No
âmbito da cultura religiosa cristã, esta festa móvel que se designa por Páscoa,
tem longa tradição, principalmente nas aldeias portuguesas, nas quais e no dia
previamente estabelecido, pelas entidades competentes, as populações convergem,
com devoção, crença e alegria, para as cerimónias específicas, porque segundo
os cânones do cristianismo, o evento significa a “Ressurreição de Cristo”.
Este
tempo que os cristãos-católicos vivenciam, inicia-se com um período de “luto”,
que se prolonga durante quarenta dias, imediatamente, a partir da terça-feira
de Carnaval e culminado no “Domingo da Ressurreição”, dia totalmente consagrado
à alegria de experienciar a libertação de Jesus Cristo do túmulo, para onde
teria sido conduzido após a sua morte na Cruz, na sexta-feira da paixão,
conforme rezam os documentos sagrados.
A
Páscoa é, também, um tempo de confraternização, de reunião da família, não
tanto no conceito e espírito que é vivido, por exemplo, no Natal, (nascimento
de Jesus Cristo) mas numa perspetiva diferente, (morte e ressurreição de Jesus
Cristo) não significando menos importância ou menor Fé. A Páscoa, nas aldeias
portuguesas, no denominado Portugal profundo, é um acontecimento
simultaneamente religioso e pagão, onde o sagrado e o profano, como que se
alternam, complementando-se, sem conflitos nem incompatibilidades.
Na
Páscoa, concretamente em muitas aldeias de Portugal, praticam-se aquelas duas
dimensões. A dimensão religiosa, preenchida com todos os rituais inerentes às
festividades: Domingo de Ramos, Semana Santa cujos pontos altos são: a
Quinta-feira de Endoenças; a Sexta-feira da Paixão, o Sábado de Aleluia e o
Domingo da Ressurreição, celebrando-se neste dia a Missa da Ressurreição, a que
se segue o “Compasso Pascal”, que consiste na visita às residências, pela
comitiva para o efeito constituída: Pároco, mordomos da Confraria do Senhor,
Mordomo da Cruz e outros acólitos.
Esta
visita pascal às casas de moradia, da comunidade local, é um acontecimento
extraordinário, porque a comitiva, depois de entrar na habitação, o pároco
procede ao ritual de benzer a sala, onde todo o séquito é recebido, para de
seguida o abade dar a Cruz de Cristo Crucificado a beijar aos presentes que
assim o desejem e depois confraternizar, comendo-se alguns doces e cantando-se
a “Aleluia”. É, de facto, uma alegria imensa para as pessoas que, com profunda
Fé, respeito e esperança, recebem Jesus supliciado.
Quanto
à envolvente profana, também em muitas aldeias, a tradição manda que no sábado
de Aleluia, pela meia-noite, se queime o Judas, sob a forma de fogo de
artifício, É uma manifestação de repúdio, de castigo, contra aquele apóstolo
que, traiçoeiramente, vendeu Jesus por trinta dinheiros. Judas era um dos doze
Apóstolos que seguia Cristo por todo o lado.
É
verdade que a Páscoa tem vindo a perder a sua importância, enquanto festa da
alegria, do convívio, nas nossas aldeias, já que nas grandes cidades e vilas é
muito mais difícil, ou mesmo impossível, visitar dezenas de milhares de
habitações, circunscrevendo-se este evento às cerimónias religiosas nas
respetivas Igrejas.
Em
todo o caso, esta data religiosa e festiva, proporciona, seguramente, a
oportunidade para se refletir acerca da nossa práxis neste mundo em que
vivemos, nomeadamente, quando assumimos comportamentos atentatórios dos
direitos e da dignidade dos nossos semelhantes.
Segundo
as narrativas sagradas, Cristo limitava-se a praticar o Bem, a ajudar quem
d’Ele precisava, a compreender, a tolerar e a ter compaixão pelos que sofriam,
curando, milagrosamente, os mais carenciados de tratamento, sem lhes pedir nada
em troca. Praticar o Bem, inclusive, àqueles que, provavelmente, em muitas
mentalidades atuais, não mereciam.
