Repartir pela população a
riqueza nacional é um ato de justiça social, pressupõe coragem, clarividência e
sentido de justiça por parte de quem governa e, portanto, administra os bens
que são de todos e não apenas de algumas elites, porque: «A justiça social diz respeito às formas de distribuição de bens
sociais. (…) A esfera de bens compreende não só a totalidade de objectos
materiais produzidos e distribuídos no interior de uma sociedade, mas também as
funções a serem desempenhadas neste processo de produção e as posições a serem
assumidas nos jogos sociais de atribuição de identidade. (…) Não só aquilo que
possuo é determinado a partir de um conjunto de relações que estabeleço com o
restante da sociedade da qual sou membro, mas também, de certa maneira, aquilo
que faço e aquele que sou.» (MARQUES, 1999:53)
Vem esta citação a
propósito das riquezas imateriais que são transformáveis em riquezas materiais,
como por exemplo, o trabalho/emprego, isto é, pelo trabalho, enquanto dimensão
e valor exclusivamente humanos, chega-se, ou pelo menos contribui, para
alcançar a riqueza material, esta, necessária à vida com qualidade, compatível
com a dignidade da pessoa humana.
Partindo desta premissa,
o trabalho/emprego, como riqueza imaterial, pode-se avançar para um processo de
uma mais justa distribuição da riqueza e uma verdadeira justiça social.
Com efeito, a situação de
desemprego, as desigualdades absurdas entre pessoas humanas, os conflitos
sociais e certas formas de violência, terão a sua origem nesta injusta
distribuição de um bem social como é o trabalho/emprego, porque enquanto certas
pessoas, de determinadas elites, acumulam empregos, funções, representações e
nomeações sócio-políticas, outras, com idênticas (ou até superiores)
capacidades, habilitações e experiências, estão sem trabalho.
No que a Portugal se
refere, e tanto quanto este tipo de informação vem a público através dos órgãos
de comunicação social, raramente desmentida, a situação de verdadeira e
ostensiva injustiça na distribuição de empregos e cargos públicos e privados,
envergonha qualquer sociedade que se pretenda digna, democrática e justa.
A distribuição da riqueza
imaterial, aqui exemplificada no trabalho/emprego, benefícios, embora por seu
intermédio se transforme em riqueza material, na perspectiva de uma genuína
justiça social continua a ser, esta sim, uma utopia, ainda muito distante da
miragem e, finalmente da realidade.
Evidentemente que não se defende uma igualdade
aritmética, uma igualdade sem critérios, uma igualdade sem deveres, uma
igualdade para pessoas iguais, porque não há pessoas iguais.
O que se pretende é
aproximar, inicialmente, por critérios proporcionais aos contributos de cada um
para o todo nacional, às capacidades, empenho, resultados e mérito que cada
pessoa revelar possuir e merecer, respetivamente, porque a igualdade aritmética
absoluta, tornar-se-ia numa desigualdade, também ela prejudicial para os
próprios beneficiários que, conscientemente, ou não, tudo fariam para manter a
situação, concretizada na sua não participação na produção de riqueza, embora
auferindo dos respetivos dividendos, iguais aos daqueles que participaram.
Uma tal situação também
seria injusta, o que se pode corroborar com a seguinte assertiva: «A proporcionalidade da justiça distributiva
dá origem ao problema de um respeito dinâmico pela pessoa: já não se trata só
de respeitar em cada um aquilo que ele tem, mas de lhe garantir oportunidades
de realização pessoal equivalentes às dos outros. Ora estas oportunidades de
realização pessoal equivalentes às dos outros. Ora estas oportunidades dependem
estreitamente do desenvolvimento da vida social, a qual pode ser comprometida
por uma repartição de encargos que desencorajasse as iniciativas. A noção de
justiça é portanto inseparável, apesar do absoluto evocado, de conceção que se
adopta da vida em comum e dos seus objectivos.» (BATIFOLL, 1981:98-99)
Acreditando na bondade do
ser humano, pode-se pensar que é possível melhorar as condições de vida da maioria
das pessoas carenciadas, precisamente a partir de uma redistribuição mais justa
da riqueza, inclusivamente com estímulos ao trabalho para aqueles que, por
opção anticívica, não querem colaborar no desenvolvimento da sociedade em que
se integram e da qual recebem, indiretamente e por via dos impostos que a
maioria paga, subsídios e outras regalias, mesmo sabendo que para eles nada
contribuíram.
