domingo, 19 de novembro de 2017

Preparação Axiológica do Interventor Social

A atividade social, globalmente considerada, a partir da preparação e intervenção individual, fora do âmbito dos técnico-especialistas, pressupõe, também, neste contexto, a posse de alguns requisitos inatos e adquiridos, para que a intervenção resulte profícua e solucionadora, dos problemas que lhe estão na origem.
Naturalmente que, mais tarde ou mais cedo, preferencialmente quanto mais cedo melhor, a intervenção do especialista, com suporte técnico-legal, será imprescindível. Entretanto, cada cidadão pode (e deve) preparar-se para acudir àquelas situações que, numa primeira intervenção, são localizadas, controladas e apoiadas empiricamente. Evidentemente que esta preparação sumária se consegue no seio da família, suficientemente estruturada, organizada e consciente de seus deveres.
Resulta daqui reconhecer-se a maior importância, e o papel fundamental, que a família pode exercer na preparação dos seus membros, para boas intervenções sociais, desde já, em relação a outros elementos da família mais extensa, como na pequena comunidade de vizinhos, em que ela está integrada.
A recuperação, com as devidas adaptações, da família tradicional, poderia ser uma via para a interiorização do dever social que a cada indivíduo compete, face ao seu semelhante, porque se tem como cientificamente adquirido que: «Nas sociedades tradicionalistas e estáveis, a família se revela, sempre, instituição forte, de grande influência no todo social, a ponto de haver quem sustente que a sociedade não é resultante do agrupamento de pessoas, mas sim de famílias, tão unas e semelhantes a individualidades se apresentam estas, frente ao conjunto social.» (ROSA, 1972:87).
Indiscutivelmente que faltará provar que o indivíduo, nascido e criado no seio de uma tal família tradicional se garanta, por esse facto, como podendo vir a ser um bom técnico de Serviço Social; a inversa é, igualmente, suscetível de idêntica dúvida, porque se sabe que, atualmente, a família, entendida no seu conceito clássico, estará a atravessar dificuldades.
Assim: «Já na moderna civilização, em que se observa a presença de uma sociedade extremamente dinâmica, operou-se um enfraquecimento dos laços de coesão do grupo familiar, submetido a numerosas tensões oriundas de causas internas e externas, diante da fragmentação de interesses e a expansão do individualismo e em face das inevitáveis influências sócio-económicas do mundo actual.» (Ibid.:87).
Na coerência do raciocínio, igualmente se pode afirmar que um indivíduo nascido e criado no seio de uma tal família moderna, não possa vir a ser um excelente especialista no domínio social. Inofensivamente pode extrair-se a ilação, segundo a qual, independentemente das origens de cada indivíduo, a formação social é fundamental para, em contexto profissional, ou no âmbito dos deveres de cidadania, se exercer responsável e eficazmente uma intervenção social eficiente, casuística ou filantrópico-altruísta.
O homem, na sua liberdade plena, determina-se por princípios e valores, prévia e conscientemente selecionados e assumidos, ainda que, num espírito de integração harmoniosa e inteligente, condicionados por uma cultura, tradições, religião e todo um edifício jurídico-político.
O valor Liberdade, no âmbito de uma Filosofia Humanista-Personalista, implica a observância rigorosa do dever, da responsabilidade, daquele e desta sobressaindo a intervenção social, que constitui uma prerrogativa especial e nobilíssima, quando exercida com sentido de justiça e respeito pela pessoa carenciada de apoio social, seja qual for a natureza daquela e o tipo deste.
É o mínimo que se exige a esta mulher e este homem cultos, da sociedade civilizada e moderna, seguindo, e aceitando, a linha do pensamento, segundo o qual: «A consciência do dever e o sentido de responsabilidade patenteiam a existência de capacidade pessoal de ser origem de um sucesso. Porque a pessoa tem iniciativa e é autora de suas acções, tem que enfrentar as consequências da sua actuação e responder pelo realizado. Por esta via – a da acção – se introduz a medida do bem e do justo. O acto livre recebe o seu sentido plenário, não pela simples actuação, senão pela recta actuação.» (VALLE, 1975:151).
