domingo, 1 de janeiro de 2012

A Paz Constrói-se na Educação Para os Direitos

A exigência da paz constitui um dos direitos da chamada terceira geração, segundo a estrutura estabelecida, (tais como outros direitos, por exemplo, ecológicos) e seria cada vez mais um objectivo importante e necessário a salvaguardar, não fossem os inúmeros conflitos regionais de guerra declarada ou latente, seja por motivos políticos, seja por razões de ordem religiosa, económica e estratégico-militar.
A “Instituição da Guerra” apresenta-se como uma ordem de magnitude que transcende qualquer agressor ou vítima particular, na medida em que faz mais sentido responsabilizar um país ou grupo por uma agressão sobre outro, do que imputar culpas a indivíduos isolados, além de que existe, obviamente, violência estrutural na medida em que prejuízos não intencionais são infringidos a indivíduos ou países em todo o mundo, porque o opressor está incrustado nas estruturas, com culturas que não deixam outras alternativas.
A agressão é provocada e algumas das causas são estruturais, outras culturais: o colonialismo é uma dessas estruturas que ligam a colónia ao poder colonial, de tal forma que aquela pode revoltar-se para se libertar deste. Ora, o caminho para a paz passa, necessariamente, por soluções imaginativas dos conflitos, o que pode significar a transformação de algumas estruturas através da substituição das culturas de violência por mecanismos de apoio ao desenvolvimento sócio-cultural, científico e económico dos povos até então oprimidos.
O homem tem o dever de procurar e construir um mundo melhor, porque: «o direito de viver em paz também pode ser interpretado como o direito de não ser vítima da agressão. Mas se assumirmos que a agressão não é aleatória mas causada por factores estruturais e culturais entre e dentro dos actores, então o direito de viver em paz é o direito de viver num cenário social (...) onde se faz qualquer coisa sobre factores e não só sobre actores...» (POPPER, 1992: 213)
A construção de um mundo melhor, no sentido de promover e preservar a paz, quaisquer que sejam os conceitos deste valor inestimável (mesmo o mais rudimentar, como aquele que define paz como ausência de guerra) passa pelo conhecimento dos valores universais constantes na “Declaração Universal dos Direitos Humanos” e dos instrumentos legais, técnicos e científicos para os defender, porque é necessário combater o irracionalismo que tanto parece estar na moda, sendo certo que atitudes irracionais, não se fundamentam na observância dos direitos humanos e, embora aceitando que todo o conhecimento humano é falível e incerto, não é menos verdade que o conhecimento é uma procura da verdade, de teorias explicativas e objectivamente verdadeiras.
Neste contexto, não será difícil compreender que qualquer violação dos direitos humanos constitui um erro grave, contudo: «combater a falha, o erro, significa pois, procurar uma verdade mais objectiva e fazer tudo para detectar e eliminar tudo o que é falso. (...) Ao reconhecermos a falibilidade do conhecimento humano, reconhecemos, simultaneamente que nunca podemos estar completamente seguros de não termos cometido algum erro.”» (Ibid.: 18)
A prática de deveres que conduzem a soluções pacíficas dos conflitos humanos, pressupõe profundos conhecimentos ético-morais, de cidadania, de Saber-ser e Saber-estar no mundo com os outros, numa permanente postura de tolerância e responsabilidade intelectual e, quantas vezes, nesta tolerância e humanidade, se é vítima da intolerância e da desumanidade.
O número de casos e de vítimas não pára de aumentar: campos de concentração, assassinatos, raptos, sequestros, violação de pessoas; deportação de homens, mulheres, crianças, idosos, todos vítimas de fanáticos inebriados pelo poder, qualquer que este seja, isto é, o poder a qualquer preço.
