Na
verdade, o Papa Paulo VI, em sua primeira mensagem para o
dia de Ano Novo, dizia: «Dirigimo-nos a todos os homens de boa vontade, para
os exortar a celebrar o Dia da Paz, em todo o mundo, no primeiro dia do ano
civil, 1 de Janeiro de 1968. Desejaríamos
que depois, cada ano, esta celebração se viesse a repetir, como augúrio e
promessa, no início do calendário que mede e traça o caminho da vida humana no
tempo que seja a Paz, com o seu justo e benéfico equilíbrio, a dominar o
processar-se da história no futuro.» (in: http://pt.wikipedia.org/wiki/Dia_Mundial_da_Paz
(22.04.2020).
Muitas são as dimensões que acompanham a existência humana, ainda que as
culturas, histórias, civilizações tenham, e exerçam, os valores que consideram
próprios de cada povo. Praticamente, é impossível conseguir adaptar-se valores,
e as respetivas boas-práticas, comuns a todas as pessoas, e embora se deseje
acreditar, que haverá valores que toda a gente gostaria de possuir, e usufruir
plenamente, como por exemplo: Saúde, Trabalho, Família, Solidariedade, Justiça,
Felicidade e Paz, o certo é que não é seguro que assim seja.
A Paz não é, apenas e/ou necessariamente, a ausência de guerra. Ela
envolve, por si só, outros valores, outras práticas, de tal forma que se não
existirem e não forem fruídos, então a Paz será, tão só, uma condição em que se
vive, mas que não traz à pessoa humana, a tranquilidade para viver feliz, com
entusiasmo, dinamismo e projetos de vida. A Paz, no conceito de ausência de
guerra, é muito pouco. A Paz tem de comportar outras exigências, dimensões e
realizações, para que contribua para a dignidade humana.
É rigorosamente verdade que o mundo é um aglomerado de seres, de
fenómenos, de mistérios. O ser humano é, porventura, no campo do que já se
conhece, o mais evoluído de todos, aquele que, verdadeiramente, constrói,
destrói, desenvolve e desfruta de uma cultura, desde logo, na sua própria educação,
formação ao longo de toda a vida, sem que alguma vez se sinta plenamente
realizado, feliz, todavia, poderá encontrar alguma tranquilidade, uma sensação
de bem-estar, de conforto material e espiritual.
Se assim for, então, parta-se da aceitação de que a Paz deve começar em
cada pessoa e depois, qual vento circulante, expandir-se para as outras
pessoas, cada uma destas, igualmente se esforçando por construir a sua própria
Paz, continuando a envolver sempre mais pessoas, povos e nações. Resulta que a
grande estratégia será a soma das “Pazes” individuais para se erigir a Paz Mundial,
porque é necessário o contributo de todos, em liberdade e com responsabilidade.
Com efeito: «A
Paz é a prática da consciência plena, a prática de estar ciente dos nossos próprios
pensamentos, das nossas ações e das consequências das nossas ações. A
consciência plena é simultaneamente simples e profunda. Quando somos plenamente
conscientes e cultivamos a compaixão da nossa vida diária, diminuímos a
violência a cada dia que passa. Temos um efeito positivo na nossa família, nos
amigos e na sociedade» (HANH, 2003:11).
Este valor inestimável, procurado pela esmagadora maioria das pessoas,
povos e nações, encontra sempre imensos
obstáculos, porque a Paz tem de começar a existir no espírito de cada
indivíduo, é ele que tudo deve fazer para “contaminar” os outros, qual bola de
neve ou, no pior dos sentidos, qual “pandemia”.
Enquanto não forem erradicados objetivos
individuais de puro egoísmo, do poder-pelo-poder, de domínio arrogante,
prepotente, ditatorial e desumano; enquanto predominar o Ter sobre o Ser; a
perseguição sobre a reconciliação; a vingança sobre o perdão; a hipocrisia
sobre a lealdade; a ambiguidade sobre a solidariedade, a Paz é, praticamente,
uma utopia.
Claro que toda a utopia, mais tarde ou mais cedo,
ao longo da História da Humanidade, pode-se tornar realidade, tudo dependendo
da determinação de cada pessoa em “lutar” pela sua própria utopia, pela Paz e
ajudar os seus semelhantes a conquistar e praticar este supremo bem.
É fundamental que se tenha a coragem, e também a
humildade, de se autoavaliar, reconhecer que se errou, corrigir tudo o que
intencionalmente, ou não, foi realizado para prejudicar outras pessoas, para
humilhar, desconsiderar, magoar e desgostar. Enquanto esta situação perdurar em
cada pessoa, ela não terá Paz consigo própria, logo, não está em condições de
contribuir para uma verdadeira Paz alargada a toda a gente.
Portanto, é condição “sine qua non” que se comece por avaliar o grau de culpabilidade na
ausência da Paz individual porque: «A
verdadeira culpa é o remorso que sentimos quando magoamos aqueles que amamos;
ela nos faz ter vontade de corrigir as coisas no nosso relacionamento com os
outros. A falsa culpa é o medo da punição que está mais ligada à necessidade de
nos protegermos depois que fazemos algo errado. A falsa culpa raramente
beneficia o nosso relacionamento com os outros. Na verdade, ela em geral nos
prejudica e nos torna pessoas de convivência mais difícil.» (BAKER,
2005:79).
