Pode-se afirmar com segurança, que a humanidade atravessa tempos difíceis, mesmo que se diga que tal afirmação é um lugar-comum, uma banalidade, uma disposição que é óbvia, que nem sequer carece de demonstração técnico-científica, qualquer leigo tem esta perceção e, nesta simplicidade, de facto, tudo isto é verdade, porém, assumir, objetiva e responsavelmente esta evidência, parece que já não será assim tão fácil, porque havendo responsáveis, em todas as boas e más situações, normalmente, só para as primeiras é que aparecem a dar o rosto, para colherem os elogios, como diz o povo: “receberem os louros”.
Na realidade, tudo começa e acaba na terra, na
criação que nela se gera, vive e morre, por isso, quando o Planeta em que a
Humanidade vive se deteriora, também a qualidade de vida de todos os seus
habitantes se degrada, não esquecendo que: «Cada
comunidade pode tomar da bondade da terra aquilo de que necessita para a sua
sobrevivência, mas tem também o dever de a proteger e garantir a continuidade
da sua fertilidade para as gerações futuras.» PAPA FRANCISCO, 2016:25).
A criação existente neste planeta, desde logo, a
começar na pessoa humana, a par com os demais seres que integram este espaço
comum, constitui obra de Alguém, que transcende tudo e todos, por isso não será
legítimo, nem justo, que uns se apoderem das riquezas e bens naturais, em
prejuízo dos seus semelhantes, e/ou que degradem o meio-ambiente a que todos
têm o mesmo direito, nas melhores condições.
Em bom rigor, pode-se concordar que: «A criação não é uma propriedade, que
podemos manipular a nosso bel-prazer, muito menos uma propriedade que pertence
só a alguns, a poucos; a criação é um dom, uma dádiva maravilhosa que Deus nos
concedeu para a cuidarmos e utilizarmos em benefício de todos, sempre com
grande respeito e gratidão.» (Ibid.:27).
Importa conduzir a nossa reflexão para uma outra
dimensão da criação, agora, mais especificamente, para a vida humana, porque,
em princípio, e quanto a ciência nos indica, quase tudo funciona à volta da
pessoa, sem que com esta posição se pretenda defender algum tipo de
antropocentrismo, bem pelo contrário, porque haverá um Ente Transcendente,
incluindo a própria Natureza, que o Ser humano não controla, e que poder-se-ia
designar por Deus, qualquer que Ele
seja.
Neste rumo de pensamento, e partindo-se de
princípios constitucionais, mas não só, a vida humana é inviolável, faz parte
desse Dom Divino que promove a criação, naturalmente, na maior parte dos seres
animais e vegetais, pela via da procriação, entre seres de géneros diferentes,
embora a ciência, neste domínio, já tenha vindo a produzir outras alternativas
que, indiscutivelmente, se respeitam.
O problema da inviolabilidade da vida humana é
bastante complexo, dependendo, em muitas situações, do conceito que se tem de
vida humana, ou seja, quando realmente ela começa e quando e como termina, e/ou
pode acabar e, neste caso do fim da vida, em que circunstâncias ela se
verifica: doença natural, acidente, velhice, suicídio, homicídio, morte
assistida e tantas outras possibilidades.
É claro que este tema é muito controverso, não
existem, tanto quanto se julga saber, noções claras, irrefutáveis e
cientificamente verificáveis, para se determinar, em concreto, quando começa e
termina a vida, salvo, naturalmente, a opinião avalizada e comprovada dos cientistas-especialistas,
e técnicos que trabalham nestes domínios.
Em todo o caso, se porventura, se desejar uma
perspetiva religiosa, então poder-se-á aceitar como base de trabalho que: «A via é antes de tudo um dom. Mas esta
realidade só gera esperança e futuro quando é vivificada por vínculos fecundos,
por relacionamentos familiares e sociais que abrem novas perspetivas. O grau de progresso de uma civilização
mede-se precisamente pela capacidade de salvaguardar a vida, sobretudo nas suas
fases mais frágeis, mais do que pela difusão de instrumentos tecnológicos.
Quando falamos do homem, nunca esqueçamos todos os atentados contra a
sacralidade da vida humana.» (Ibid.:30).
Nesta orientação de pensamento, não se compreende,
nem tão pouco se aceita, que muitos responsáveis políticos, religiosos,
financeiros e, eventualmente, de outros setores, como os cartéis do tráfico de
armas, drogas e seres humanos, continuem a criar e alimentar tantos conflitos
que tudo destroem: desde a própria natureza, passando pelos diversos
patrimónios e acabando nas pessoas inocentes, indefesas, que apenas desejam a
vida, o Bem-estar, a Felicidade e a Paz.
Os crimes contra a criação continuam, praticamente,
impunes, porque ao processo e forma do diálogo, do bom-senso e da tolerância,
impõe-se a violência destruidora das armas. Mas não são apenas os crimes
violentos que atentam contra a criação, na circunstância, a que respeita à
pessoa humana, que está sujeita a muitas outras formas de destruição
psicológica e, principalmente, física.