Hoje
em dia, muitas pessoas vivenciam a Páscoa como um dia normal do calendário,
como um domingo qualquer, sem parar uns segundo para refletir no significado
deste acontecimento bíblico-cristão. Não podemos, nem devemos criticar,
negativamente, estes comportamentos, pelo contrário, manifestar respeito, consideração
e um relacionamento amistoso, cordial e sincero, é o mínimo que teremos de
fazer, afinal, quem é que está certo nesta vida?
Por
outro lado, idêntica atitude se exige dos não-crentes, em relação aos
cristãos-católicos que professam esta religião, na medida em que se considera
imprescindível, haver reciprocidade entre os responsáveis de comportamentos
praticamente opostos, além de que, qualquer situação conflituosa não conduziria
à tranquilidade que a sociedade tanto precisa e merece.
Acresce,
ainda, que entre as inúmeras religiões, com maior ou menor expressão e número
de aderentes, certamente que a Páscoa será celebrada de maneiras diferentes, ou
até passará despercebida. Incentivar pessoas, grupos e organizações para
aderirem a uma religião ou até trocarem de convicções profundas de Fé e
confissões, adquiridas à nascença, não será uma prática proibida, quando depois
de um esclarecimento cabal, as pessoas decidem em consciência e com lucidez.
Páscoa Portuguesa, por exemplo, pode ser um
bom argumento para crentes e não-crentes, refletirem, em conjunto, sobre o que
realmente importa na vida para a estabilidade do mundo, assim como o diálogo
inter-religiões se configura cada vez mais premente, porque é impossível
continuar a viver-se neste drama de conflitualidade bélica, que tem levado à
fuga de centenas de milhares de pessoas dos seus países, à morte de outras
centenas de milhares, não escapando crianças, mulheres, homens e idosos.
Pensemos
a Páscoa como uma nova oportunidade para: nos redimirmos dos erros que temos
praticado; das discriminações negativas que vamos fazendo; das prepotências,
humilhações e descartes ignóbeis contra pessoas que, eventualmente, vamos
praticando; assumamos, este evento, como mais uma possibilidade de ajudarmos
quem mais necessita de nós: espiritual, ética, moral e materialmente.
Recusemos
proclamar a Páscoa: como se fosse um tempo exclusivo dos cristãos, mas antes
como um dia privilegiado para a concórdia, para o respeito pela dignidade
humana; glorifiquemos a Páscoa como um dia único em cada ano para
reconstruirmos a vida, laços familiares, relações de amizade interrompidas ou
desfeitas; prestar solidariedade, lealdade e gratidão a quem sempre tem estado
do nosso lado, sem quaisquer tipos de reservas mentais, materiais, éticas,
morais ou outras.
A
Páscoa, para a sociedade, no seu todo, deve ser: um tempo especial, de
reconciliação, compreensão pelas dificuldades dos nossos irmãos humanos; de
apoio incondicional aos mais desfavorecidos, frágeis e desprotegidos, porque,
independentemente das religiões que cada pessoa, grupo, povo ou nação
professam, está a dignidade da pessoa humana, que não pode ser ofendida em
circunstância alguma.
Celebremos
a Páscoa: de todos, com todos e para todos; em união fraterna e solidária; com
espirito aberto, de acolhimento ao outro; com benevolência; com caridade e
amor. É assim que deveremos festejar a Páscoa, não como se fosse a última Ceia
de Cristo com os seus Apóstolos, mas a primeira “refeição” entre todos nós
humanos.
Diamantino Lourenço Rodrigues
de Bártolo
Telefone:
00351 936 400 689
Imprensa
Escrita Local:
Jornal:
“Terra e Mar”
Blog
Pessoal: http://diamantinobartolo.blogspot.com
Portugal:
http://www.caminha2000.com (Link’s
Cidadania e Tribuna)
Sem comentários:
Enviar um comentário