No início de cada ano, mais concretamente, no dia
01 de janeiro, dia de Ano Novo comemora-se uma efeméride relativa ao “Dia
Mundial da Paz”, os apelos à Paz vêm de todos os quadrantes: religiosos,
políticos, económicos, empresariais. Considera-se, então, naquele dia, a Paz
como um desígnio universal, a alcançar e consolidar.
A realidade é bem diferente porque: «Todos
nós sonhamos com uma vida melhor, uma sociedade melhor. Contudo, tornou-se
difícil passar um dia que seja sem nos desiludirmos, sem nos sentirmos
desapontados, sem nos sentirmos sugados pelas pessoas mesquinhas e egoístas que
nos rodeiam. Parece que uma grande maioria das pessoas só está interessada nos
seus ganhos pessoais. Tornaram-se rudes e arrogantes, críticas e insensíveis.
As suas acções não só nos deprimem, como também nos fazem sentir que não
podemos fazer nada para mudar este estado de coisas e que apenas os que estão
no poder têm capacidade de fazer a diferença.» (BRIAN, 2000:138).
Seguramente que a Paz é um bem supremo, um valor, um desígnio, enfim,
eventualmente, o bem último a que o ser humano aspira e que persegue,
incessantemente, até nas expressões mais simples como: “Deixem-me em Paz” se confirma este desejo universal. Mas a Paz é um
objetivo difícil de alcançar, não necessariamente porque o ser humano não tenha
inteligência, e meios para dela se aproximar, mas porque os conflitos internos
em cada pessoa, estão sempre latentes.
Evidentemente que nenhuma das posições individuais – pessimismo – otimismo
– quando exageradas poderá conduzir, com segurança, à Paz, mas, provavelmente,
um otimismo moderado, realista, racional e também com um pouco de sentimento e
emoção, ajuda imenso, pelo menos a acreditar, a ter fé na possibilidade da Paz,
com todos os outros valores, e oportunidades que ela proporciona no mundo.
Seguramente, não um otimismo
santificado, ingénuo e “cor-de-rosa”,
porque este pode levar ao desespero, na medida em que o mundo,
indiscutivelmente, não é fácil, nem imutável e, muito menos, girando à volta de
cada pessoa, de cada interesse. O mundo tem “esquinas muito pontiagudas”, “espinhos
venenosos”, e “alçapões sem fundo”,
por isso é importante ter-se em atenção esta e outras realidades.
A estratégia para a Paz passa, portanto, pelo otimismo racional,
realista, com emoção, sentimento e entusiasmo e, nesse sentido: «Não nos detenhamos na imagem Épinal (Épinal é uma cidade situada no nordeste da França, capital do departamento de Vosges, na região Lorena. A cidade é atravessada pelo rio Mosela. Épinal é a cidade de nascimento de Émile Durkheim e de Marcel Mauss) do otimismo
beato. Por trás desse cliché de que gostamos de troçar esconde-se um grande
número de qualidades: a esperança, a determinação, a faculdade de adaptação, a
lucidez, a serenidade e a força de caráter, o pragmatismo, a coragem e até a
audácia, outras tantas qualidades que se encontra no soukha, a verdadeira
felicidade». (RICARD, 2003:180).
Está
identificado, a partir da determinação da pessoa, o rumo a seguir para se
chegar ao bom porto da Paz. Um rumo que será estimulante de se perseguir, desde
já com a força da solidariedade entre todas as pessoas de boa-vontade, porque,
afinal, a solidariedade dever ser: «Entendida
como sentimento de fraternidade, de adesão, de felicidade e de compreensão que
nos impele a cuidar, apoiar e animar mutuamente, é uma força natural que incute
confiança, segurança, esperança e fomenta uma perspectiva mais comunitária do
mundo menos individualista.» (MARCOS, 2011-122). Sim, a Paz é possível,
assim a queiramos todos unidos. Mãos à obra e Paz para todos.
Bibliografia
BAKER, Mark
W., (2005). Jesus o Maior Psicólogo que já Existiu. Tradução, Cláudia Gerpe
Duarte. Rio de Janeiro: Sextante.
BRIAN L.
Weiss, M.D. (2000). A Divina Sabedoria dos Mestres. Um Guia para a Felicidade,
alegria e Paz Interior. Tradução, António Reca de Sousa. Cascais: Pergaminho.
HANH, Thich Nhat, (2004). Criar a Verdadeira Paz. Cascais : Pergaminho
MARCOS, Luís
Rojas, (2011). Superar a Adversidade, O Poder da Resiliência. Tradução, Maria
Mateus. Lisboa: Grupo Planeta.
RICARD, Matthieu,
(2005). Em Defesa da Felicidade. Tradução, Ana Moura. Cascais: Editora
Pergaminho, Ld.ª
Venade/Caminha
– Portugal, 2020
Com o protesto
da minha perene GRATIDÃO
Diamantino
Lourenço Rodrigues de Bártolo
Presidente do
Núcleo Académico de Letras e Artes de Portugal
http://nalap.org/Directoria.aspx
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