Aceita-se, pacificamente, que a política deveria
ser uma atividade humana, das mais nobres e solidárias, entre muitas outras,
que toda a pessoa desempenha ao longo da vida. A política justificar-se-ia pela
dignidade, solidariedade e lealdade dos seus agentes diretos, isto é: por
aqueles, que no terreno, a exercem, suposta e desejavelmente, para resolver
problemas que afetam a honra, a respeitabilidade e o bem-estar de toda a
comunidade, onde se exerce esta dimensão da pessoa verdadeiramente humana.
Ao longo da história da humanidade, e recuando à Polis
grega, a política tem merecido uma atenção especial, e tem sido objeto de uma
apetência muito significativa, se comparada com outras atividades humanas.
Enquanto possibilidade de intervenção na sociedade, talvez se possa admitir que
a sua influência, para o bem e para o mal, é sentida de forma bem acentuada,
por quem a vive, ou beneficia, ou sofre os seus efeitos.
Se se comparar a atividade política com outras que
a pessoa exerce, durante a sua vida, nomeadamente: religiosa, filosófica,
económica, financeira, empresarial e profissional, no limite, poder-se-á
comprovar que pelas medidas que os políticos tomam, democrática legítima e
legalmente, ela pode afetar todas as demais atividades, a partir do poder
legislativo, que depois é implementado pelo poder executivo e sancionado pelo
poder judicial, ou seja: todos aqueles poderes são, de alguma forma, controlados
pelo poder político em geral.
A política é, por isso mesmo, irresistível e quem se
envolve nela fica tocado para o resto da vida, por diversas razões: pelo poder
que confere aos seus agentes ativos; pela rede sociopolítica que se cria; pelas
influências que, em diversas áreas da sociedade, se desenvolvem e pela
capacidade que ela proporciona, no sentido de resolver situações, desde logo,
em relação a quem mais precisa, justamente, pela possibilidade que existe em
legislar e intervir diretamente no terreno, para resolver problemas concretos
das populações. Assim deveria acontecer sempre; aqui reside a nobreza da
política.
Mas será que a política atual está ao serviço
efetivo das populações, especificamente das camadas mais carenciadas: crianças,
jovens, desempregados, idosos, pensionistas e reformados, minorias de
diferentes origens, estatutos e convicções diversas? Ou, pelo contrário, a
política estará cada vez mais ao serviço de minorias económicas, financeiras e
profissionalmente poderosas? A quem serve e quem se aproveita, afinal, da
política?
Um pouco por todo o mundo, assiste-se a um certo
descrédito da política, pelo menos em determinadas intervenções setoriais, e
também de alguns políticos! Porquê? Será que já não é uma atividade nobre, ao
serviço do bem-comum? Estará a política a transformar-se num instrumento de
subjugação, de prepotência, de violência sobre os mais fracos, sobre aqueles
que já não têm capacidade de fazer greves e parar um país?
A política será uma forma de proteger e orientar
aqueles que pertencem a determinados grupos/famílias? Que têm certas
afinidades, a quem a política, por via legislativa, até pode favorecer,
generosamente, à custa de quem não tem conhecimentos, amigos e familiares, num
determinado setor político-partidário e governamental?
Chegar ao poder político não será assim tão fácil,
porque pela via democrática, com o apoio numa determinada força política, o
sistema está permanentemente controlado pelos movimentos e partidos políticos, por
isso é com muita dificuldade que as organizações de cidadãos independentes
chegam ao poder, muito embora se reconheça que os movimentos autónomos das
forças políticas estão a surgir cada vez mais, no contexto do Poder Local.
Por outro lado, pela via não democrática, tipo
golpe de estado, este processo, praticamente está acessível, apenas, às forças
que possuem meios bélicos e humanos, em quantidade e qualidade, ou a grupos
civis organizados, porém, sempre apoiados pelas forças militares, e/ou de
segurança. Tem sido, quase sempre assim, na maioria das situações em que se
verificou mudanças de governos e até de regimes.
Importa, aqui e agora, refletir sobre a chegada ao
poder, pela via democrática, que implica eleições livres, universais, justas e
transparentes, em que os cidadãos, organizados em forças e movimentos
políticos, ou listas de pessoas independentes, para algumas eleições, disputam o
poder para um determinado órgão, ou seja: eleições para a Assembleia da
República, a partir da qual se constitui (ou deveria formar) o Governo; para a
Presidência da República; para as Autarquias Locais e para o Parlamento
Europeu. Estas são as eleições que ocorrem, ciclicamente, em Portugal.
Chegados a este ponto, é aqui que o regime
político-democrático se evidencia. É aqui que a política começa a
credibilizar-se, ou não, tudo dependendo do que se seguir após um ato
eleitoral, isto é: entre o que se afirma e promete, numa campanha eleitoral, e
o que depois se cumpre.
O que se tem verificado é que, muitas vezes,
existem duas realidades diferentes: a sedução que através das mais
deslumbrantes promessas políticas que os candidatos/forças políticas fazem
durante a campanha eleitoral, para a captação do voto; e o que acontece depois
das eleições.
