A cumplicidade entre as ciências sociais e humanas,
com destaque para as ciências da educação e as ciências ditas positivas, ou
exatas, é uma inevitabilidade que deve cimentar a formação deste novo cidadão,
sem que se lhe exija que tenha de assumir-se como filósofo, advogado, educador,
professor, cientista ou técnico de qualquer outra área do saber.
Por isso é muito importante que este cidadão esteja
sensibilizado para interiorizar e levar à prática um projeto de relacionamento,
o melhor possível, com aqueles domínios dos: “Saber-ser, Saber-estar,
Saber-fazer” e “Saber-Conviver-com-os-Outros”,
para melhor compreender e exercer os seus deveres e direitos, numa sociedade
investida das condições de dignidade, que assiste a todos os seus elementos
constituintes, desde logo o Homem-cidadão, em comunhão profunda com a natureza
e com Deus.
A aposta fortíssima que se coloca, atualmente, pode
passar pelo reconhecimento, descomplexado, quanto à necessidade de considerar a
Filosofia e as Ciências da Educação como mais dois dos níveis do conhecimento,
que importa incluir com uma dimensão inequivocamente significativa, nos
currículos escolares, a todos os graus de ensino e formação profissional.
Com efeito: se por um lado, se conhece a problemática
que envolve os sistemas educativos e formativos; por outro lado, é notória
alguma incapacidade para muitas famílias darem um maior apoio aos seus
educandos, por razões várias, e que também estão identificadas: a necessidade
de o casal trabalhar fora da sua área de residência, entregando os filhos aos
cuidados dos estabelecimentos, próprios para cada idade; a que acresce um outro
conjunto de fatores que alteram e provocam mudanças profundas nos hábitos,
opinião pública e mentalidades, que impedem os pais de terem uma intervenção
mais ativa e profícua junto dos seus filhos:
«Hoje torna-se cada vez mais árdua para os pais a
tarefa de guiarem os filhos pelas várias etapas da sua vida. Na sociedade da
tecnologia avançada, dos mass-media e da globalização, tudo se torna tão
rápido; e a distância cultural entre as gerações é cada vez maior. Os apelos
mais diversos e as experiências mais imprevisíveis cedo invadem a vida das
crianças e adolescentes, e os pais sentem-se às vezes angustiados para fazer
face aos riscos que aqueles correm. Não é raro experimentarem fortes
desilusões, constatando a falência dos seus filhos perante a sedução da droga,
o fascínio dum hedonismo desenfreado, as tentações da violência, as expressões
mais variadas da falta de sentido e de desespero.» (PAULO II, 2003:19).
Também o homem tem de proceder à sua própria
globalização interna, estruturando-se e adaptando-se aos novos tempos, destes
novos século e milénio que, apesar de tudo, se desejam de felicidade. A
indiferença que alguns setores, mais renitentes à mudança, ainda manifestam,
deve ser substituída por uma abertura ao mundo global, de forma a facilitar o
melhor aproveitamento das sinergias dos tecnocratas positivistas e dos
pensadores idealistas.
O homem transporta em si três mundos: o material,
com todo o peso da natureza; o imaterial com a profundidade dos seus
sentimentos, emoções e personalidade própria e o artificial resultante de tudo
quanto ele vai construindo. O novo cidadão saberá construir um mundo
artificial, mais verdadeiro e mais justo.
A construção deste novo mundo artificial, em nada
prejudica as realidades concretas, visíveis e palpáveis que a todos envolvem, e
nem sequer menoriza a Natureza circundante, da qual o próprio homem também é
parte integrante.
Este mundo, o artificial, construído com a
inteligência e habilidade humanas, permitirá ao cidadão, adaptar a própria
Natureza e muitos dos seus elementos, às necessidades humanas, o que implica,
por parte da sociedade, uma predisposição para novos valores, novos rituais e
formas de vida, sem que isso interfira numa eventual e hipotética perda de
dignidade, bem pelo contrário, quanto mais o homem inovar e produzir, tanto
melhor poderão ser a sua qualidade e nível de vida.