Um espírito construído a partir de uma Filosofia de Valores, objetivamente direcionados para o Serviço Social, facilitará a formação intelectual, axiológica, profissional e prática do técnico interventor na comunidade que, apoiado nos diversos instrumentos de recolha, análise e avaliação de dados, poderá produzir um trabalho rigoroso e justo.
Não basta interpretar e aplicar, literalmente, o preceito jurídico-legal em vigor, se não houver um certo doseamento de uma sensibilidade, assente em valores sociais, para apreciar uma determinada situação; será insuficiente o conhecimento de muitas e belas construções teóricas se na prática elas são inexequíveis, face aos valores que devem ser observados no respeito devido à dignidade da pessoa humana, em todas as suas dimensões: social, cultural, política, religiosa, antropológica, axiológica e outras.
Aliás, uma bem elaborada e interiorizada axiologia social, dinamizada por princípios sinceros de “querer-ajudar” o outro, pode facilitar a tarefa de todos aqueles que, a título profissional ou voluntário, intervêm na sociedade: «Aquele que nega todos os valores, nada mais vendo neles do que ilusão, não poderá deixar de falhar na vida. Aquele que tiver uma errada concepção dos valores, não conseguirá também imprimir à vida o seu verdadeiro e justo sentido. Também esse fatalmente falhará na vida, a não ser que o destino benévolo o preserve de todas as más situações que venha a criar. Pelo contrário, todo aquele que conhecer os verdadeiros valores e, acima de todos, os do bem, e que possuir uma clara consciência valorativa, não só realizará o sentido da vida em geral, como saberá ainda achar sempre a melhor decisão a tomar em todas as suas situações concretas.» (MONCADA 1946:20-21).
É óbvio que em qualquer atividade, profissão, ocupação ou intervenção, é indispensável dominar-se, razoavelmente, os respetivos conhecimentos, técnicas, recursos e instrumentos de recolha e tratamento de dados e avaliação de resultados.
Igualmente evidente é que ao realizar-se uma determinada tarefa, com entusiasmo, empenhamento e até alguma paixão, os objetivos alcançam-se, naturalmente, pela positiva e, tratando-se de resolver situações concretas, que afetam a vida das pessoas, então estas características são muito importantes.
Trabalhar para as pessoas que, por qualquer motivo, estão envolvidas em situações socialmente anormais, é diferente de trabalhar para a construção de uma ponte, de um qualquer equipamento, porque para estes requerem-se conhecimentos, técnicas, materiais, investigação, atualização; para aquelas, exige-se tudo aquilo, mais uma formação no domínio de uma Antropologia dos Valores, na circunstância, Valores Sociais.
Fomentar uma cultura dos valores é, entre outros, um importante desígnio universal. A Intervenção Social e Comunitária deve revestir-se, também, de atos culturais no seu sentido social, despojados de quaisquer indícios elitistas, intelectualistas e exibicionistas, revestidos, isso sim, da simplicidade adequada e generosidade bastante que a pessoa humana merece: «Todo o acto cultural consiste na realização de um valor. Pode tratar-se de um valor de ordem científica, ética, estética ou religiosa (incluindo na ordem ética o domínio social e jurídico).» (Ibid. 245).

Bibliografia

ROSA, Filipe A. de Miranda, (1972). Patologia Social, uma Introdução ao Estudo da Desorganização Social, 4ª Ed., Rio de Janeiro: Zahar Editores.
VALLE, Agustin Basave F. del, (1975). Filosofia do Homem (Fundamentos de Antroposofia Metafísica), Trad. Hugo de Primio Paz, apresentação de Adolpho Crippa, São Paulo: Editora Convívio.
MONCADA, Luis Cabral de, (1946). (Título Desconhecido) Coimbra: Coimbra Editora.


Venade/Caminha/Portugal, 2017

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

Jornal: “Terra e Mar”

Portugal: http://www.caminha2000.com (Link’s Cidadania e Tribuna)

Sem comentários: