deseja ser igual para todos, inclusivamente, para a participação fiscal de cada indivíduo ou grupo. Em bom rigor: «Na prática, o direito de participação pressupõe a reunião de quatro condições: a autonomia da vontade, a nacionalidade, o domicílio, o pagamento de impostos» (MADEC & MURARD, 1998:91).

O Estado Democrático de Direito, enquanto entidade concreta, física e responsavelmente representada nos seus inúmeros Departamentos, orientados e servidos por pessoas concretas, também elas cidadãos de deveres e direitos, tem a obrigação indeclinável de dar exemplos de compreensão, tolerância, resolução justa, equitativa e isenta das situações complexas, nomeadamente por: indivíduos, empresas, grupos e associações lhe apresentam; deve legislar objetivamente, sem lacunas, por vezes, deixadas nos textos jurídico-legais; sem ambiguidades, porque de contrário a segurança do Direito é posta em causa e, rapidamente, descredibilizada. 

A interpretação da norma jurídica, parece que está cada vez mais, na dependência do parecer deste ou daquele grupo de advogados, juristas, magistrados e constitucionalistas, sendo certo que na decisão final, muitas vezes, sempre acaba por prevalecer a interpretação do Estado, através dos seus próprios Tribunais: Judiciais, Administrativos, Arbitrais, de Polícia, de Família, de Trabalho, Marítimo, de Comarca, de Círculo, Supremo e Constitucional. 

Além disso, na defesa dos seus legítimos interesses, o cidadão de menores recursos, nem sempre tem acesso a uma defesa consistente, empenhada e detentora de boas técnicas, estratégias, metodologias, experiências adquiridas ao longo de uma carreira, porque não pode pagar, por exemplo, a prestigiados causídicos, e/ou grupos/associações de advogados que, em muitas situações, funcionam como autênticas empresas da interpretação do Direito, no sentido de construírem a melhor defesa para o constituinte, incluindo a estratégia de esgotar todos os prazos e recursos, até atingir a prescrição do ato que esteve na origem do processo. É evidente que tudo isto custa muito dinheiro, e o pobre não o tem.

O Estado quando legisla, em parte, já está a colaborar com todo um sistema assim instalado e, desta forma, prejudica o exercício da cidadania, no que se refere ao acesso a uma Justiça oportuna, célere e igualitária para todos, porque em certas circunstâncias, privilegia uma minoria de ricos, em prejuízo da maioria de pobres, pouco esclarecida, quanto aos seus direitos e conhecimento da legislação (até neste aspeto o Estado é desleal para com o cidadão, porque através da Lei, determina que a “ignorância da norma jurídica não aproveita ao seu infrator”, porém, os serviços do Estado, beneficiam de todos os meios para conhecer e aplicar a Lei, precisamente, também, à custa dos impostos daqueles que não a conhecem, porque não podem assinar, e/ou não sabem consultar o Diário da República).

 

Bibliografia

 

 

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, (2004), Versão de 2004. Porto: Porto Editora.

MADEC, Annick; MURARD Numa, (1995). Cidadania e Políticas Sociais, Tradução, Maria de Leiria. Lisboa: Instituto Piaget

TRINDADE, António Manuel Cachulo da, et al, (2003). Administrar a Freguesia, Coimbra: Fundação Bissaya Barreto, Instituto Superior Bissaya Barreto, março/02.

 

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domingo, 13 de agosto de 2023

Sistema Político de Silvestre Pinheiro Ferreira (1769-1846).

Hoje, terceira década do século XXI, sabe-se que Pinheiro Ferreira (1769-1846) nunca deu quaisquer indícios de que pretendesse para o Brasil, algo que do seu ponto de vista, fosse contra os direitos do povo brasileiro, pois o que ele mais temia era a destruição do Brasil, por isso, entendia como solução mais adequada a união dos dois territórios sob a mesma coroa, com dois monarcas, mantendo-se D. João VI como imperador do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves.

