domingo, 4 de junho de 2017

Sobrevivência das Sociedades Multiculturais

A minha múltipla condição, enquanto: Cidadão; Autarca, Aprendiz de Filósofo, Professor-Formador e Escritor exige, precisamente, da minha consciência, uma acrescida responsabilidade, levando-me: primeiro a refletir; depois, quando há condições para tal, agir, independentemente dos resultados que “à priori e/ou à posteriori” possam ser alcançados e/ou consequências a arcar.
A possibilidade que, embora nova, através das minhas reflexões, me é proporcionada, por alguns órgãos de comunicação social locais, digital e escrita, bem como através das diversas aplicações informáticas, no contexto das redes sociais, jamais a esquecerei, tanto mais que, salvo a importância de outras áreas disciplinares e científicas, me parece caber aos Filósofos-Professores e Escritores, uma intervenção cada vez mais profunda e permanente, nas sociedades contemporâneas, considerando que a quantidade e complexidade dos problemas humanos, são inegáveis, para alguns dos quais, urge encontrar soluções, ou, pelo menos, e para já, propostas de trabalho e discussão, que conduzam à gradual eliminação de situações verdadeiramente indignas da condição humana.
Quem como eu, teve o privilégio, por vezes doloroso, de viver toda a segunda metade do século XX, naturalmente que beneficiou da oportunidade de estudar alguns dos acontecimentos da primeira metade e, feito um primeiro, ainda que insuficiente balanço factual, poderia aceitar que o século XX testemunhou as alterações mais profundas, abrangentes e radicais do que qualquer outro século da História Humana. Um século surpreendente, inspirador e, quantas vezes, assustador, porém, sempre fascinante, imprevisível, em que, nos extremos, as ambições e os vícios humanos alcançaram profundezas insondáveis.
Sem preconceitos, aceitamos que uma grande diferença do século XX em relação aos anteriores é a guerra, e notemos que a 1 de Agosto de 1914, começaria, belicamente, Primeira Grande Guerra, à qual se seguiu um longo período de conflitos, que durou décadas, que demonstrou o que o homem pode fazer a outros homens. Também sabemos, hoje, que nas duas guerras mundiais houve matança, carnificina e destruição sem precedentes.
A crueldade e a brutalidade humanas ultrapassaram todas as piores expectativas e limites do racional. Muitas outras pequenas/grandes guerras ocorreram durante o século XX, algumas das quais continuam sendo os “motivos”, os mais diversos: políticos, religiosos, étnicos, económicos, raciais, enfim, estratégicos.
Todavia, nem só as guerras bélicas são as únicas calamidades que a humanidade vem sofrendo e, conforme o século XX avançava, também a vida diária das pessoas atravessava mudanças, devido aos desenvolvimentos científicos e tecnológicos e, nesta rápida e irreversível evolução da ciência e da técnica, muitas mentalidades se alteraram, novas formas de violência, opressão e violação dos Direitos Humanos foram surgindo.
Não podemos, hoje, primeiro quarto do século XXI, ignorar as questões raciais, que não só conduzem a graves conflitos armados como também à mais vil e deprimente escravatura humana, e aqui ocorre-me uma pergunta radical: Quem são os escravos modernos? São todas as pessoas, principalmente as crianças e as mulheres, vítimas da mais desenfreada, desumana e vergonhosa exploração sexual.
Deparamo-nos com cartazes turísticos, que apelativamente, passam mensagens do género: «Turismo sexual na Tailândia. Garotas de verdade. Sexo de verdade. Barato de verdade. Uma virgem por apenas 200 dólares!» ou então esta notícia, aberrantemente extraordinária: «Prostituição – Em Fortaleza-Brasil com crianças menos de 16 anos, 14 anos, por dez reais. Os clientes mais assíduos são portugueses, espanhóis e italianos.» (Grande Reportagem SIC, 18 de Maio de 2008, 21 horas).
E se, o filósofo romano Séneca, já no primeiro século, nas suas cartas a Lucílio escrevia: «Lembrai-vos bem de que este ser a quem chamais de vosso escravo, nasceu da mesma semente de que nasceste; desfruta do mesmo céu; respira o mesmo ar, vive e morre como vós», e, no final do século XX, o Secretário-Geral da Nações Unidas afirmava: «Todos nascemos com a necessidade e o desejo inerente de dignidade e liberdade. Quem pode negar que todos buscamos viver livres do medo, da tortura e da discriminação? Já ouviu alguém livre exigir o fim da liberdade? Já viu um escravo defender a escravidão?»
Como facilmente concluiremos, estas ideias não são novas, os valores humanos, intrínsecos e imanentes do Direito Subjetivo Natural, sempre existiram, nem sempre têm sido respeitados e, no final de século XX, as violações continuavam transferindo-se algumas para este novo século, tendo, ainda, surgido outras, muitas das quais, impunes, vivendo os seus autores no aconchego dos prazeres da vida, fácil e sumptuosa, à custa dos: pobres, explorados, marginalizados, indefesos e excluídos.
Não podemos, por muito mais tempo, persistir no não reconhecimento das múltiplas situações que a espécie humana vive nos dias de hoje. Não devemos, sob pretexto algum, fazer a apologia etnocentrista, porque todos nós sabemos, muitíssimo bem: que não há culturas superiores; que não há etnias principais; que não há valores e direitos para uns e deveres para outros. Temos, hoje, uma riqueza e uma diversidade de culturas, que em nenhuma outra espécie terrestre, certamente, encontraremos.
Perguntemos a um intelectual, possuidor de uma “cultura” enciclopédica, se conhece a história, e, os rituais, por exemplo, de uma “desfolhada à moda antiga”? Até poderá saber, mas também pode ignorar e, neste caso, o homem simples do povo, teria mais cultura que o intelectual. Claro que não podemos analisar e concluir desta forma, mas não nos impressionará se dissermos que ambos têm culturas diferentes.
Vem esta primeira abordagem a propósito do tema que pretendo desenvolver e que, efetivamente, gira à volta de um dos grandes problemas da atualidade, que é o reconhecimento num Estado Constitucional e Democrático, da identidade, autenticidade e sobrevivência das sociedades multiculturais, e o seu direito à reprodução social, onde se incluem as minorias.
Terminaria esta primeira abordagem, citando um dos maiores paladinos da paz, mas a propósito das memórias étnicas: «Uma das formas mais dramáticas de discriminação é negar a grupos étnicos e a minorias racionais o direito fundamental de existirem como tais. Isto verifica-se através da sua supressão ou brutal transferência, ou então tentando debilitar de tal modo a sua identidade étnica a ponto de deixarem, simplesmente de serem identificáveis. Poder-se-á permanecer em silêncio perante crimes tão graves contra a humanidade? Nenhum esforço deve ser considerado excessivo, quando se trata de pôr fim a tais aberrações, indignas da pessoa humana.» (cf. PAULO II, mensagem no Dia Mundial da Paz – 1999).
Educação, cidadania, política e religião, serão, porventura, alguns dos pilares que podem suportar um desenvolvimento adequado e moderno na resolução deste grave problema que herdamos do século XX, que se prende com a indispensabilidade de abrirmos a nossa mentalidade para os valores da cultura, de forma a reconhecermos no outro um igual a nós e, como tal, titular de Deveres e Direitos Humanos, livre e responsável, respeitado e digno.
O reconhecimento e aceitação da interculturalidade são uma preocupação para o futuro, ou permanecerá um problema do passado? O multiculturalismo deverá constituir-se como um bem necessário, a desenvolver-se por toda a humanidade, como riqueza e património mundiais ou, pelo contrário, deveremos caminhar para o monoculturalismo, assente no facilitismo do entendimento neológico (relativo a pessoas) dos seres humanos, uns para com os outros?
Numa perspectiva humanista, com uma mentalidade democrática, não podem restar muitas dúvidas quanto ao futuro que nos convém! Um futuro intercultural, tolerante, fraterno, democrático, será a saída honrosa de um certo caos instalado, afinal, uma “caminhada sem fim pela estrada dos Direitos Humanos”.
Atentemos em alguns documentos importantes, e meditemos, objetiva e realisticamente, sobre o conteúdo de um ou dois preceitos jurídico-legais: «Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos» e «Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamadas na presente declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra...» (ASSEMBLEIA-GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS, DUDH, 1948: Artºs 1º, 2º).
Também em Portugal a legislação no domínio da educação é excelente: «Artigo 2º Princípios gerais 1 - Todos os portugueses têm direito à educação e à cultura, nos termos da Constituição da República. 2 - É da especial responsabilidade do Estado promover a democratização do ensino, garantindo o direito a uma justa e efectiva igualdade de oportunidades no acesso e sucesso escolares. 3 - No acesso à educação e na sua prática é garantido a todos os portugueses o respeito pelo princípio da liberdade de aprender e de ensinar, com tolerância para com as escolhas possíveis, tendo em conta, designadamente, os seguintes princípios: a) O Estado não pode atribuir-se o direito de programar a educação e a cultura segundo quaisquer directrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas; b) O ensino público não será confessional; c) É garantido o direito de criação de escolas particulares e cooperativas. 4 - O sistema educativo responde às necessidades resultantes da realidade social, contribuindo para o desenvolvimento pleno e harmonioso da personalidade dos indivíduos, incentivando a formação de cidadãos livres, responsáveis, autónomos e solidários e valorizando a dimensão humana do trabalho. 5 - A educação promove o desenvolvimento do espírito democrático e pluralista, respeitador dos outros e das suas ideias, aberto ao diálogo e à livre troca de opiniões, formando cidadãos capazes de julgarem com espírito crítico e criativo o meio social em que se integram e de se empenharem na sua transformação progressiva.» (MINISTÉRIO EDUCAÇÃO, Lei Bases Sistema Educativo Português – Lei nº 49/2005 de 30 de agosto)


