domingo, 27 de novembro de 2011

Inegociabilidade de Sentimentos, Valores e Amigos

Os sentimentos, os valores, os princípios e os amigos, não se vendem, nem se compram, nem se trocam interesseiramente, porque: ou se têm, se sentem e se acarinham amorosa e generosamente; ou não se vivem e, portanto, não existem. A amizade incondicional, verdadeira, imbuída de sentimentos de um sincero “Amor-de-Amigo”, naturalmente que gera valores supremos, inegociáveis e insubstituíveis.
Se se analisar, por exemplo, o papel crucial que os verdadeiros amigos exercem na vida de quem tem a felicidade de os possuir, verifica-se, imediatamente, que não se podem negociar, trocar ou, simplesmente, ignorá-los. Tais amigos, complementa-se, no bem e no mal. Na alegria e na tristeza. Eles vivem para objectivos comuns: manter, contra tudo e contra todos, uma amizade sincera.
Em princípio, um amigo puro, do coração, especial, vai assumir esse superior privilégio para o resto da vida, jamais poderá ser inimigo, porque entre amigos leais, solidários, confidentes, a inimizade nunca existirá, porquanto a reciprocidade de sentimentos, comportamentos e conivência serão sempre como que o escudo que os defende de todos os obstáculos, fraquezas, intromissões, situações, interesses e pessoas que, nitidamente os prejudicam.
Uma amizade, unida pelo verdadeiro “Amor-de-Amigo”, pode, porém, fragilizar-se e até destruir-se face à existência de atitudes que configurem sentimentos de negação dos valores unificadores daquele amor. É necessário ter-se muita firmeza, muita sensibilidade, amar-se muito o amigo para que nada nem ninguém destrua uma dilecção tão profunda quanto nobre.
Nestas circunstâncias são fundamentais, entre os amigos, o a comunicação permanente, o diálogo leal e um elevado nível de empatia constante, no sentido de que: “A pessoa se esforça por entender o outro, mas se coloca à disposição para ajudar, respeitando seu sentimento, seu interesse, sua individualidade. Propõe compartilhar o poder e a solução do problema com o outro.” (RESENDE. 2000:94)
O “Amor-de-Amigo” é um sentimento que, como muitos outros, não sendo totalmente lógico, pelo menos, em certas circunstâncias, pode complementar a racionalidade humana; o contrário será, eventualmente, verdade. Nem sempre os sentimentos são totalmente racionais.
O ser humano não é exclusivamente racional, nem sentimental, de resto é, provavelmente, esta dicotomia que o diferencia da restante natureza. Por isso não se poderá considerar fraco quem é sentimental, nem forte que é, racional. A virtude, para quem a possui, estará, como em tudo na vida, no meio-termo.
A existência humana, possivelmente, não teria uma dimensão superior se a emoção não estivesse presente. A emoção dos sentimentos verdadeiros, porque puros, desinteressados dos valores materiais, talvez por estranhos complexos e, alegadamente, de auo-inferioridade, nem sempre é revelada por quem a vive. Numa sociedade “fria” em que os números, normalmente, estão acima das pessoas, os sentimentos, os valores e as emoções são entendidos como sinal de fraqueza.
 Talvez por isso: “Algumas pessoas relutam em agir de forma emocional porque a consideram uma atitude infantil. No entanto existe uma diferença entre ser infantil e ser como as crianças. Ser infantil é ser imaturo e recusar-se a assumir a plena responsabilidade pelas próprias ações. Ser como as crianças é assumir a responsabilidade e ao mesmo tempo ser capaz de entregar-se às emoções.” (BAKER, 2005:124)
O percurso de vida, ao longo dos anos, vai ensinando que há situações, interesses e pessoas que importa defender, aprofundar e conservar. Com as vivências experimentadas: umas bem sucedidas; outras que se ficaram pelo caminho e, ainda, outras, que resultaram em autênticas tragédias relacionais, é fundamental possuir a faculdade e também a felicidade de separar o essencial do acessório, e isto é um privilégio que nem todas as pessoas possuem, mas que se deve buscar incessantemente.
A capacidade para se ser criança, no sentido de assumir as responsabilidades e da vivência autêntica das emoções, paradoxalmente, ou não, consegue-se, eventualmente, na idade dita madura, em que determinados sentimentos, valores, princípios e amigos, estarão, ou deveriam estar, consolidados.
 Na verdade: “Com a idade, poderá encontrar-se rodeado por amigos e pessoas que se preocupam genuinamente consigo, que proporcionam toda a segurança que resulta de ser amado e tratado com dignidade e respeito. Esses amigos, essas pessoas tornam-se então a sua verdadeira família. Essas pessoas também podem partilhar os seus valores espirituais e entre todos é possível ajudarem-se mutuamente e evoluir de uma maneira positiva. A sua família espiritual são essas pessoas.” (BRIAN, 2000:102)
O ser humano experiencia sentimentos, emoções e situações mais ou menos intensas. Para certas pessoas, determinados sentimentos e as consequências deles resultantes serão positivos, para outras não. Instala-se como que um certo relativismo perigoso, na medida em que nem tudo pode ser considerado negativo, embora se tenha de admitir que existem conceitos que não são interpretados e vividos da mesma forma.
