O paradigma científico constitui, relativamente a diversos domínios do
conhecimento, um avanço e um bem para a qualidade de vida das pessoas, que
sendo complementado, ou coadjuvado, pelo paradigma tecnológico, possibilita a resolução
dos problemas que afetam a existência físico-biológica do ser humano. A
sociedade pode e deve agradecer às comunidades científicas e técnicas, o que de
melhor usufrui atualmente. Mas a sociedade não pode ignorar que o homem comporta
outras dimensões, outros objetivos, outras realizações.
Aos paradigmas científicos e técnicos, deve-se acrescentar a preocupação
por outras possibilidades de concretização de conhecimentos e comportamentos,
que em muito podem ajudar na formação de uma vida, ainda mais motivadora e
gratificante, uma vida de boas-práticas a partir da aprendizagem,
interiorização e implementação dos futuros paradigmas axiológicos,
ético-morais. Então sim, a humanidade terá as condições necessárias e
suficientes para resolver grande parte dos problemas que ela própria cria, e
hoje vem enfrentando.
Uma nova filosofia da educação, que não exclua nenhum ramo do
conhecimento, nenhuma técnica, que proporcione mais comodidade para o homem,
uma filosofia que conceptualize uma educação e uma escola do futuro, que
abrigue os projetos verdadeiramente dignos da superior condição humana, na medida em que: «Os meios e os fins da educação devem ser completamente remodelados
para satisfazerem as exigências da actual crise cultural e se harmonizarem com
as descobertas das ciências do comportamento. A importância das ciências do
comportamento reside no fato de nos habilitarem a descobrir os valores em que
os homens acreditam mais vigorosamente, quer esses valores sejam universais ou
não.» (KNELLER, 1979:79).
Na verdade, não basta a população ter saúde,
bem-estar material e bens de ostentação, se não houver paz, segurança,
harmonia, compreensão, tolerância, justiça, respeito, autoridade, entre outros
valores que, em princípio, a maioria das pessoas deseja, mesmo quando estão
doentes, não deixam de pensar em tais valores, porque eles são essenciais à
superior condição humana.
O mundo sempre atravessa diversas crises e, ao
longo da História da Humanidade, têm sido muitas as situações idênticas, de
natureza diferente, repercussões mais ou menos graves; da religião à política,
sociais, económicas, pestes e epidemias mortíferas, guerras fratricidas.
Apesar da conflitualidade sempre presente; das
consequências terríveis que têm atingido a sociedade; ainda não se aprendeu e
implementou a solução adequada e que, reconhecendo-se ser difícil, é exequível,
justamente a partir da educação e formação da criança, do adolescente, do
jovem, e tentar, também, junto do adulto, principalmente no seio das famílias e
nos locais de trabalho.
Pensar em melhorar o mundo não é uma utopia para os
cidadãos responsáveis, poderá sê-lo para os céticos, extremistas e todos
aqueles que estão a beneficiar com esta situação de permanente conflitualidade,
e hegemonia de uma minoria sobre uma maioria de oprimidos. Não está em causa
quem governa democrática e legitimamente. Contesta-se, isso sim, quem se serve
do poder para “esmagar” aqueles a
quem devem esse mesmo poder.
Uma nova filosofia para a melhoria da educação,
através do enriquecimento dos paradigmas técnico-científicos, poderá ser um bom
princípio a incutir nas crianças de hoje, e que no futuro serão os adultos que
irão governar o mundo, em todos os setores da intervenção humana. O
enriquecimento dos atuais paradigmas passa pela introdução de valores,
boas-práticas, virtudes e sentimentos verdadeiramente humanos.
O cientista, o técnico, o pragmático, serão tanto
mais humanos quanto melhor integrarem nos seus comportamentos
sócio-profissionais as regras da boa-convivência, da responsabilidade e do
compromisso. O homem, independentemente do seu estatuto, deverá ser um cúmplice,
leal e firme no exercício de práticas saudáveis, no relacionamento com os
outros, sem ter que abdicar dos seus valores, direitos e deveres, obviamente,
num quadro jurídico-legal e legitimamente institucionalizado, à luz da sua
própria cultura antropológica. Um ser comprometido com a sociedade que escolheu
para viver e conviver. Um ser engajado com as soluções que propiciem um futuro
melhor para a humanidade.
Atualmente, verifica-se grande dificuldade,
praticamente, em todas as atividades, em as pessoas assumirem responsabilidades,
comprometerem-se com a efetivação de determinadas práticas e comportamentos,
recorrendo-se, exaustivamente, a uma postura que, diplomaticamente, se
convencionou denominar do “politicamente
correto”, permanecendo-se em posições dúbias, não assumindo o “sim”, nem o “não”, mas como se diria na gíria, o que será mais seguro é o “nim”
Ninguém se quer comprometer e assim ninguém é
responsável por nada, o que, em bom estilo português, “a culpa deve morrer soleira”, isto é, não tem responsáveis.