Infelizmente: a sedução passa a ilusão; a utopia, a
descrédito; à mais atrevida inverdade, ao sofrimento e morte lenta da maioria
que acreditou na palavra de quem prometeu o que, afinal, não foi capaz de
cumprir. É justo e legítimo que, sempre que necessário, e justificadamente, se
ponha em causa a credibilidade da política, e dos que dela se servem para
atingir certos fins que não o bem-comum.
Perdeu-se o respeito por quem, de boa-fé, e
acreditando, piamente, nos projetos que, em campanha eleitoral, eram
apresentados, depois são executados, precisamente, em sentido e com medidas
legislativas opostas, por exemplo: “prometo-te trabalho, depois dou-te
desemprego”; “anuncio-te menos impostos, depois aplico-te uma carga brutal de
taxas, sobretaxas, cortes salariais, redução das pensões e reformas e tudo o
mais”, “que nem ao Diabo lembra”; “asseguro-te
que manterás os direitos adquiridos”, alguns deles desde há mais de quarenta anos,
mas depois reduzo, ou elimino tais direitos.
Enfim, “garanto-te o paraíso, mas quando eu chegar
ao poder vais parar ao inferno”, completamente desapossado de tudo o que, com
tanto sacrifício, conseguiste juntar, durante uma longa e pensosa vida de
trabalho, na Terra, cumprindo sempre com os deveres que te impunham.
A questão que se coloca é muito simples, objetiva e
direta: pode-se confiar na política e em alguns políticos que vão governando as
comunidades, os países e o mundo? Pode-se acreditar numa política de pura
sedução, de simpatias, de promessas e aparentes afetividades, quando, pelos
exemplos mais recentes, o povo é atraiçoado e atacado, tão violenta, ilegítima
e ilegalmente?
Sim, porque é sabido que algumas medidas são: violentas
e dolorosas, que provocam o sofrimento, pela penúria a que as pessoas e
famílias passam a viver, pelo desemprego, pela fome pela exclusão e,
finalmente, pelo suicídio; ilegítimas, porque quando se depositou o voto na
urna, e se confiou num projeto, este não é executado como apresentado; ilegais,
porque são as mais altas instâncias dos Órgãos de Soberania que assim o
declaram, embora por alegada “emergência
nacional” e, com tal argumento, até se suspendem as mais elementares e
sagradas normas constitucionais, ressalvando-se, contudo, o caráter temporário
e excecional.
É este poder político que serve as justas
aspirações do povo? Esta é que é a nobreza da política? São tais políticos
merecedores da confiança dos seus eleitores? Onde está a Democracia? Onde está
a lealdade política? Onde está a solidariedade para com os mais carenciados e
desprotegidos?
Enquanto se continuar a tratar as pessoas como
meros números fiscais; enquanto a política de sedução não se converter em
política de dignificação do regime democrático; enquanto não se colocar as
pessoas em primeiro lugar; enquanto não se respeitarem os direitos adquiridos;
enquanto se atacarem as pessoas, famílias, grupos, empresas com cargas brutais
de impostos, taxas, impostos sobre impostos; enquanto não houver cidadãos que
tenham a coragem de colocar a política ao serviço do bem comum, dos mais fracos
e necessitados e enquanto não se cumprir com a palavra dada, caminhar-se-á para
o abismo, para o desmantelamento das classes produtivas.
Certamente, o rumo será no sentido de se colocar
aqueles que já deram tudo ao país, (que ajudaram a formar quem governa), no
monte, envolvidos numa manta rota, com uma côdea de pão duro e uma garrafa com
alguma água inquinada; passar-se-á para a morte lenta, sem honra nem glória,
para quem se deixou seduzir por promessas enganadoras.
A política, e especialmente uns tantos políticos,
também algumas instituições, quaisquer que elas sejam, devem ser urgentemente
reabilitados, principalmente quem caiu no descrédito total, aqueles e estas,
que durante muito tempo, não tiveram a possibilidade de cumprir com o que
prometeram a um povo humilde, trabalhador, honesto e confiante, a um povo que,
de boa-fé, acreditou nos seus concidadãos, nos seus ”filhos e outros parentes”, que os preparou, talvez mal, para agora
exercerem um poder “democraticamente
despótico”.
Que todos metam a mão na consciência e, com
humildade, recuem nas medidas que impõem de forma brutal, ilegítima e,
eventualmente, ilegal. Ainda estão a tempo para mostrarem sensibilidade social.
O povo merece respeito, porque é digno e
constituído por pessoas humanas de bem. Não pode ser tratado como mero
instrumento para se alcançarem objetivos que apenas têm provocado miséria, fome
e morte. Dignifiquem-se a política, os políticos e o regime democrático.
Venade/Caminha – Portugal, 2020
Com
o protesto da minha perene GRATIDÃO
Diamantino
Lourenço Rodrigues de Bártolo
Presidente
do Núcleo Académico de Letras e Artes de Portugal
NALAP.ORG
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