Os sentimentos, os princípios, os valores e os
amigos, não se vendem, nem se compram, nem se trocam interesseiramente, porque:
ou se têm, se sentem e se acarinham amorosa e generosamente; ou não se vivem e,
portanto, não existem. A amizade incondicional, verdadeira, imbuída de
sentimentos de um sincero “Amor-de-Amigo”,
naturalmente que gera valores supremos, inegociáveis e insubstituíveis.
Se se analisar, por exemplo, o papel crucial que os
verdadeiros amigos exercem na vida, de quem tem a felicidade de os possuir,
verifica-se, imediatamente, que: não se podem negociar, trocar, descartar ou,
simplesmente, ignorá-los. Tais amigos, complementam-se, no bem e no mal. Na
alegria e na tristeza. Eles vivem para objetivos comuns: manter, contra tudo e
contra todos, uma amizade sincera.
Em princípio, um amigo puro, do coração, especial,
vai assumir esse superior privilégio para o resto da vida, jamais poderá ser
inimigo, porque entre amigos leais, solidários, confidentes, a inimizade nunca
existirá, porquanto a reciprocidade de sentimentos, comportamentos e conivência,
serão sempre como que o escudo que os defende de todos os obstáculos,
fraquezas, intromissões, situações, interesses e pessoas que, nitidamente, os prejudicam.
Uma amizade, unida pelo verdadeiro “Amor-de-Amigo”, pode, porém,
fragilizar-se, e até destruir-se, face à existência de atitudes que configurem
sentimentos de negação dos valores unificadores daquele amor. É necessária
muita firmeza, muita sensibilidade, amar-se muito o amigo para que nada, nem
ninguém, destrua uma dileção tão profunda, quanto nobre.
Nestas circunstâncias são fundamentais, entre os
amigos: a comunicação permanente; o diálogo leal e um elevado nível de empatia
constante, no sentido de que: «A pessoa
se esforça por entender o outro, mas se coloca à disposição para ajudar,
respeitando seu sentimento, seu interesse, sua individualidade. Propõe
compartilhar o poder e a solução do problema com o outro.» (RESENDE.
2000:94).
O “Amor-de-Amigo”
é um sentimento que, como muitos outros, não sendo totalmente lógico, pelo
menos, em certas circunstâncias, pode complementar a racionalidade humana; o
contrário será, eventualmente, verdade. Nem sempre os sentimentos são
totalmente racionais.
O ser humano não é, exclusivamente, racional, nem
sentimental, de resto será, provavelmente, esta dicotomia que o diferencia da
restante natureza. Por isso não se poderá considerar fraco quem é sentimental,
nem forte que é, racional. A virtude, para quem a possui, estará, como em tudo
na vida, no meio-termo, contudo, os sentimentos e as emoções são próprios da
pessoa sensível.
A existência humana, possivelmente, não teria uma
dimensão superior, se a emoção não estivesse presente. A emoção dos sentimentos
verdadeiros, porque puros, desinteressados dos valores materiais, talvez por
estranhos complexos e, alegadamente, de auo-inferioridade, nem sempre é
revelada por quem a vive. Numa sociedade “fria” em que os números, normalmente,
estão acima das pessoas, os princípios, os valores, os sentimentos e as emoções
são entendidos como sinal de fraqueza, assim como um homem chorar em público.
Talvez por
isso: «Algumas pessoas relutam em agir de
forma emocional porque a consideram uma atitude infantil. No entanto existe uma
diferença entre ser infantil e ser como as crianças. Ser infantil é ser imaturo
e recusar-se a assumir a plena responsabilidade pelas próprias ações. Ser como
as crianças é assumir a responsabilidade e ao mesmo tempo ser capaz de
entregar-se às emoções.» (BAKER, 2005:124).
O percurso de vida, ao longo dos anos, vai ensinando
que há situações, interesses e pessoas que importa defender, aprofundar e
conservar. Com as vivências experimentadas: umas, bem-sucedidas; outras, que se
ficaram pelo caminho e, ainda, outras, que resultaram em autênticas tragédias
relacionais, é fundamental possuir a faculdade, e também a felicidade, de
separar o essencial do acessório, e isto é uma aptidão que nem todas as pessoas
possuem, mas que se deve buscar incessantemente.
A capacidade para se ser criança, no sentido de
assumir as responsabilidades e da vivência autêntica das emoções,
paradoxalmente, ou não, consegue-se, eventualmente, na idade dita madura, em
que determinados: princípios, valores, sentimentos e amigos, estarão, ou
deveriam estar, consolidados.
Na verdade: «Com a idade, poderá encontrar-se rodeado por
amigos e pessoas que se preocupam genuinamente consigo, que proporcionam toda a
segurança que resulta de ser amado e tratado com dignidade e respeito. Esses
amigos, essas pessoas tornam-se então a sua verdadeira família. Essas pessoas
também podem partilhar os seus valores espirituais e entre todos é possível
ajudarem-se mutuamente e evoluir de uma maneira positiva. A sua família
espiritual são essas pessoas.» (BRIAN, 2000:102).
O ser humano experiencia sentimentos, emoções e
situações, mais ou menos intensas. Para certas pessoas: determinados
sentimentos, e as consequências deles resultantes, serão positivos; para outras,
não. Instala-se como que um certo relativismo perigoso, na medida em que nem
tudo pode ser considerado negativo, embora se tenha de admitir que existem
conceitos que não são interpretados e vividos da mesma forma, por todas as
pessoas e em todas as culturas.
