Quando, cuidadosamente, estudamos a História da
Humanidade, obviamente, à escala global, possivelmente, não haverá um período,
um continente, um país, uma organização ou até uma pessoa, que não tenha
experienciado algum tipo de crise: na saúde, no trabalho, na economia, nos
valores, nos sentimentos, nas relações interpessoais. O mundo sempre viveu, lutou
e venceu inúmeras crises. O Ser Humano, dotado de extraordinárias capacidades:
científicas, técnicas, intelectuais, manuais, entre outras, tem estado na linha
da frente para as vencer.
As crises: umas mais acentuadas; outras mais
superficiais, podem converter-se em grandes e únicas oportunidades de mudança,
desejavelmente, para melhor, embora não se ignore que algumas são dilacerantes,
precisamente, quando impõem sacrifícios excessivos, praticamente,
insuportáveis: seja à sociedade no seu todo; seja às organizações; seja às
pessoas, individualmente consideradas.
E se há crises pandémicas, financeiras, económicas,
empresariais, políticas, religiosas, axiológicas e tantas outras, seguramente
que algumas delas interferem, diretamente, ou contaminam, pela negativa, os
sistemas culturais, afetando: princípios, valores humanos, deveres e direitos
inalienáveis, que se refletem, posteriormente, nas gerações vindouras, com as
consequências mais imprevisíveis, eventualmente, nefastas e irreversíveis.
Atualmente, primeiro quarto do século XXI, vivem-se,
entre outras crises, duas que são, certamente, muito complexas: em que valores
ancestrais, que suportam a convivência harmoniosa e tranquila da sociedade, e
da dignidade da pessoa humana, estão a ser alterados, desconhecendo-se, por
enquanto, se para melhor ou para pior, desejando-se, contudo, que estes
supostos novos valores, se dirijam para o bem-comum da humanidade; a outra,
pandémica, que vem destruindo pessoas, empresas, sistemas económicos e
financeiros, a partir de fevereiro de 2020.
Entretanto: «Para
se compreender a amplidão e a natureza da crise do tempo atual, é preciso levar
em conta que entraram em crise o mundo moderno e a cultura que o sustentava e
animava. É, portanto, a crise de um mundo, das suas raízes culturais e das
instituições que estas inspiraram. É uma crise que atinge a época moderna
inteira, e não este ou aquele aspeto desta.» (DENNY, 2003:61).
A capacidade humana, tem condições para acreditar
ser capaz de vencer a maior parte das crises, excluindo-se, aqui, algumas de
origem natural, que o Ser Humano não consegue evitar, mesmo que as preveja, com
alguma, por vezes, certamente, pouca, antecedência, sendo garantido que,
posteriormente, desenvolve os estudos e as técnicas para minimizar os efeitos, por
vezes catastróficos, porém, e ainda assim, nem todos, nomeadamente, quando
existem vítimas mortais.
Uma parte significativa das crises, acabam por ser
solucionadas, graças à ciência e à técnica, porque: «A fé no progresso indefinido está ligada à fé na ciência. É esta
segunda idéia-força do mundo moderno, do qual o cientista é considerado o
profeta: a sua palavra é escutada com reverência e fidúcia, porque emana da
ciência a única fonte da verdade e, sobretudo, emana a força capaz de dominar a
natureza e de colocá-la a serviço do homem. Também esta fé na ciência remonta
ao iluminismo, mas cresce nos séculos XIX e XX, depois das grandes descobertas
científicas que revolucionaram a vida do homem sobre a terra, prometendo torná-la
mais agradável e mais humana.» (Ibid.:64).
É sabido que determinadas situações, da vida humana,
se podem considerar crises, desde logo no domínio da saúde, porque algumas
doenças fazem com que as suas vítimas entrem e permaneçam em crise, em alguns
casos até à morte, porquanto: nem a ciência; nem a técnica, conseguiram
qualquer solução para erradicar certos males, todavia, não se deve perder a fé
nos progressos científico e tecnológico, na medida em que, também neste setor,
já foram debeladas muitas doenças que, inicialmente, eram consideradas
incuráveis.
As crises são, portanto, os motores, as motivações
que fazem avançar o progresso, por isso não se justifica a perda de esperança
nos cientistas, bem pelo contrário, assim como as razões para estarmos
otimistas, porque: «A fé no progresso
vê-se ofuscada depois das duas grandes guerras mundiais do século XX, e é
criticada duramente por parte de pensadores de diversas origens culturais
(Spengler, Burckhardt, Meimecke, Lowith, Toynbee). Apesar disto, na mentalidade
corrente, esta sempre vive a convicção de que o progresso científico levará a
humanidade à libertação de todos os males e a uma era de maior felicidade.»
(Ibid.).
Consolidar a fé no progresso, no que respeita, por
exemplo, a melhorar as condições da alimentação em todo o mundo, a fim de
reduzir a fome e a subnutrição, é um motivo de grande esperança para a
humanidade, na medida em que são milhões de pessoas a tentarem sobreviver, até
à exaustão, nesta crise terrível, mas que se acredita, mais cedo ou mais tarde,
será solucionada.
