domingo, 1 de junho de 2014

A Sociedade Cultural


O problema da cultura também poderá ser uma “questão de mentalidade” segundo António Sérgio, porque aquela adquire-se muito gradualmente e é comum; esta é uma coisa que não se pode ensinar, pois é o resultado das convicções mais profundas de cada um; por outro lado, Protágoras afirmava que “o homem é a medida de todas as coisas”; enquanto Platão refere que “Deus é que é a medida de todas as coisas”; no entanto, Jorge Dias defende que “o coração é que se torna a medida de todas as coisas” e, finalmente, Ortega sustenta que “na cultura não há caminho, este faz-se no andar porque a cultura é activa, exige sonho, invenção, aponta para o futuro e pressupõe esperança”.
Diversos são os conceitos de cultura, todavia, para uniformização concetual, parta-se da evidência, segundo a qual: a cultura se manifesta nas formas de agir, sentir e pensar, que vão sendo apreendidas; traduz a totalidade do modo de vida de um povo; transmite-se pela tradição oral ou escrita, ritual ou monumental.
A cultura é uma atividade que diz respeito ao homem individual (domínio do subjetivo) e que contém, intrinsecamente, a ideia de transformação no sentido do melhor. É um processo de valorização do homem, um produto do espírito humano, uma sobreformação do caráter, enfim, uma “aristocracia do espírito” no conceito helénico. Uma cultura é sempre uma relação histórica com o passado, uma relação atual com o presente e uma direção para o futuro.
Por outro lado, uma cultura que não possua uma ideia de humanismo a propor, é uma cultura sem fundamento e, como tal, inadequada de se lhe chamar cultura. É imperioso mostrar e desenvolver o que no homem há de puramente humano, porque aqui se revela a função inigualável da Arte, da Literatura e da Filosofia, esta como última forma de cultura que o homem criou.
Entretanto, com as modificações profundas da educação e das inter-relações sociais, o sistema de valores vai-se alterando. O homem transforma-se, paulatinamente, ao longo da História e, ao fim de séculos vividos de várias formas, sob diversos sistemas, enfrenta, hoje, século XXI, um mundo que se evoluciona vertiginosamente.
Os valores fundamentais que ao homem dizem respeito, enquanto pessoa de direitos e deveres, não estão irremediavelmente perdidos mas, talvez, preconceituosamente esquecidos, porque certos valores referenciais a ideais absolutos, eventualmente, serão incómodos, tais como a Família, a Justiça, a Educação, a Saúde, o Trabalho, mais avançadamente, a Cidadania Universal, a Graça Divina, entre outros, onde a equidade de acesso à realização igualitária destes valores não está assegurada.
A capacidade de reflexão pode desenvolver-se em nostalgia ou projeto. O pensamento só vale na medida em que a aplicação material o prossegue, o que significa que algumas questões se colocam, quais sejam: em que medida, reflexão e ação se perseguem, se condicionam, se corrigem e se interdizem? Ou, ainda, em que medida, revolução e cultura se podem articular, isto é, haverá a revolução da cultura ou a cultura da revolução?
Seguramente que não se consegue compreender uma revolução cultural quando, em ações de campanha e dinamização cultural, se vê uma maciça lavagem de cérebros a coberto de uma ação de propaganda partidária, com recursos à linguagem ideológica, com objetivos de conquista do Poder.
A análise do discurso dos outros é feita pelo discurso do inteletual, o qual procura pela ação cultural vincular-se dialeticamente no confronto das classes sociais. Assim, se a revolução política for feita pela cultura, determinando novas formas de cultura, então haverá um primeiro estádio cultural, formado pelas aquisições do conhecimento e pelas projeções do desejo.
Sendo a cultura uma condição fundamental para a compreensão, é bem sabido que esta depende, num ou noutro aspecto, da melhor explicitação possível, o que remete para uma dialética que deve manter uma tensão entre polos de momentos relativos, num processo complexo que conduz à interpretação, que é o apogeu de um processo com uma dimensão epistemológica e ontológica.
Entre explicação e compreensão há uma relação recíproca, considerando que esta só se concretiza desde que aquela coloque claramente o objeto da sua explicitação, ou seja, a compreensão apela à explicação, através de uma situação de diálogo.
Esta relação muito complexa entre Ciências Humanas e Ciências da Natureza, na dinâmica do explicar e do compreender, é portanto, o núcleo fundamental da interpretação, esta a base para uma cultura sólida e, bem assim, para uma correta aplicação do Direito e da Justiça, sem o que não poderá haver organização social.
O homem projeta-se a partir da cultura, para um horizonte de esperança, porque ciente do seu passado, conhecedor dos erros que a História lhe aponta e o motiva para corrigir, ele pode captar, perfeitamente, o seu sentido último, compreender a sua posição no mundo e, neste aspecto, o investimento na cultura poderá permitir delinear uma estratégia antropológica, em ordem ao desenvolvimento da sociedade e ao seu apalavramento com o mundo e com Deus.

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
 
Portugal: http://www.caminha2000.com  (Link’s Cidadania e Tribuna)

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