Incentivar (ou punir os
que reiteradamente se recusam) ao trabalho produtivo todos os cidadãos,
independentemente da idade e estatuto, excluindo-se, naturalmente, aqueles que
em razão da idade ou invalidez permanente, já não podem dar o respetivo
contributo, é uma estratégia excelente.
Então, os que manifestem
essa vontade de continuar a trabalhar, deverão ser apoiados ainda de forma mais
substancial, caso os seus rendimentos sejam insuficientes, face às despesas,
efetiva e permanentemente, realizadas.
As regras da
proporcionalidade e da carência, objetivamente comprovadas, podem ser alguns
dos critérios para a atribuição dos recursos financeiros e outros benefícios
sociais, em ordem à justa distribuição da riqueza produzida pela sociedade.
Um outro critério,
fundamental para uma mais justa e ampla distribuição da riqueza, deverá
pressupor a participação concreta de todos os cidadãos, atentas as
especificidades e condicionalismos de cada um, na vida comunitária produtiva,
gerando riqueza permanente e, na medida do possível, em sentido ascendente.
Quanto mais e melhor
riqueza houver para distribuir, mais riqueza se produz, porque o círculo
vicioso, aqui no conceito positivo, será favorável para todos, na medida em que
quanto mais o cidadão tiver para gastar no consumo próprio, mais vendas se
efetuam, logo, a produção terá de aumentar, criando-se mais riqueza.
Portanto é essencial que
todos participem no processo produtivo de bens materiais e imateriais, devendo
o Estado dar o exemplo, podendo-se aqui aceitar o Estado como o conjunto de
cidadãos que vivem num mesmo território, com uma língua e história comuns, com objetivos
de ordem, progresso e segurança, idênticos.
Nesse sentido,
concorda-se com um princípio, extremamente oportuno e acutilante, segundo o
qual: «Todos estão obrigados a participar
do Estado, pois todos têm a justiça e sabem os limites (moderação) de seus
actos. Não é preciso que todos os homens sejam arquitectos, pintores,
ceramistas, médicos, etc., porém a virtude da justiça aplicada à política devem
todos possuir.» (PAULA, 2001:117).
Recorda-se que o Estado,
organização política democrática, enquanto constituído pelos diversos Órgãos de
Soberania e respetivos departamentos, é o representante do Estado-povo, tendo à
frente dos seus serviços públicos concidadãos eleitos democraticamente,
representantes da vontade da maioria e concidadãos nomeados para as diversas
funções, competindo-lhes gerir, com isenção e justiça, as riquezas produzidas
por todos.
Bibliografia
BATIFFOL, Henri, (1982). A
Filosofia do Direito, 6ª. Ed., Trad. Eugénio Cavalheiro, Lisboa: Editorial
Notícias, pp. 98-101.
MARQUES, Edgar, (1999).
“Pluralismo Cultural e Justiça Social. Uma Crítica ao Comunitarismo de Michael
Walzer” in Reflexão, Campinas: PUC –
Pontifícia Universidade de Campinas, N. 73, 53-60, Janeiro/Abril/1999
PAULA, Ricardo Henrique Arruda de, (2001).
“Reinterpretando a Ética e a Justiça na Filosofia dos Sofistas”, In Phrónesis,
Campinas: PUC-Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Vol. 3 (1), pp.
108-124, Jan/Jun. 2001
Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
E-mail: bartolo.profuniv@mail.pt
Blog Pessoal: http://diamantinobartolo.blogspot.com
Portugal: www.caminha2000.com (Link Cidadania)
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