Bibliografia


ASSEMBLEIA-GERAL DAS NAÇÕES UNIDA, (1948). Declaração Universal dos Direitos do Homem. Nova York: Assembleia Geral das Nações Unidas, 10/12/1948 PAULO II, João, (1999a). “Mensagem para o Dia Mundial da Paz, proferida em 01 Janeiro 1999, e datada de 08/12/1998, subordinada ao tema: “O Segredo da Verdadeira Paz” in CARNEIRO, Roberto, “O choque de Culturas ou Hibridação Cultural?”, Revista Nova Cidadania, S. João do Estoril: Principia, Publicações Universitárias e Científicas, (2), Outono, pp. 43-52
MINISTÉRIO EDUCAÇÃO PORTUGUÊS, (2005). Lei Bases Sistema Educativo Português – Lei nº 49/2005 de 30 de agosto
PAULO II, João, (1999a). “Mensagem para o Dia Mundial da Paz, proferida em 01 Janeiro 1999, e datada de 08/12/1998, subordinada ao tema: “O Segredo da Verdadeira Paz” in CARNEIRO, Roberto, “O choque de Culturas ou Hibridação Cultural?”, Revista Nova Cidadania, S. João do Estoril: Principia, Publicações Universitárias e Científicas, (2), Outono, pp. 43-52

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
Telefone: 00351 936 400 689

Imprensa Escrita Local:

Jornal: “Terra e Mar”

Portugal: http://www.caminha2000.com (Link’s Cidadania e Tribuna)

Sem comentários: