O século XX ficará na história, certamente, por
bons motivos, mas, também, pelo que de mais negativo a humanidade alguma vez
viveu. Naturalmente, parece oportuno recordar as maravilhas da ciência, que,
obviamente, com o poderio da técnica e da tecnologia, se intrometeu de forma
decisiva, na dicotomia bem/mal, vantagens/desvantagens, que marcou a sociedade
humana, desde o início do século, com acontecimentos inesquecíveis, ficando,
contudo, a história dos mesmos sob a responsabilidade dos vindouros
Logicamente, os filósofos, nas diversas
especialidades, têm vindo a refletir alguns dos aspetos mais significativos e
acutilantes do nosso tempo, em que a dignidade humana não deverá ter leituras
polivalentes, porque não haverá dignidade humana enquanto não forem promovidos
e salvaguardados os direitos humanos. A tarefa não será fácil, na medida em que
tais direitos abarcam um amplíssimo leque, que pode iniciar-se na equidade
individual (direitos políticos, sociais e económicos) e expandir-se aos
legítimos interesses coletivos (direito à paz, ao bom ambiente, à
solidariedade)
Pese, embora, a constatação da existência de uma
absurda lista de crimes contra a humanidade, a verdade é que parece que a
opinião pública vem dando sinais de uma renovada sensibilização para os
problemas dos Direitos do Homem e que vem desmistificando um falso debate
ideológico, na medida em que: «Não há ideologia ou sistema social que
detenha o monopólio da garantia desses direitos, porque se trata efectivamente
de Direitos do Homem que cada um deverá defender e sobre os quais todos
deveremos estar de acordo.» (MACHETE, 1978:45).
Cabe aqui fazer um ato de contrição porquanto,
também os portugueses têm alguns pecados em matéria de Direitos Humanos. No
passado colonialista, o comportamento de muitos dos colonizadores e deportados
poderia não ter sido completamente transparente, muito embora a mentalidade
cultural fosse bem diferente da de hoje.
No presente, ouvem-se, ainda, alguns comentários,
sobre acontecimentos que, a serem verdadeiros, em nada dignificam: violência
doméstica, exploração de imigrantes, alguns abusos cometidos por um ou outro
agente da autoridade, segundo as denúncias dos órgãos da comunicação social e
das próprias vítimas.
É
certo que as medidas que vêm sendo adotadas, quanto à divulgação e
sensibilização, pelo respeito dos Direitos Humanos, desde os bancos da escola,
dão a garantia que se estará no bom caminho, considerando que: «O
reconhecimento internacional dos grandes progressos realizados por Portugal, no
campo dos Direitos Humanos, contribuindo decisivamente para a melhoria
espectacular da nossa imagem externa, está na origem de várias atitudes
significativas da comunidade internacional em relação ao nosso país, entre os
quais: facilidades financeiras, eleição de Portugal para o conselho da Europa,
para a Comissão dos Direitos do Homem na ONU e para o conselho de Segurança.»
(PEREIRA, 1978:27).
Entretanto,
o reconhecimento mundial pelos progressos de Portugal em matéria de Direitos
Humanos, verificou-se em 2016, com a eleição, por unanimidade e aclamação, de
um notável Português, o Exmo Senhor Engº António Manuel de Oliveira Guterres
para Secretário Geral da Organização das Nações Unidas que tomou posso do
prestigiado cargo no dia 01 de janeiro de 2017, e resto, este ilustre lusitano,
já tinha desempenhado o cargo de Alto Comissário das Nações Unidas para os
Refugiados e, finalmente, agraciado pela Assembleia da República de Portugal,
com o “Prémio Direitos Humanos-2016”.
Entendeu-se,
portanto, oportuno, prosseguir-se nesta caminhada para maior divulgação,
exemplificação e defesa dos Direitos Humanos, na convicção de que, nos tempos
modernos, entre um cientificismo imparável, uma técnica em permanente mutação e
uma tecnologia da informação-computação avassaladora, ocupando cada vez mais
tecnocratas, restaria para os filósofos esta nobre missão do século XXI. Nessa
perspetiva, abordar-se-á o tema a partir de um autor contemporâneo, com base
numa das suas obras que mais convirá ao assunto.
Trata-se de Jürgen Habermas e o seu livro “Facticidad y Validez”. Justamente o capítulo sobre
a “Reconstrução Interna do Direito: O
Sistema dos Direitos”. Iniciando esta reflexão pelos Direitos Humanos e a
Tradição Ocidental, na perspetiva histórico-estrutural, abordando depois, no
âmbito filosófico do tema, a ideia de como pensar os Direitos do Homem,
passando, rapidamente, por uma breve invocação sobre o Direito e a Justiça.
Finalmente, centrar este esforço intelectual e filosófico, no sistema de
direitos de Habermas.
Importará, desde já, aludir, ainda que
superficialmente, ao sistema de valores: quer na Constituição da República;
quer na Lei de Bases do Sistema Educativo quer, por fim, na própria Declaração
Universal dos Direitos Humanos. Em termos de instrumentos jurídicos nacionais e
internacionais, eles parecem mais que suficientes, assim houvesse a boa-vontade
de os cumprir, mesmo continuando a refletir-se sobre a operacionalidade e a
eficácia dos mesmos.
Sociólogos, juristas, filósofos entre outros, continuam
produzindo as mais diversas interpretações, analisando os aspetos que poderiam
ser melhorados, nomeadamente, os instrumentos para uma eficaz justiça sobre
aqueles que, reiteradamente violam direitos fundamentais: o Tribunal
Internacional dos Direitos Humanos, com jurisdição universal; meios para fazer
cumprir as suas decisões (porque por mais teorias que se elaborem, por sistemas
“perfeitos” que se criem, a inobservância dos Direitos Humanos, ainda é uma
triste realidade.
Veja-se o Relatório da Amnistia Internacional de
2007, onde se menciona que cerca de 80 países ainda não cumprem, integralmente,
aqueles direitos. Paralelamente ao Tribunal Internacional de Direitos Humanos a
que já se fez referência, parece inevitável que em todos os países, se dotem os
sistemas de ensino público e privado com uma disciplina obrigatória, ministrada
em todos os graus de ensino, por professores com formação em Ciências Sociais e
Humanas, manifestamente sensibilizados para os Direitos Humanos.
Bibliografia
MACHETE, Rui, (1978). Os Direitos do Homem no Mundo. Lisboa:
Fundação Social-Democrata Oliveira Martins
PEREIRA. António Maria, (1978). Direitos do Homem. Tradução Manuel
Alarcão. Coimbra, Almedina, 1978.
Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
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