Cometer-se-ia uma injustiça contra Silvestre Ferreira, se não se destacasse aqui a sua estima e admiração pelo povo brasileiro (cultura, tradições e crenças), cuja dignidade e inviolabilidade são por ele reivindicadas, perante a arrogância sobranceira dos imigrantes europeus que demandavam o Brasil. Com efeito: «a maior parte dos europeus, que pisaram o solo do Brasil, nem eram homens de bons sentimentos, nem de educação; e por isso na oficiosidade, na condescendência, na hospitalidade dos brasileiros não descobriram senão servil respeito e baixeza, que só serviu a inflamar o orgulho da sua imaginada superioridade.» (FERREIRA, 1834c.373).

Como outros ilustres defensores da monarquia, nomeadamente D. Rodrigo de Sousa Coutinho e o Conde de Palmela, Pinheiro Ferreira empenhou todos os seus conhecimentos técnicos, diplomáticos e políticos, para modernizar as instituições monárquicas, de forma a melhor servirem os interesses do povo.

O seu esforço é, consensualmente, reconhecido, especialmente nos domínios político-filosóficos. Sabe-se que: «a contribuição de Silvestre Pinheiro Ferreira revestiu-se do maior rigor técnico. O estadista português compreendeu que ao lado da definição dos direitos individuais, da fixação dos limites do poder estatal e da estruturação equilibrada dos poderes governamentais, encontrava-se o problema principal: a representação política.» (BARRETO, 1975:474).

A atividade política, democraticamente exercida, é aquela que, por excelência, melhores condições pode criar para alterar situações em, praticamente, todos os domínios da sociedade. Silvestre Ferreira sabia-o, e não ignorava que poderia ter um papel importante, no curso dos acontecimentos da sua época, no espaço luso-brasileiro e, nesse sentido, envolveu-se em complexas situações, aos mais elevados níveis da governação, por isso, desde bem cedo se aproximou do Poder, até como simples conselheiro, junto dos administradores e altas individualidades na medida em que: «não eram só os Ministros a se mostrarem adeptos das inovações e reformas.» (PRADO, 1968: 129 – Nota 91).

O período conturbado da primeira metade do séc. XIX, não favoreceu a implementação e dinamização prática dos Direitos Humanos, defendidos por Pinheiro Ferreira, consubstanciados na exemplaridade da sua vida, plasmados nos muitos projetos que elaborou e pareceres que emitiu.

Só muito mais tarde, após a sua morte, é que cada vez um maior número de estudiosos, com especial destaque para investigadores brasileiros e portugueses, vêm reconhecendo a importância da sua obra jurídico-política na defesa da Cidadania e dos Direitos do Homem, e de um regime democrático e representativo, com divisão de poderes, reciprocamente, equilibrados e controlados, designadamente: «...O constitucionalista Silvestre Pinheiro Ferreira que foi ministro de D. João VI em terras brasileiras nos conturbados anos posteriores à Revolução do Porto até à partida da Família Real para Portugal, e que tanta influência teve no desenvolvimento de uma concepção de estado liberal no Brasil e em Portugal, ao interpretar Constant, entende que o poder neutro, que chama de conservador, deve estar distribuído entre os demais poderes e não sobreposto aos mesmos.» (CERNEV, 1986:31; ESTEVES, 1998:89).

O sistema político de Silvestre Ferreira embora, pareça jogar numa certa diluição entre os vários poderes que o constituem (Eleitoral, Legislativo, Judicial, Executivo e Conservador), o facto é que tais poderes estão bem caraterizados, definidas as suas competências e estabelecido o seu funcionamento, o que vem beneficiar o regime monárquico-constitucional e democrático, no que respeita à observância do exercício dos Direitos, Liberdades e Garantias, ao contrário de um poder absoluto, centralizado e ditador.

