domingo, 9 de março de 2014

Potencial Humano


Ao longo do processo evolutivo da humanidade, e tanto quanto a ciência e a técnica têm avançado, hoje é possível colocar a pessoa no centro do mundo e, mais do que nunca, o paradigma Antropocêntrico, (pretendendo aproxima-se do Teocêntrico) é uma evidência que, dificilmente, se poderá ignorar, mas também é necessário ter-se a humildade de que seria demasiada arrogância e orgulho o homem querer “endeusar-se”.
Com efeito, o potencial humano está longe de atingir os objetivos que, então, serão surpreendentes, sendo plausível que se possa acreditar nas infinitas capacidades da pessoa e, a partir destas, ter-se a esperança num mundo bem melhor, a todos os níveis: social, económico, financeiro, laboral, entre outros aspetos, onde pontifiquem os valores cívicos da dignidade deste ser maravilhoso, ser que é a criatura, verdadeiramente humana.
No percurso histórico-cultural da humanidade, parece oportuno destacar as superiores faculdades do ser humano que, segundo o nível em que se encontra o estado da ciência e da técnica, não se afigura poder afirmar-se que haverá outros seres, no planeta Terra, que possam superar a pessoa humana, de resto, o mundo está cada vez mais controlado por este sujeito incontornável que é a figura humana, pesem, embora e ainda, algumas situações por resolver.
Continuam por esclarecer fenómenos naturais que escapam à compreensão e ao controlo humano, porém, muito se sabe e avançou no conhecimento e resolução de problemas, até há poucos séculos, considerados insolúveis, designadamente, nos domínios: da medicina, das engenharias e da natureza do próprio planeta, entre outros avanços científicos já consolidados.
É verdade que no que às ciências exatas e à tecnologia, muito se tem investigado, que poderá contribuir para a melhoria das condições de vida de toda a humanidade. Recusar a importância e a imprescindibilidade das ciências é regredir na evolução do mundo, considerado este nas suas vertentes positivas, seguramente no domínio dos valores que caraterizam e diferenciam a espécie humana, por isso, a aposta no investimento científico e tecnológico é uma primeira grande estratégia, que os responsáveis dos diversos setores da sociedade têm que ter em atenção.
E se ao nível das ciências exatas o desenvolvimento tem sido impressionante, principalmente no último século, outro tanto, e com o mesmo otimismo e certeza, não se pode afirmar em relação às ciências sociais e humanas, designadamente no que respeita à aplicação de conhecimentos que visem o respeito pela condição de vida digna das pessoas.
É difícil entender como, apesar de todo o potencial das pessoas, ainda existem em todo o mundo graves e devastadoras situações, que reduzem a pessoa humana à condição mais vil e degradante que se possa imaginar: conflitos, miséria, fome, violências diversas e morte prematura.
Culpabilizar apenas governantes, empresários, cientistas e técnicos constitui uma alienação das responsabilidades individuais que a cada pessoa cabem. Em bom rigor, todos, sem exceção, podem e devem dar o seu contributo válido, para que a soma dos potenciais de cada pessoa se transforme numa fórmula para um mundo mais racional, justo, afetivo e de paz.
Mesmo as pessoas, que por uma qualquer deficiência física ou psico-mental, parecem impedidas de participar no projeto universal de dignificação da sociedade, elas têm um papel importante: chamar a atenção para quem está na posse das suas faculdades naturais e, desta forma, merecerem o respeito, a dignidade e o conforto a todos os níveis, de resto, a que indiscutivelmente têm direito.
A sociedade carece, mais do que nunca, de uma maior preocupação das ciências sociais e humanas, no sentido em que devem contribuir para a revolução das consciências, tendo por objetivo a elevação da pessoa humana à condição máxima da sua superioridade, no que respeita ao bem-estar comum e também à felicidade, pela segurança, pela certeza do direito, pela esperança num mundo mais justo, mais atento às dificuldades individuais, mais respeitador da dignidade da pessoa, porque é necessário: «Combinar exigências, rigor, conciliar conhecimento tradicional com a ciência, a técnica e os novos produtos e conceitos que estas proporcionam.» (cf. CUNHA, et al., 2010:30).
O potencial humano tem de ser colocado ao serviço de todos e não apenas de alguns, ou seja: a inteligência humana não pode servir para aumentar injustiças, sofrimento e morte miserável de muitos, em favor do conforto, do domínio e da felicidade de alguns. É possível todos estarem bem, considerando-se, certamente, os méritos e deméritos de cada pessoa, na medida em que a responsabilidade de contribuir para o bem-comum é de todos, em função das respetivas capacidades e determinação em colaborar num projeto que interessa à humanidade – dignificação da pessoa humana.
É certo que não existem duas pessoas exatamente iguais; é verdade que muitas pessoas não se preocupam o suficiente com o seu próprio bem-estar e, por vezes, até demonstram querer levar a vida com o menor esforço e o maior proveito, portanto, em nada contribuindo para o bem-comum. Estas não têm qualquer razão para se queixarem da sociedade.
Quem assim se comporta não terá legitimidade para exigir o mesmo que aqueles que realmente trabalham, estudam, esforçam-se e economizam, até porque todos têm capacidades inatas e/ou adquiridas, que as devem colocar ao serviço da comunidade, obviamente, também com benefícios próprios, porque de contrário cair-se-ia numa outra injustiça, ou seja: esforçam-se uns para outros que em nada cooperam, nem sequer auxiliam para a melhoria dos objetivos coletivos.