Por exemplo: se para determinadas pessoas a paz é a ausência da guerra e com esta definição se contentam; para outras, a paz é um valor a defender intransigentemente, porque consideram um bem supremo da humanidade; finalmente, para outras, a guerra é mais importante porque movimenta outros “valores”, quer materiais quer também um caminho para se atingir a paz, através do derrube dos ditadores. Em todo o caso e apesar desta divergência, ainda se acredita que a paz, no sentido da harmonia, é desejada pela maioria da população mundial.
O valor da paz, aqui percebida como o supremo desejo da humanidade em geral, resultará sempre da paz individual que cada pessoa tiver dentro de si. Para que tal aconteça: “(…) precisamos primeiro da capacidade de compreensão, e a compreensão não é possível sem uma comunicação gentil e afectuosa. Por isso, restaurar a comunicação é uma prática essencial para a paz. A comunicação é a raiz e o desabrochar da nossa prática de não-violência.” (HANH, 2004:30)
Considerando-se e respeitando-se os valores que cada pessoa defende, segundo as suas próprias convicções, o facto é que há valores que as sociedades modernas, democráticas, livres e responsáveis defendem e os comungam, transmitindo-os, por vezes com alguma dificuldade, às gerações mais novas, precisamente porque outros alegados valores, de natureza material, “abafam” aqueles que são genuinamente próprios do ser humano, ou que o deveriam ser e, jamais, negociáveis, tais como: a vida, a dignidade, o respeito, o amor; bem como os direitos inalienáveis designadamente: a saúde, a educação, o trabalho, a segurança, a propriedade, a liberdade, entre outros.
Por vezes afirma-se que tudo tem um preço, tudo se pode negociar, tudo se pode substituir, desde que, materialmente, resultem lucros concretos para as partes envolvidas. Vive-se, em muitas circunstâncias, uma vida de conveniências, de oportunismos, do “vale-tudo”, para se atingirem determinados fins, sem se olhar aos meios, “cilindrando”, até, os mais nobres sentimentos e valores das pessoas que não podem defender-se ou ousam obstaculizar tais projectos, quantas vezes maquiavélicos.
A justiça social, a harmonia, a felicidade, esta aqui entendida no sentido de cada um e de todos estarem de bem consigo próprios e com o mundo, respectivamente, não se constroem nem se consolidam enquanto não se respeitarem sentimentos, emoções, valores, opções e a dignidade que são devidos a toda a pessoa humana.
Claro que parece inevitável que no exercício dos valores a existência de sentimentos nobres em muito ajuda para o sucesso das relações humanas, sejam pessoais, profissionais, empresariais e quaisquer outras. Quando não se respeitam sentimentos, emoções, valores e princípios das pessoas, não se lhes está a reconhecer a dignidade, a honra e até o seu bom nome.
O valor da amizade só se tornará efectivo se envolvido em sentimentos de amor sincero, entre verdadeiros amigos, que são capazes de dar prioridade total ao relacionamento entre eles, independentemente de outros afazeres, situações interesses e pessoas. A amizade entre dois amigos, quando genuína, estará sempre em primeiro lugar e a comunicação, os actos mais singelos, são veículos insubstituíveis para a manter consolidada e inabalável.
Este sentimento bem profundo, bem legítimo que é o “Amor-de-Amigo”, que se nutre por outra pessoa, é inegociável, não tem qualquer preço, nem quaisquer condições, é ilimitado e permanece indestrutível, quando firmado nos valores da lealdade, da solidariedade, da reciprocidade e da cumplicidade.
Este sentimento fortíssimo que é o “Amor-de-Amigo”, que em nada se confunde com o amor conjugal, filial, fraternal, e outros de natureza familiar, dir-se-á que se consubstancia ao nível da dignidade, do respeito, da nobreza e generosidade do carácter e de uma certa elevação espiritual, porque não pressupõe relações sexuais, nem quaisquer outras intenções inconfessáveis.
Trata-se de um sentimento que não é próprio de “aventureiríssimo”, de “conquistas de fim-de-semana” ou de “colecção de casos”. Ele pauta-se pelo carinho, pelos gestos ternos, meigos e sinceros. Estará próximo do “Amor Platónico”. É um amor ideal que conduz, justamente, à felicidade dos amigos, enquanto tais.
Vivem-se emoções, cumplicidades, reciprocidades, solidariedades, lealdades, sempre com total amizade. O fim deste amor singular, acabará com a morte física do último dos dois amigos, mas sobreviverá, espiritualmente, se eles acreditarem numa vida celestial, para além da morte biológica.
Como conclusão pessoal, defendo que o “Amor-de-Amigo é um sentimento que se considera inegociável, intransmissível e insubstituível: ou se tem e se pratica, amando o amigo incondicionalmente e para todo o sempre; ou não se tem e vive-se um pouco na solidão e nas margens do “rio da felicidade”.

Bibliografia

BAKER, Mark W., (2005). Jesus o Maior Psicólogo que já Existiu.Trad. Cláudia Gerpe Duarte. Rio de Janeiro: Sextante.
BRIAN L. Weiss, M.D. (2000). A Divina Sabedoria dos Mestres. Um Guia para a Felicidade, alegria e Paz Interior. Trad. António Reca de Sousa. Cascais: Pergaminho.
HANH, Thich Nhat, (2004). Criar a Verdadeira Paz. Cascais : Pergaminho
RESENDE, Enio, (2000). O Livro das Competências. Desenvolvimento das Competências: A melhor Auto-Ajuda para Pessoas, Organizações e Sociedade. Rio de Janeiro: Qualitymark





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