Na descrição que faz de cada um daqueles poderes, Pinheiro Ferreira antepõe-lhes algumas reflexões de notável profundidade e atualidade democrática. Por exemplo, a propósito do Poder Eleitoral afirma: «Ao grande júri eleitoral, único tribunal da opinião pública, pertence distribuir os empregos aos candidatos, segundo suas capacidades, e recompensar os cidadãos, segundo os seus merecimentos.» (FERREIRA, 1834a:112).

Adotando o mesmo critério, relativamente ao Poder Legislativo, defende que o legislador terá o dever de proporcionar as condições legais para o bem geral do Estado, no sentido de criar direitos e deveres, iguais para todos os cidadãos, por isso: «O mandato do legislador não é um poder absoluto. Toda a lei de privilégio contrária à lei comum seria um atentado. Toda a lei comum contrária às condições do pacto social seria prevaricação.» (Ibid.:142). Crítica velada ao absolutismo e condenação duma política de privilégios, que violava a lei comum, o que contrariava os seus valores democráticos.

No que concerne ao Poder Judicial, dantes como hoje, tão sensível quanto fundamental para a boa aplicação da lei, e a correspondente realização da Justiça, Pinheiro Ferreira tem uma visão interessante, e extraordinariamente coincidente com as preocupações que hoje nos fazem meditar, quando num contexto democrático de plena liberdade, se verifica que o sistema judicial, principalmente em Portugal, não consegue a realização plena, objetiva e pertinente da Justiça, julgada adequada aos acontecimentos e aos intervenientes, sejam estes arguidos/réus ou vítimas.

E se: por um lado, a separação dos poderes é fundamental para o bom funcionamento das instituições; não menos essencial é que, a cada poder, sejam atribuídas as respetivas competências, em lei própria, que deve estabelecer os limites da jurisdição do poder que regula.

Para que a lei se aplique, dispõe o Poder Judicial de tribunais, forças policiais e estabelecimentos prisionais, e/ou de correção porque: de facto, o objeto deste importante Poder consiste em decidir as causas criminosas ou civis ocorridas na sociedade; por isso é essencial que a população confie no sistema, conforme refere Pinheiro Ferreira: «O Poder Judicial não pode ser exercido senão por juízes revestidos de confiança das partes e da nação.» (Ibid.:183).

Na composição do Poder Executivo, Silvestre Ferreira considera dois aspetos muito importantes e complementares: por um lado, o monarca; por outro, uma burocracia ordenada de forma hierárquica. No entanto, a direção do governo pertencerá a uma única pessoa – o monarca – atuando os restantes elementos, com os seus meios, capacidades e especialidades, na dependência daquele. Neste Poder Governamental, a cooperação é articulada pelo monarca, do qual partem as respetivas instruções, existindo um único pensamento. (Ibid.:247). O governo funcionará como um sistema orgânico.

Finalmente, no sistema político delineado por Pinheiro Ferreira, surge um quinto e último instrumento – o Poder Conservador – que não é, exatamente, uma cópia do Poder Moderador de Benjamin Constant, muito embora tenha recebido alguma influência deste, porque este Poder não é originário da realeza. O que se pretendia com ele, segundo Silvestre Pinheiro, era: «fazer guardar os direitos que competem a cada cidadão, e manter a independência e a harmonia de todos os outros poderes políticos a fim de que os agentes de um não usurpem as atribuições de outro.» (Ibid.:322).

A técnica jurídica utilizada por Pinheiro Ferreira, consistiu em retirar aos demais poderes, parte das atribuições conservadoras, constituindo-se o Poder Conservador com elementos daqueles anteriores poderes, reservando-se o exercício deste Poder, na parte que respeita aos direitos civis, a todos os cidadãos, através da figura da petição ou, em último recurso, pela resistência legal.

Nos demais aspetos, o ideal seria criar uma autoridade independente dos restantes poderes, que não tivesse acesso nem exercesse nenhum dos referidos quatro poderes anteriores. Na apresentação e descrição do Poder Conservador, Pinheiro Ferreira afirma que: «sem um Poder Conservador não pode haver independência, harmonia nem equilíbrio entre outros poderes políticos do estado.» (Ibid).