Defendendo-se, ou não; cumprindo-se, ou não, a
legislação, respeitando as posições de cada pessoa, a verdade é que, para os apologistas
da vida, qualquer que seja a sua qualidade, eles consideram que: «É atentado contra a vida o flagelo do
aborto. É atentado contra a vida deixar morrer os nossos irmãos nas embarcações
no canal da Sicília. É atentado contra a vida a morte no trabalho porque não se
respeitam as mínimas condições de segurança. É atentado contra a vida a morte
por subalimentação. São atentados contra a vida o terrorismo, a guerra e a
violência, mas também a eutanásia. Amar a vida é sempre cuidar do outro,
desejar o seu bem, cultivar e respeitar a sua dignidade transcendente.»
(Ibid.:30).
Certamente que todas as pessoas defendem posições,
que acreditam ser as mais equilibradas, justas e legais e, no que à vida
concerne, também se aceita que parte significativa da humanidade não deseja a
morte, respeitando-se, aqui, todavia, a opinião, e até, o desejo relativamente
a: viver com qualidade; ou morrer para não estar a sofrer nem fazer padecer que
se ama.
Respeitar a criação é, portanto, uma exigência que
se impõe, porque o direito à vida pertence a todos os seres, que coabitam neste
planeta. Temos de ser guerreiros defensores da criação, isso implica, e/ou
equivale a: «Ter respeito por toda a
criatura de Deus e pelo ambiente onde vivemos. É guardar as pessoas, cuidar carinhosamente
de todas elas e cada uma, especialmente das crianças, dos idosos, daqueles que
são mais frágeis. É cuidar dos outros na família: os esposos guardam-se
reciprocamente, depois, como pais, cuidam dos filhos e, com o passar do tempo,
os próprios filhos tornam-se guardiões dos pais. É viver com sinceridade as
amizades, que são um mútuo guardar-se na intimidade, no respeito e no bem.
Fundamentalmente tudo está confiado à guarda do homem, e é uma responsabilidade
que nos diz respeito a todos.» (Ibid.:21).
Poucas serão as pessoas que colocam em dúvida a
premência de se elegerem, e levarem à prática, medidas que visem promover o
respeito pela vida e pela dignidade dos seres vivos, obviamente a começar na
pessoa humana, assim como dotar a sociedade dos meios adequados à promoção da
qualidade de vida, durante todas as fases da existência de cada pessoa.
Claro que outros seres, animais, que não apenas os humanos,
têm, igualmente, direito às melhores condições de vida, e à adequada proteção.
Neste sentido, e em boa hora, o legislador português se preocupou na elaboração,
e aprovação, de legislação que visa defender a integridade física e a dignidade
compatível a muitos outros animais, que coabitam com a pessoa humana. Foi dado
um passo de gigante neste domínio, e Portugal está na vanguarda da defesa dos
direitos dos animais.
Estamos destinados a coabitar o mesmo planeta, a
conviver com respeito uns pelos outros e, com tal desiderato, todos os seres
têm os seus direitos, cabendo ao ser humano, aperceber-se, claramente, que
também tem deveres que deve cumprir primeiro, antes, ainda, de exigir a
satisfação dos direitos. Aos restantes animais pertence-lhes lutar pela
sobrevivência, sabendo-se que, numa lógica da cadeia alimentar, uns eliminam
outros, de resto, como faz o ser humano, para, também ele, sobreviver, porque
tem idênticas necessidades.
Resulta,
daqui, que a pessoa humana deverá ser o garante do equilíbrio universal, uma
espécie de polícia do ambiente, da criação, da manutenção das condições de vida
para todos os habitantes deste planeta tão maravilhoso, rico e,
simultaneamente, muitas vezes inaceitavelmente, maltratado.
Vive-se, ainda em 2022, uma situação de pandemia, iniciada
em março de 2020 e provocada por um vírus, que se convencionou designar por
COVID-19. As investigações científicas para lutar contra esta peste
desenvolvem-se em dezenas de países. Pessoas ficam infetadas às centenas de
milhões e centenas de milhares já faleceram. A que se deve esta horrorosa
situação, tudo indica que ainda não se identificou a sua origem e a cura
definitiva, muito embora, se tenham aliviado muitas das medidas restritivas.
Bibliografia.
PAPA
FRANCISCO (2016). Proteger a Criação. Reflexões sobre o Estado do Mundo. 1ª
Edição. Tradução Libreria Editrice Vaticana (texto) e Maria do Rosário de
Castro Pernas (Introdução e Cronologia), Amadora-Portugal:20/20 Nascente
Editora.
Venade/Caminha –
Portugal, 2022
Com o protesto da minha perene GRATIDÃO
Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
Presidente do Núcleo Académico de Letras e Artes de
Portugal
NALAP.ORG
Sem comentários:
Enviar um comentário