No mundo difícil em que atualmente se vive, no seio das sociedades complexas, algo materialistas, consumistas, em alguns casos, dir-se-ia, perdulárias, cabe aqui, sim, uma intervenção de quem detém alguma forma de poder: político, religioso, económico, financeiro, empresarial, laboral, científico, técnico, no sentido de se unirem pelas: educação, formação, interiorização e boas práticas de valores verdadeiramente humanos, a fim de se conseguir uma maior equidade.
Os exemplos devem partir de quem possui poder, colocando a experiência, a sabedoria, a prudência, os valores e os meios disponíveis ao serviço de projetos que contribuam para uma sociedade equilibrada, sustentável, com as melhores condições de vida, em todos os estádios da existência de cada pessoa.
Continuar a desperdiçar o imenso, ou mesmo infinito, potencial humano para alimentar poderios, estratégias e conseguir resultados da subjugação de muitos, por uns tantos, é o mesmo que equiparar o ser humano à mais retrógrada barbárie. Toda a pessoa tem o dever de colaborar para o bem-comum, é verdade; mas também é justo que lhe assista o direito de beneficiar do produto da sua colaboração e receber ao longo da vida os benefícios para os quais contribuiu.
É uma insensibilidade social inaceitável retirar benefícios a quem lutou e se sacrificou, durante décadas, por eles, na convicção de que, na velhice, por exemplo, teria alguma estabilidade, conforto, tranquilidade e felicidade. Colocar o potencial humano, de quem toma decisões contrárias àqueles objetivos, é o mesmo que se querer equiparar a uma outra espécie animal qualquer, que não a humana! Por isso se considera que a sociedade humana tem todos os recursos, desde logo a começar nos seus constituintes, para ser superior, digna e feliz, em relação a quaisquer outras conhecidas até este momento.
O potencial humano, em todas as suas vertentes: científica, técnica, social, política, religiosa, económica, financeira e axiológica, entre outras, é inigualável e ilimitado, por isso deve ser orientado para a felicidade humana, individual e coletiva, desde que todos contribuam com as suas capacidades, porque em boa verdade acredita-se que: «A felicidade não acontece automaticamente, não é uma graça que um feliz sortilégio possa espalhar sobre nós e que um revês da fortuna nos possa tirar; depende só de nós. Não nos tornamos felizes numa noite, mas à custa de um trabalho paciente elaborado dia-a-dia. A felicidade constrói-se, o que exige trabalho e tempo. Para ser feliz, o próprio indivíduo precisa saber mudar.» (LUCA & CAWALLI-SFORZA, in RICARD, 2005:9).
Chegou o tempo, a partir da verificação da existência de situações dramáticas, de se aplicar todo o potencial humano ao serviço de objetivos altruístas, de dignificação de toda a pessoa humana. Insistir na utilização das capacidades humanas, na construção de um mundo bélico, numa sociedade de minorias detentoras de poderes ilimitados, em domínios de controlo e subjugação das maiorias, continua a revelar-se desastroso para a humanidade e, ainda que esporadicamente, a verdade é que se tem assistido ao derrube violento daqueles que, ao longo da vida, humilharam, exploraram e quiseram controlar, pela força das armas e do poder, aqueles outros que, mais tarde ou mais cedo, sentiram-se injustiçados e reagiram, também, pela força.
O potencial humano de uns e de outros tem resultado, muitas vezes, em mais sofrimento e morte. A pessoa humana acaba por mostrar que, afinal, em certas circunstâncias, não é inteligente, não usa as suas capacidades para o bem de todos e, obviamente, para o seu próprio bem, para a sua felicidade e dos que lhe são queridos. O potencial das pessoas, no exercício dos diversos papéis que desempenham ao longo da vida, tem sido utilizado, muitas vezes, para satisfação de interesses individuais e de grupos restritos, com um egocentrismo perigosamente exacerbado, que apenas conduz ao desastre social.
A sociedade, através dos seus elementos constituintes, tem de iniciar um novo caminho, adotar um novo rumo, demonstrar que o elemento humano tem, de facto, todas as condições para se constituir com dignidade, com respeito pelos seus semelhantes, com o mais elevado nível de conforto e bem-estar, erradicando as maiores chagas que a envergonham, como sejam as desigualdades sociais, as injustiças, as prepotências e arrogâncias de alguns contra muitos, os atentados aos mais elementares direitos sociais e humanos, adquiridos pelo trabalho, pelo estudo e pela poupança, por uma cultura de valores que muitos defendem legitimamente.
Aqui sim, quem tem responsabilidades legislativas, executivas, fiscalizadoras e judiciais, bem como as de natureza: política, religiosa, científica, técnica, económica e financeira tem, agora, mais do que nunca, de colocar os potenciais da inteligência e axiológico, ao serviço do bem coletivo.

Bibliografia

CUNHA, Miguel Pina, et. al., (2010). Manual de Gestão de Pessoas e do Capital Humano. 2ª Edição. Lisboa: Edições Sílabo, Ldª.
RICARD, Matthieu, (2005). Em Defesa da Felicidade. Trad. Ana Moura. Cascais: Editora Pergaminho, Ldª.
 

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo 

Portugal: http://www.caminha2000.com  (Link’s Cidadania e Tribuna)

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