 

Bibliografia

 

BARRETO, Vicente, (1975). “Uma Introdução ao Pensamento Político de Silvestre Pinheiro Ferreira” in: Revista Brasileira de Filosofia, Vol. XXV, (100), S. Paulo: IBF, outubro-novembro, págs. 470-478

CERNEV, Jorge, (1986). “Silvestre Pinheiro Ferreira: Um Teórico Liberal da Monarquia Representativa”, in: Convivium, Vol. 29, nº. 1, São Paulo/SP, Convívio, jan/fev. 1986, Págs. 19-33.

ESTEVES, João Luiz Martins, (1998). “Origem do Constitucionalismo Brasileiro”, in: Paradigmas, Revista de Filosofia Brasileira. Londrina: CEFL, Vol. II, (1). Dez. 1998, págs. 79-92

FERREIRA, Silvestre Pinheiro (1834a). Manual do Cidadão em um Governo Representativo. Vol. I, Tomo I, Introdução António Paim (1998b) Brasília: Senado Federal.

FERREIRA, Silvestre Pinheiro (1834c) Manual do Cidadão em um Governo Representativo. Vol. II, Tomo III, Introdução António Paim (1998b) Brasília: Senado Federal.

PRADO, J. F. de Almeida., (1968). D. João VI e o Início da Classe Dirigente no Brasil, São Paulo: Companhia Editora Nacional. Nota 9L pág. 129

 

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domingo, 6 de agosto de 2023

A Ordem. Valor da Cidadania.

               O mundo, as nações, as comunidades, as famílias e os indivíduos, na sua esmagadora maioria, defendem, entre outros, os valores da:  Ordem, Progresso e Paz –. Abordarei neste trabalho, independentemente dos meios para os alcançar, sendo certo que, se quanto aos conceitos poderão existir diferenças mínimas, outro tanto não acontece quanto aos meios para atingir os fins, havendo, em circunstâncias excecionais, necessidade de recorrer à guerra para se alcançar a paz e, com esta, a Ordem e o progresso.

Em boa hora, e sob a clarividência de cidadãos sábios, o Brasil escolheu dois daqueles valores para o seu lema nacional – Ordem e Progresso: «ORDEM E PROGRESSO é a simplificação de um lema positivista daquela ocasião, atribuído ao filósofo Augusto Conti, que dizia: «O Amor por princípio, a Ordem por base e o progresso por fim». Conta-nos a história que Benjamim Constant foi quem sugeriu este lema a Raimundo Teixeira Mendes, presidente do Apostolado Positivista do Brasil, um dos seguidores de Conti, e que foi o responsável pela idéia da nova Bandeira do Brasil. Com ele colaboraram o Dr. Miguel Lemos e o professor Manuel Pereira Reis, catedrático de astronomia da Escola Politécnica. O desenho foi executado pelo pintor Décio Vilares.» (GOVERNO PROVISÓRIO DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL, Decreto nº 4, de 19 de novembro de 1889).

 A cidadania passa, obrigatoriamente e em primeiríssima prioridade, por aqueles valores, sem a satisfação dos quais, todos os outros ficarão comprometidos e, dificilmente, serão alcançados. A defesa intransigente daqueles valores deve ser uma preocupação de todos os cidadãos, não apenas dos brasileiros.

Nesse sentindo, são fundamentais uma educação e formação para uma axiologia da cidadania, em todas as gerações, idades e posições estatutárias, um trabalho que, depois de iniciado, jamais poderá cessar e que deverá desenvolver-se ao longo da vida de cada pessoa, fazendo parte de uma formação permanente.

A Ordem implica disciplina, respeito, hierarquia e segurança, a começar no próprio indivíduo, nas famílias e nas comunidades locais, nacionais e internacionais. De facto, é preciso ser-se extremamente disciplinado, no sentido de acatar, cumprir, e até, fazer cumprir, as normas jurídicas, sociais, religiosas, políticas e tantas outras que a sociedade impõe, desde logo: para uniformização de comportamentos; disciplina no relacionamento com os outros; no acesso a inúmeros bens e serviços; no desempenho profissional; na consideração devida a colegas e dirigentes.

