Pelo estudo do folclore e
da etnografia, melhor se pode compreender o passado que é parte de toda a
pessoa, raiz da existência humana e suporte de uma cultura, neste caso, a
portuguesa, a qual se revela no modo de vida de um povo, na sua forma de agir,
sentir e pensar, com base num conjunto de princípios, valores, sentimentos e
práticas, e que estão adequados à persecução de um ideal.
Ela, a cultura, é sempre
uma relação histórica com o passado, um reviver no presente numa direção para o
futuro. O ser humano é portador da cultura do passado, mas também produtor de
uma cultura do presente, que se acumula em princípios, normas, ideias e
sentimentos e que, inevitavelmente, se transmitem aos vindouros, numa linha
para o futuro.
Portugal, talvez mais do
que nunca, atravessa hoje várias crises, também de natureza cultural, muito
profundas, consoante as abordagens que se façam e a perspetiva que se pretenda
publicitar. Certo é que, efetivamente, o português de hoje parece revelar um
certo complexo do passado, ignorando o perfil temperamental que o carateriza.
Procura-se omitir
determinados conhecimentos do pretérito, valorizam-se banalidades, ditas
vanguardistas, e ironiza-se, depreciativamente, muitos princípios, valores,
sentimentos e práticas fundamentais, procurando, afinal, sob a capa de um
modernismo, dito original, inovar e recriar costumes e situações que desde há
séculos foram parte integrante das tradições e cultura portuguesas.
Mas, apesar disso, a
crise revela-se mais acentuadamente no facto de o homem atual não saber o que
quer, não possuir ideais pelos quais lute, e nos quais se venha a sentir
realizado, como pessoa verdadeiramente humana.
O homem português tem
que, face aos poderosos meios científicos e técnicos ao seu alcance, assumir a
sua cultura, com tudo o que ela comporta, sem vergonhas nem complexos, retirar
do esquecimento as suas seculares tradições, recapitular o mundo antigo,
antecipar para o futuro o classicismo greco-romano, do qual e de resto nasceram
valores inestimáveis, nomeadamente: a Honra, o Respeito, o Humanismo, o
Direito, a Justiça, a Fraternidade, entre muitos outros, hoje tão ignorados, ou
ridicularizados, ou pelo menos, não assumidos.
Neste caso, todos aqueles
grandes princípios, valores e sentimentos que, entre outras religiões, o
Cristianismo encerra, consubstanciados no Amor, na Verdade, na Solidariedade,
na Lealdade, na relação antropológica do “Eu-Tu”, sob a Luz de um Ser Absoluto
e Supremo que de facto tudo fundamenta, é que dão esta dimensão inigualável da
pessoa verdadeiramente humana.
Apesar do que fica
escrito, a cultura portuguesa não está, ainda, completamente degradada, porque
os cidadãos, inseridos numa civilização do tipo ocidental, conseguem, não obstante
os vários movimentos super nacionalistas, manter uma certa referência ao
passado e uma distinção em reação a outros tipos civilizacionais e, como que
“renascendo das cinzas”, mostrar aos parceiros internacionais um valioso
património cultural, com base no sentimento emocional que carateriza a cultura
portuguesa.
Esta cultura nacional é
um processo de valorização do humano, mais de formação de caráter do que
transmissão de saberes, dentro de um rigoroso conceito de humanismo, através da
arte, da literatura, da filosofia e do vasto leque das outras ciências sociais
e humanas.
Exatamente dentro deste
espírito, parece lógico e razoável que os governantes portugueses,
independentemente das ideologias político-partidárias, dinamizem todo um
processo educacional em ordem à assunção dos valores mais tradicionais, e
também em relação à salvaguarda dos princípios universais aceites pelo conjunto
das nações.
Nesse sentido,
justificam-se, plenamente, a desilusão, praticamente generalizada, sobre a
desvalorização que certas disciplinas vêm tendo nos currículos do ensino em
Portugal. A pouca carga horária, por exemplo, atribuída à disciplina de
Filosofia, provoca, seguramente, uma certa “acefalia” no pensamento português,
reduzindo a pessoa a uma mera máquina do sucesso material, robotizando-a
naquilo que ela tem de mais profundo e livre que é o seu próprio pensamento, o
seu “Eu”, a sua capacidade crítica, afinal, parte integrante da cultura.
É indubitável que, nas
horas mais difíceis, deve triunfar a parte melhor que existe dentro do homem,
mas para que tal se verifique ele deve possuir formação humanística, deve ser
culto e, na posse destes dois elementos, ele será, obviamente, solidário,
amigo, leal, compreensivo, tolerante, inteligente, encontrando as soluções
corretas e justas, para os problemas mais delicados.
O homem sem cultura é
como um prisioneiro de preconceitos absurdos, isolado do seu contexto
histórico, cultural, social e também religioso. A Cultura dá esperança ao homem
e esta é a “última a morrer”, constituindo, por isso mesmo, uma saída para as
crises e para a projeção de um futuro mais promissor, porque sem esperança o
homem não tem destino, não idealiza um projeto de vida e jamais alcançará a
felicidade suprema da realização pessoal, enquanto pessoa humana de deveres e direitos,
enquanto “animal de cultura”, dotado de inteligência e vocacionado para as mais
elevadas realizações ecuménicas.
Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
Blog Pessoal: http://diamantinobartolo.blogspot.com
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