O homem intelectual, culto e responsável tem hoje, mais do que no passado, o dever inalienável de rejeitar o relativismo radical, na medida em que há valores que não se deveriam relativizar: Deus, verdade, bem, justiça, paz, liberdade e tantos outros, porque as posições radicais não conduzem, geralmente, a soluções equilibradas, afigurando-se do mais elementar bom-senso, optar por atitudes moderadas.
Parece inócuo aceitar que «O pluralismo crítico apresenta uma posição de acordo com a qual, no interesse da verdade, cada teoria - e quanto mais teorias tanto melhor - deve ser posta em plano de concorrência com as demais. Esta concorrência consiste na discussão racional: isto significa que o que está em causa é a verdade das teorias concorrentes. Aquela teoria, que na discussão crítica parecer aproximar-se mais da verdade é a melhor e a melhor teoria prevalece sobre as menos boas. O mesmo se passa com a verdade.» (Ibid:178)
A Paz constrói-se a partir de um conhecimento, cada vez mais profundo, das realidades humanas e todas as ciências serão poucas, todos os cientistas e intelectuais não serão suficientes para prosseguirem na busca de um mundo melhor, no sentido não apenas da ausência de guerra, mas principalmente no que respeita ao dever do cumprimento dos direitos humanos, sejam estes individuais ou colectivos, pelo que, de facto, urge cada vez mais reflectir sobre o que as ciências cognitivas podem fazer por um mundo em efervescência.
Poder-se-á colocar aqui, a questão da vontade e da liberdade suficientes para resolver as situações de violação dos direitos humanos? Será que, também aqui o homem está determinado, por circunstâncias que não controla nem domina? Ou, pelo contrário, tem o homem a capacidade para alterar alguma coisa?
Porque, conforme escreve SEARLE: «A liberdade humana é precisamente, um facto de experiência. Se desejar alguma prova empírica de tal facto, podemos sem mais aludir à possibilidade que sempre nos cabe de falsificar quaisquer predições que alguém possa ter feito acerca do nosso comportamento. Se alguém prediz que eu vou fazer alguma coisa, posso muito bem não fazer essa coisa.» (1987: 107).
A liberdade da vontade não depende, portanto, do determinismo porque, de acordo com o raciocínio de SEARLE: «A experiência característica que nos dá a convicção da liberdade humana, é uma experiência da qual somos incapazes de arrancar a convicção da liberdade, é a experiência de nos empenharmos em acções voluntárias e intencionais. (...) É esta experiência a pedra basilar da nossa crença na liberdade da vontade...» (Ibid:114-20)
Poderá considerar-se legítimo e correcto afirmar que a construção de um mundo de paz, depende muito mais do homem que, na sua liberdade de vontade, não sujeita ao determinismo absoluto, pode voluntária e intencionalmente criar as condições, através das acções concretas, para um entendimento global.
Naturalmente que tal intencionalidade pressupõe abdicar de interesses diversos que possam colidir com a arquitectura de uma paz duradoira, num mundo moderno, solidário e fraterno, onde todas as mulheres e todos os homens tenham uma oportunidade de cooperar mutuamente.
Na verdade: «A paz só se obtém quando os objectivos políticos de uma comunidade se concentram no desenvolvimento humano. É necessário criar uma cultura de paz, a cultura do cuidado do próximo. Há um crescente número de organizações não governamentais de mulheres ou de mulheres e homens, ligadas ou não a grupos religiosos, cujas actividades se centram na construção da paz e tal é motivo de esperança.» (VICENTE, 2000:23)

Bibliografia

POPPER, Karl R, (1992). Em Busca de um Mundo Melhor, 3a Ed. Trad. Teresa Curvelo. Lisboa: Editorial Fragmentos.
SEARLE, J., (1987). Mente, Cérebro e Ciências, Lisboa: Edições 70.
VICENTE, Ana (2000). Direitos das Mulheres/Direitos Humanos, Lisboa: Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres: Presidência do Conselho de Ministros. (Colecção Cadernos Condição Feminina) 

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

Portugal: www.caminha2000.com (Link Cidadania)

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