Disciplina, também, no pensamento, para que, no auge das emoções, os juízos, as decisões e atitudes possam ser racionalmente ponderados e manifestados, respetivamente. Ordem, portanto, no relacionamento com os cidadãos, com as instituições, com a comunidade, no sentido do tratamento igual, determinado por critérios previamente estabelecidos, e assentes na convivialidade assertiva.

Evitar a desordem (que, em muitas situações, conduz ao caos, à anarquia, onde ninguém se entende, onde cada um faz o que lhe apetece, desrespeitando os direitos e interesses dos seus concidadãos), constitui uma estratégia que, certamente, contribuirá para a melhoria da qualidade de vida e da cidadania, em qualquer parte do mundo.

Obedecer à Ordem estabelecida, legítima e legalmente, entendida como um conjunto de normativos, que garante a segurança coletiva e individual, física e jurídica, privada ou pública, é um dever cívico e reflete o respeito pela autoridade instituída. 

É num ambiente de Ordem, disciplina e respeito que se pode avançar para o progresso, a todos os níveis, discricionariamente, o primeiro dos quais, o progresso material dos indivíduos, das famílias, das instituições e da sociedade. A atitude ordeira, enquanto característica essencial da pessoa civilizada, que facilita a resolução de problemas, poderá ser um primeiro contributo positivo.

No Estado Democrático de Direito, a Ordem, em plena liberdade, é um bem inestimável, onde nenhum cidadão pode recear qualquer interferência prejudicial à sua atividade pública, e/ou privada, porque terá a garantia de que os seus concidadãos agem de forma idêntica.

A Ordem é muito mais respeitada, e praticada, numa comunidade livre e responsável, do que numa outra sujeita à ditadura político-repressiva. A liberdade é, portanto, a condição privilegiada da Ordem, nesta se inserindo toda a atividade humana, que visa o progresso em todos os domínios, incluindo a própria civilização.

Liberdade de expressão, de crítica, de ensinar e aprender, de fazer opções em diversas circunstâncias da vida, tudo isto, no respeito pela Ordem democrática. Com efeito: 

«O que é importante é a liberdade de crítica e a liberdade de ensaiar outros caminhos. (…). O processo de aprendizagem processa-se por ensaio e erro. (…). É este processo descentralizado e interpessoal que está na base da nossa aprendizagem, inclusive da nossa aprendizagem moral, quer no plano pessoal, quer no social e até mesmo no plano civilizacional.» (ESPADA, 2007:31). 

Liberdade enquanto pressuposto da Ordem, esta como sustentação do Progresso e da Paz. O regime político-democrático, sendo frágil será, porventura, o grande promotor da Ordem, em liberdade responsável.

A Ordem, enquanto sinónimo de disciplina, respeito, segurança e hierarquia tornar-se-ia em obrigação, tendencialmente, ditatorial, se não fosse acompanhada de progresso, no sentido do desenvolvimento da pessoa humana, e da sua condição de vida.

 

Bibliografia

 

GOVERNO PROVISÓRIO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL, (1889). (DECRETO nº 4 de 19 de novembro de 1889, (Símbolos Nacionais: Bandeira). Sala das Sessões. (Teve modificações pela Lei nº 5.443, de 28 de maio de 1968, depois foi regulamentada pela Lei 5700 de 1º de setembro de 1971, capítulo III secção I, que sofreu alterações pela Lei 8421 de 11 de Maio de 1992. Também encontramos a regulamentação no decreto 70.274 de 9 de março de 1972).

ESPADA, João Carlos, (2007). “Liberdade Implica Responsabilidade”, in: Nova Cidadania, Lisboa: Fundação Oliveira Martins, N. 31, janeiro/março-2007, págs. 30-32

  

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