Impõe-se uma educação para o compromisso, para a responsabilidade, até porque
será no comprometimento que a solidariedade, a amizade, a lealdade, a
reciprocidade, a consideração, a estima e o humanismo, têm a oportunidade de
melhor se manifestarem.
São valores que conduzem a comportamentos que se
integram perfeitamente na realidade técnica, científica e paradigmática, porque
o compromisso, responsavelmente assumido, também é real, ativo e um elemento
fundamental nas boas-práticas.
De facto: «Na
medida em que o compromisso não pode ser um acto passivo, mas praxis-acção e
reflexão sobre a realidade – inserção nela, ele implica indubitavelmente, um
conhecimento da realidade. Se o compromisso só é válido quando está carregado
de humanismo, este, por sua vez, só é consequente quando está fundado
cientificamente. Envolta, portanto, no compromisso do profissional, seja ele
quem for, está a exigência de seu constante aperfeiçoamento, de superação do
especialismo, que não é o mesmo que especialidade. O profissional deve ir ampliando
seus conhecimentos, em torno do homem, da sua forma de estar no mundo,
substituindo por uma visão crítica a visão ingénua da realidade, deformada
pelos especialismos estreitos.» (FREIRE, 1983:21).
Valores, regras, boas-práticas, fruição de direitos,
cumprimento de deveres, constituem aspetos exclusivos da condição humana,
enquanto entidade pensante, comprometida, dialogante e cooperante com os seus
iguais, em particular; e com toda a natureza, em geral. Nada, nem ninguém, substitui
o ser humano em plenitude, excetuando, obviamente, Deus que tudo pode.
O comportamento, adequado a tais dimensões humanas,
deve ser adquirido ainda no berço e sempre melhorado. O homem, antes de mais, é
um ser pensante, atuante, interrogativo e esclarecedor; problemático e
solucionador; material e espiritual. Os sucessivos obstáculos, que lhe surgem
ao longo da vida, vão sendo vencidos, contornados, adiados ou ignorados, mas o
seu pensamento vai estar previamente presente a qualquer solução prática,
técnico-científica.
O homem é um ser comprometido com a reflexão, com a
praxis e, correlativamente, com os domínios disciplinares da educação, da
formação, da filosofia, esta, uma área do conhecimento com um percurso milenar,
porque ela: «(…) exige um processo no
qual toma distância com o problema para poder compreendê-lo totalmente e ver a
sua implicação em nossa vida concebida como um todo. (…) se a filosofia é o que
nos instrui a viver, e que é instrutiva tanto na infância quanto para as outras
idades, porque não se transmite?” (Montaigne). “Será porque os poderes de todos
os tipos temem que os indivíduos descubram seus recursos internos e se ponham a
pensar por si próprios?» (COHEN-GEWERC, (2007:61).
Os comportamentos técnicos, científicos,
paradigmáticos e da especialização, certamente serão muito melhor
compreendidos, e proporcionarão um bom ambiente humano na comunidade
técnico-científica, se forem integrados num contexto humanista, a partir da
interdisciplinaridade.
A ciência e a técnica, no que à educação e formação
profissional respeitam e forem aplicáveis, muito podem beneficiar e com elas os
seus executivos se, desde bem cedo, se ensinar as crianças a pensarem, a serem
críticas construtivas perante os factos reais, objetivos e quantificáveis, que
são apresentados pelas denominadas ciências exatas.
Uma nova filosofia para a educação implica estudo e
práticas filosóficas, também estas o mais cedo possível na vida de cada pessoa.
As crianças devem ser um alvo preferido, dado que nas suas precoces idades
estão recetivas à curiosidade, a tudo o que é novo, são especialistas na arte
dos “porquês”, então a filosofia
deveria ser um domínio disciplinar do conhecimento que, transversalmente, se inter-relacionaria
com todas as restantes áreas da atividade humana, por isso se justifica que: «A proposta de ensinar filosofia às crianças
está na prática do desenvolvimento do bem pensar ou pensar bem, das nossas
habilidades cognitivas.» (PAGENOTTO, 2006:23).
Bibliografia
COHEN-GEWERC, Elie,
(2007). “Problema e Filosofia”. In Filosofia,
Ciência & Vida. São Paulo: Escala. Nº 6, pp. 60-61
FREIRE, Paulo, (1983). Educação e
Mudança. 8ª Ed. Trad. Moacir Gadotti e Lillian Lopes Martin. Rio de
Janeiro - Brasil
KNELLER, George F.,
(1979). Introdução à Filosofia da
Educação. 5ª Edição revista e actualizada. Nova Tradução. Trad. Álvaro
Cabral. Rio de Janeiro: Zahar Editores
PAGENOTTO, Maria Lígia
(2006). “Perguntas Constantes. Respostas Necessárias”. In Filosofia, ciência
& vida. São Paulo: Escala. Nº 1, pp.16-23
Venade/Caminha – Portugal, 2020
Com
o protesto da minha perene GRATIDÃO
Diamantino
Lourenço Rodrigues de Bártolo
Presidente
do Núcleo Académico de Letras e Artes de Portugal
http://nalap.org/Directoria.aspx
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