Hoje: «Na
realidade, em razão da ciência, a humanidade ou, mais precisamente, uma parte
desta, representada pelo mundo ocidental, consegue libertar-se de uma condição
de pura subsistência e de miséria generalizada, para entrar em uma era de
abundância e de bem-estar. Consegue vencer um grande número de doenças mortais
e estender, a todos, os benefícios da escola e da cultura. Assim, a fidúcia no
progresso científico como causador de bem-estar tornou-se, no correr dos
séculos, mais e mais absoluta.» (Ibid.:64-65).
Refletir sobre as crises, é uma tarefa simultaneamente
interessante e preocupante: interessante, porque “aguça” a inteligência e a
sensibilidade humana para a investigação e a descoberta de soluções possíveis,
no sentido de resolver, e/ou pelo menos, minimizar as sequelas dessas crises;
preocupante, porque, por vezes, as consequências são tão profundas, duradouras
e, eventualmente, irreparáveis, que levam ao desespero, e a desacreditar nas
possibilidades que o progresso científico e a tecnologia podem proporcionar.
É evidente que não nos podemos deixar abater por
incertezas infundamentadas, nem por receios de que tudo estará perdido, face a
crises mais acentuadas, nas suas causas e desfechos, num espaço e num tempo
definidos. O mundo atual, a sociedade em geral: devem, têm de estar preparados
para vencer, porque a condição humana tem, praticamente, todas as condições
para continuar a sua senda de desenvolvimento e progresso.
Vivem-se tempos diferentes, com princípios,
valores, sentimentos, oportunidades e hábitos que, sendo, possivelmente,
distintos, também proporcionam boas razões para estarmos otimistas: «Assim, o mundo moderno é todo dominado
por um grande projeto humanístico, que é a realização sobre a terra de uma vida
digna, ou seja, um modelo de vida do qual sejam eliminados, na medida mais
ampla possível, o sofrimento, a opressão, as discriminações e o medo. Mundo em
que o homem possa ser livre e digno na posse dos bens, no exercício dos
direitos civis, na paz.» (Ibid.:68).
Existem mais razões para estarmos confiantes e
termos fé no progresso, do que martirizarmo-nos com um pessimismo que não se
justifica plenamente. Os “tempos atuais”
são de grande esperança no futuro, porque afinal são mais os aspetos positivos
que se tem conseguido, do que os negativos, obviamente, com profundo respeito,
e solidariedade, para e com todas as pessoas que ainda sofrem os problemas
resultantes das vicissitudes da vida, dos projetos de violência concebidos e
levados à prática por grupos radicais, e/ou dirigentes, cientistas, técnicos,
políticos, religiosos e diversas organizações fundamentalistas.
Importará, agora, destacar que: «Na parte positiva, devem ser colocados os
seus extraordinários melhoramentos – cultura, saúde e teor de vida. Além disso,
foram debelados flagelos como a mortalidade infantil, as carestias, a peste,
que, junto com a guerra, constituíam o pesadelo das gerações precedentes. A
duração média de vida aumentou de maneira inimaginável com relação ao passado.
Tornaram-se enormemente mais fáceis e seguras as viagens e os transportes. As
relações comerciais foram incrementadas. As comunicações entre os homens cresceram
enormemente. Com a diminuição das distâncias, operada pelos meios de
comunicação, o mundo se tornou uma aldeia global.» (Ibid.:69).
É num espaço, aparentemente, cada vez mais pequeno
que o Ser Humano se movimenta e, apesar dos seus imensos recursos pessoais, bem
como os que a natureza coloca ao seu dispor, para melhor conforto e mais
abundância, a incerteza quanto ao seu futuro continua a ser, quem sabe, a sua
maior crise, porque se: fisicamente, tudo indica que está esclarecido; no
domínio metafísico, no que concerne à sua espiritualidade, a angústia permanece
inexoravelmente.
O destino da pessoa humana, na sua dimensão
espiritual, principalmente para quem acredita que ela existe, é, portanto, uma
outra crise que, provavelmente, não será resolvida pelos cientistas, nem pelos
técnicos, de resto, pensa-se que grande parte destes (cientistas,
investigadores das várias áreas da humanidade e técnicos), desvaloriza esta componente
da pessoa, ainda que se afigure que é a vertente espiritual que nos distingue,
com a mais elevada dignidade, dos restantes seres que habitam esta pequena “aldeia global”.
Bibliografia.
DENNY, Ercílio A., (2003). Fragmentos de um Discurso sobre a Liberdade e Responsabilidade. Campinas, SP: Edicamp
Venade/Caminha
– Portugal, 2021
Com
o protesto da minha permanente GRATIDÃO
Diamantino
Lourenço Rodrigues de Bártolo
Presidente
do Núcleo Académico de Letras e Artes de Portugal
NALAP.ORG
http://nalap.org/Directoria.aspx
https://www.facebook.com/diamantino.bartolo.1
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