Em boa verdade: «Construir sociedades abertas à
inovação é o caminho certo para responder ao desafio da globalização. A
inovação é o facto que permite pôr o conhecimento ao serviço do
desenvolvimento, sem a inovação o conhecimento tende para a esterilização. Uma
sociedade que não está desperta para a inovação, não só perde o seu capital de
saberes e de experiências, como tende a perder os seus recursos humanos mais
qualificados.» (MARTINS, 2003:14).
A par de todo o processo de globalização em curso,
das dinâmicas da inovação e da racional e equilibrada aplicação dos
conhecimentos e experiências, caminharão, igualmente, e em
interdisciplinaridade, todo um conjunto de valores, de princípios e de
comportamentos que integram as diversas culturas.
Insistir em separações epistemológicas,
discriminações negativas, secundarização de conhecimentos e experiências não
validadas academicamente, em benefício dos que são adquiridos exclusivamente
pela via universitária; assumir posições que humilham homens perante outros
homens, recorrendo a comportamentos de discriminação por causa da raça, sexo,
etnia, cultura ou quaisquer outros argumentos, parece que são estratégias
ultrapassadas, e talvez inaceitáveis.
Que não
restem dúvidas: «O nosso dever é o de afirmar que não existem raças, mas
seres humanos; que o ódio racial é um dos mais terríveis flagelos da
humanidade; que a expressão mais violenta do ódio racial foi o estado
hitlerista; que a aparição de uma suástica é uma sombra da morte. Cabe aos
homens de boa-vontade cancelá-la, num pacto de solidariedade.» (LAFER, 2003:12).
Torna-se cada vez mais premente, uma sociedade
onde não haja mais lugar aos linchamentos públicos por força dos pensamentos,
convicções, ideologias político-partidárias, religiosas e outras, que cada um
tem o direito de professar. É este o cidadão global que se deseja para o mundo
deste novo século XXI, desde logo a desenvolver-se a partir dos espaços
luso-brasileiro, lusófono e ecuménico. Um cidadão de valores, de crenças, de
persuasões, de trabalho e de autoestima. Um novo e respeitável cidadão do
mundo.
Pretende-se,
obviamente, denunciar a situação do ainda não exercício pleno da cidadania,
aqui entendida como conjunto de deveres e direitos dos cidadãos, em muitos
locais do mundo. Este é que é o verdadeiro problema, para se apontar, ao longo
dos trabalhos e algumas soluções que se julgam não só exequíveis como também
desejáveis.
Temática
central, assente numa filosofia da educação para a cidadania, à qual responde,
de forma inovadora, uma possibilidade real, ainda que demorada, da construção,
no sentido da educação e formação, de um novo cidadão, através da invocação, o
mais exaustiva possível, de um outro cidadão, pretensamente luso-brasileiro,
cuja vida, princípios e valores se podem considerar modelares, não obstante, e
à sua época, os problemas serem diferentes, alguns deles, porém, mantêm a
atualidade, neste primeiro quarto de século.
Bibliografia
LAFER, Celso (2003) O Supremo Tribunal Federal e o caso Ellwanger, Apud
Norberto Bobbio in: O Mundo em Português,
S. João do Estoril: Principia, Publicações Universitárias e Científicas, 49-outubro,
11-13,
MARTINS, Vítor, (2003) O Desafio da Inovação na Era Global, in: O
Mundo em Português, Revista de Assuntos Internacionais, S. João do Estoril:
Principia, Publicações Universitárias e Científicas, N. 49, outubro, 14-15.
PAULO II, João, (1999b).
Audiência Geral 01/12/1999, in: Revista
Arautos do Evangelho, São Paulo: Associação Arautos do Evangelho, Ano II,
(22), outubro-2003, pp.6-11
Venade/Caminha – Portugal, 2020
Com
o protesto da minha perene GRATIDÃO
Diamantino
Lourenço Rodrigues de Bártolo
Presidente
do Núcleo Académico de Letras e Artes de Portugal
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