Por exemplo: se para determinadas pessoas a paz é a
ausência da guerra e com esta definição se contentam; para outras, a paz é um
valor a defender intransigentemente, porque consideram um bem supremo da
humanidade; finalmente, para outras, a guerra é mais importante porque
movimenta outros “valores”, quer materiais, quer, também, um caminho para se
atingir a paz, através do derrube dos ditadores. Em todo o caso, e apesar desta
divergência, ainda se acredita que a paz, no sentido da harmonia, da segurança
e da felicidade, é desejada pela maioria da população mundial.
O valor da paz, aqui percebida como o supremo desejo
da humanidade em geral, resultará sempre da paz individual que cada pessoa
tiver dentro de si. Para que tal aconteça: «(…) precisamos primeiro da capacidade de compreensão, e a compreensão não é
possível sem uma comunicação gentil e afectuosa. Por isso, restaurar a
comunicação é uma prática essencial para a paz. A comunicação é a raiz e o
desabrochar da nossa prática de não-violência.» (HANH, 2004:30).
Considerando-se e respeitando-se os valores que cada
pessoa defende, segundo as suas próprias convicções, o facto é que há valores
que as sociedades modernas, democráticas, livres e responsáveis defendem e os
comungam, transmitindo-os, por vezes, com alguma dificuldade, às gerações mais
novas, precisamente porque outros alegados valores, de natureza material,
“abafam” aqueles que são genuinamente próprios do ser humano, ou que o deveriam
ser e, jamais, negociáveis, tais como: a vida, a dignidade, o respeito, o amor;
bem como os direitos inalienáveis, designadamente: a saúde, a educação, o
trabalho, a segurança, a propriedade, a liberdade, entre outros.
Por vezes afirma-se que tudo tem um preço, tudo se
pode negociar, tudo se pode substituir, desde que, materialmente, resultem
lucros concretos para as partes envolvidas. Vive-se, em muitas circunstâncias,
uma vida de conveniências, de oportunismos, do “vale-tudo”, para se atingirem
determinados fins, sem se olhar aos meios, “cilindrando”, até, os mais nobres
sentimentos e valores das pessoas que não podem defender-se, ou ousam
obstaculizar tais projetos, quantas vezes maquiavélicos.
A justiça social, a harmonia, a felicidade, esta
aqui entendida no sentido de cada um, e de todos estarem de bem consigo
próprios, e com o mundo, respetivamente, não se constroem, nem se consolidam,
enquanto não se respeitarem sentimentos, emoções, valores, opções e a dignidade
que são devidos a toda a pessoa humana.
Claro que parece inevitável que o exercício dos
valores, a existência de sentimentos nobres, em muito ajuda para o sucesso das
relações humanas, sejam pessoais, profissionais, empresariais ou quaisquer
outras. Quando não se respeitam sentimentos, emoções, valores e princípios das
pessoas, não se lhes está a reconhecer a dignidade, a honra, e até o seu bom
nome.
O valor da amizade só se tornará efetivo, se
envolvido em sentimentos de amor sincero, entre verdadeiros amigos, que são
capazes de dar prioridade total ao relacionamento entre eles, independentemente
de outros afazeres, situações interesses e pessoas. A amizade entre dois
amigos, quando genuína, estará sempre em primeiro lugar, e a comunicação, os atos
mais singelos, são veículos insubstituíveis para a manter consolidada e
inabalável.
Este sentimento bem profundo, bem legítimo que é o “Amor-de-Amigo”, que se nutre por outra
pessoa, é inegociável, não tem qualquer preço, nem quaisquer condições, é
ilimitado e permanece indestrutível, quando firmado nos valores da lealdade, da
solidariedade, da reciprocidade e da cumplicidade.
Este sentimento fortíssimo, que é o “Amor-de-Amigo”, que em nada se confunde
com o amor conjugal, filial, fraternal, e outros de natureza familiar, dir-se-á
que se consubstancia ao nível da dignidade, do respeito, da nobreza e
generosidade do caráter, e de uma certa elevação espiritual, porque não pressupõe
relações sexuais, nem quaisquer outras intenções inconfessáveis.
Trata-se de um sentimento que não é próprio de
“aventureiríssimo”, de “conquistas de fim-de-semana” ou de coleção de “casos”. Ele
pauta-se pelo carinho, pelos gestos ternos, meigos e sinceros. Estará próximo
do “Amor Platónico”. É um amor ideal que conduz, justamente, à felicidade dos
amigos, enquanto tais.
Vivem-se emoções, cumplicidades, reciprocidades,
solidariedades, lealdades, sempre com total amizade. O fim deste amor singular,
acabará com a morte física do último dos dois amigos, mas sobreviverá,
espiritualmente, se eles acreditarem numa vida celestial, para além da morte
biológica.
Como conclusão pessoal, defendo que o “Amor-de-Amigo” é um sentimento que se
considera inegociável, intransmissível e insubstituível: ou se tem e se
pratica, amando o amigo incondicionalmente e para todo o sempre; ou não se tem,
e vive-se um pouco na solidão e nas margens do “Rio da Felicidade”.
Bibliografia
BAKER, Mark W., (2005). Jesus o Maior Psicólogo que já
Existiu.Trad. Cláudia Gerpe Duarte. Rio de Janeiro: Sextante.
BRIAN L. Weiss, M.D. (2000). A Divina Sabedoria dos Mestres. Um
Guia para a Felicidade, alegria e Paz Interior. Trad. António Reca de Sousa.
Cascais: Pergaminho.
HANH, Thich Nhat, (2004). Criar a Verdadeira Paz.
Cascais : Pergaminho
RESENDE, Enio, (2000). O
Livro das Competências. Desenvolvimento das Competências: A melhor Auto-Ajuda
para Pessoas, Organizações e Sociedade. Rio de Janeiro: Qualitymark
Diamantino
Lourenço Rodrigues de Bártolo
Jornal:
“Terra e Mar”
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