O sistema político de Silvestre Pinheiro Ferreira
(1769-1846), de facto, parece jogar numa certa diluição entre os vários poderes
que o constituem: Eleitoral, Legislativo, Judicial, Executivo e Conservador.
Todavia, tais poderes: estão bem caracterizados; definidas as suas competências
e estabelecido o seu funcionamento, o que vem beneficiar o regime
monárquico-constitucional e democrático, no que respeita à observância do
exercício dos Direitos, Liberdades e Garantias, ao contrário de um poder
absoluto, centralizado e ditador.
Na descrição que faz de cada um daqueles cinco
poderes, no “Manual do Cidadão em um
Governo Representativo ou Princípios
de Direito Público Constitucional, Administrativo e das Gentes”, Pinheiro
Ferreira, começa as respetivas conferências, com uma afirmação profunda, a
propósito do Poder Eleitoral. Ele refere: «Ao grande júri eleitoral, único
tribunal da opinião pública, pertence distribuir os empregos aos candidatos,
segundo suas capacidades, e recompensar os cidadãos, segundo os seus
merecimentos.» (FERREIRA, 1834a:112).
Adotando o mesmo critério, e relativamente ao Poder
Legislativo, a definição que Silvestre Pinheiro Ferreira dá deste poder é, numa
orientação democrática, uma crítica velada ao absolutismo, à ditadura, qualquer
que ela seja. Também, uma condenação de todos os privilégios contrários ao que
é estabelecido nas leis comuns.
O legislador terá o dever de proporcionar as
condições legais para o bem geral do Estado, no sentido de criar deveres e
direitos, iguais para todos os cidadãos: «O mandato do legislador não é um
poder absoluto. Toda a lei de privilégio contrária à lei comum seria um
atentado. Toda a lei comum contrária às condições do pacto social seria
prevaricação.» (Ibid:142).
Num contexto democrático de plena liberdade, verifica-se que o sistema
judicial, principalmente em Portugal, ainda não consegue a realização plena,
objetiva e pertinente da Justiça, julgada adequada aos acontecimentos e aos
intervenientes, sejam estes arguidos/réus ou vítimas.
Há carência de recursos humanos, meios técnicos e
infraestruturas compatíveis com a dignidade desta função, cujos titulares dos
respetivos cargos, das magistraturas judiciais, devem merecer a mais elevada
consideração, respeito e obediência dos cidadãos, porque, de entre outros: «O objectivo da justiça seria o de
eliminar toda forma de opressão em todos os cantos da terra. A razão sendo
única e igual em todo o ser humano tornaria esse ideal não só realizável, mas
um dever dos ‘amigos da humanidade’ e da justiça.» (SILVA, 2004:53).
Se, por um lado: a separação dos Poderes é
fundamental para o bom funcionamento das Instituições; não menos essencial é
que para cada poder sejam estabelecidas as respetivas competências, em Lei
própria, que deve fixar os limites da jurisdição do poder que ela regula.
Para que a lei se aplique, dispõe o Poder Judicial
de tribunais, forças policiais e estabelecimentos prisionais e/ou de correção,
porque de facto, o objeto deste importante Poder consiste em decidir as causas
criminais, ou cíveis, ocorridas na sociedade, por isso é essencial que a
população confie no sistema, tal com então já defendia Pinheiro Ferreira: «O
Poder Judicial não pode ser exercido senão por juízes revestidos de confiança
das partes e da nação.» (FERREIRA, 1834a:183).
Na perspetiva deste autor, um outro Poder
caracteriza o sistema político, numa Monarquia Constitucional Representativa,
que ele designa por Poder Executivo. Silvestre Ferreira, na composição deste Poder
Executivo, considera dois aspetos muito importantes e complementares: por um
lado, o monarca; e por outro, uma burocracia ordenada de forma hierárquica, no
entanto a direção do governo pertencerá a uma única pessoa, certamente, o
monarca, atuando os restantes elementos, com os seus meios, capacidades e
especialidades, na dependência daquele. Neste Poder Governamental, a cooperação
é articulada pelo monarca, do qual partem as respetivas instruções, existindo
um único pensamento, precisamente, como já referido, o do monarca.
Nesta linha, Pinheiro Ferreira, dá importância ao pensamento de quem
dirige: o monarca e as leis que servem o sistema; regras e normas que
justificam a burocracia implementada nas Repartições: «A execução das leis,
e o Pensamento do Governo, que a ele preside, são os dois elementos essenciais
ao Poder Executivo.» (Ibid:247).
Finalmente, no sistema político delineado por
Pinheiro Ferreira, surge um quinto e último instrumento: o Poder Conservador
que não é, exatamente, uma cópia do Poder Moderador de Benjamin Constant, muito
embora tenha recebido alguma influência deste, porque este Poder não era
originário da realeza. O que se pretendia, segundo Silvestre Pinheiro
era: «Fazer guardar os direitos que competem a cada cidadão, e manter a
independência e a harmonia de todos os outros poderes políticos a fim de que os
agentes de um não usurpem as atribuições de outro.» (Ibid:322).
Nos demais aspetos, o ideal seria criar uma autoridade independente dos
restantes poderes, que não tivesse acesso, nem exercesse nenhum dos referidos
quatro poderes anteriores. Na apresentação e descrição do Poder Conservador,
Pinheiro Ferreira afirma que: «Sem um Poder Conservador não pode haver
independência, harmonia nem equilíbrio entre outros poderes políticos do estado.»
(Ibid:322).
Bibliografia
FERREIRA, Silvestre
Pinheiro, (1834a). Manual do Cidadão em um Governo Representativo. Vol. I, Tomo I, Introdução António
Paim, (1998a) Brasília: Senado Federal.
SILVA, Sidney Reinaldo
(2004). “Instrução e Civilização em Condorcet”, in: Revista de Educação, Campinas SP: PUC-Campinas, Nº 17, p.
47-55, novembro 2004
Venade/Caminha –
Portugal, 2020
Com o protesto da minha perene GRATIDÃO
Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
Presidente do Núcleo Académico de Letras e Artes de
Portugal
NALAP.ORG
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