domingo, 1 de novembro de 2020

O Jogo Dialético

Toda a tentativa de compreender implica, necessariamente: a dialética pergunta/resposta; e entender significa ajustar constantemente a pergunta, isto é, pôr em jogo os pressupostos próprios, para melhor formular a pergunta; provoca este jogo dialético, entre leitor e texto, que faz parte da experiência mais originária do homem, cujo modo de ser é compreender.

Ora, ao interpretar o objeto (texto), o interpretante parte da sua experiência que se põe em jogo, por isso, os objetos históricos e os seus efeitos participam e influenciam o presente, quer dizer: a compreensão não é uma atividade subjetiva (romantismo), mas uma inserção no processo de transmissão; a experiência hermenêutica envolve, antes de mais, a participação e a pertença a uma tradição cultural; e emerge da relação entre o familiar (pré-compreensão) e o estranho (texto).

O meio permite a tensão presente/passado, a dialética pergunta/resposta, na fusão de horizontes (GADAMER). A revelação ontológica (HEIDEGGER) é, precisamente, a linguagem. Esta fornece o suporte, no qual e sobre o qual, os horizontes se podem encontrar.

A linguagem é o meio em que a tradição se esconde e é transmitida. Toda a experiência ocorre na e pela linguagem. O homem tem um mundo e vive no seu mundo, por causa da linguagem. Há, por assim dizer, um acordo, ou apalavramento originário, na constituição linguística do mundo, e é neste apalavramento linguístico (coletividade cultural), que se encontra a condição “sine qua non” para toda a comunicação e compreensão: «Uma antropologia que reconhecer que a condição humana repousa neste acordo profundo pode, então, interpretar em função dele a variedade de discursos sobre o homem, aliás, engendrados e geridos pela natureza dialógica deste acordo.» (ORTIZ-OSÉS, 1983:13).

Assim, a pertença e a participação na linguagem, como meio da experiência humana no mundo, é a verdadeira base da experiência hermenêutica. Como ouvir é um poder muito maior do que ver (GADAMER), e como a linguagem é o repositório do passado, e o meio que existe para o conhecer, é na audição da linguagem, que a experiência hermenêutica encontra a sua total realização: «A linguagem é finita e histórica, é um repositório e um condutor da experiência do ser que se tornou linguagem no passado. A linguagem tem que nos levar a compreender o texto, a tarefa hermenêutica é tomar a sério a linguisticidade da linguagem e da experiência e desenvolver uma Hermenêutica verdadeiramente histórica.» (PALMER, 1969:215).

O homem, como ser no mundo, tem, forçosamente, um comportamento perante esse mundo, conduta que implica diálogo. É este diálogo que faz, para além do ambiente, o mundo do homem. A linguagem representa o ponto de partida, comum da experiência do mundo e da prática hermenêutica.

Consequentemente, o homem encontra-se numa relação de pertença para com a sua experiência originária do mundo (ligado ao matriarcal), não é sem o que já foi, sem o que já viveu e experimentou, não é sem a experiência acumulada por si e seus antepassados.

A sua experiência hermenêutica realiza-se dentro da linguagem e dentro duma tradição, numa atitude de escuta e interpretação, a estrutura desta experiência assenta no acontecer da linguagem, inserta numa tradição cultural. A história é que primeiramente interpreta: «Esta história, sujeito da nossa própria interpretação, acaba por ser linguagem, texto a comprovar, jogo a conjugar, diálogo a realizar» (Ibid:56).

A transferência da questão hermenêutica de uma Gnoseologia a uma Ontologia da linguagem (GADAMER) não é o suficiente, no entender de ORTIZ-OSÉS, porque esta mesma fica prejudicada. ao ser entendida em “perigosa” circularidade. A linguagem não é uma mera dialética histórica, uma vez que para além da sua função “imediadora”, o objetivo e o subjetivo se “disputam”.

Como interpretação primeira da realidade e do homem, a linguagem ultrapassa uma mera razão histórica (fundista de horizontes), e torna-se numa razão hermenêutica (razão crítica), auscultadora da verdade da linguagem, como apalavramento da realidade.

Perante a tendência esteticista de GADAMER, segundo a qual tem que trazer tudo à linguagem, para proceder à sua revelação, há que opor uma tendência complementar, segundo a qual é necessário desenvolver, criticamente, a linguagem ao todo da realidade, porque: «Se o que somos é um diálogo, a verdade do diálogo não radica num falar para não estar calado – onde tudo é simultaneamente verdade e mentira -, mas falar para calar, onde algo é mais ou menos verdadeiro e falso.» (ORTIZ-OSÉS, 1983:59).

Importa trazer à linguagem os princípios determinantes da vivência cultural do homem. A filosofia grega apresenta-se como a trave mestra, como a origem matriarcal do mundo ocidental. Ora, como dependentes e participantes, encontramo-nos imersos nesta tradição, vivendo efetivamente as consequências (negativas e positivas), da experiência e do pensamento grego.

Mas mais importante que a pura contemplação do mundo, da receção da cultura tradicional e da dialética integradora desta mesma tradição, é a conversão e transformação do mundo. Por isso, ORTIZ-OSÉS propõe-se, através da mediação hermenêutica, atribuída à linguagem (proto interpretação), transformar a tensão matriarcal/patriarcal, em fatriarcado (diálogo crítico).

Através da linguagem, o mundo humano é interpretado entre o mito e o logos (CASSIRER). É nesta tensão mito/lógica, que se encontra na linguagem a dialética pertença/conquista. A Hermenêutica Filosófica aparece, assim, como uma interlinguagem crítica e mediadora (Razão Hermenêutica), entre o senso comum (mito), e o pensamento lógico (logos). A Hermenêutica mediatiza dialeticamente o polo ontológico da experiência do mundo, e o polo lógico-racional da ciência.

A metafísica clássica, está intimamente ligada e condicionada pelo sistema sociopolítico, em que se insere (matriarcalismo e patriarcalismo), e a metafísica Hermenêutica está ligada a uma estrutura fatriarcalista, isto porque a Metafísica Hermenêutica, não se pode reduzir a um corpo teorético, a uma simples e passada interpretação da realidade, mas sim a uma atividade prática de transformação da realidade humana. A nova Metafísica Hermenêutica será, então, um novel tipo de linguagem, que leva a cabo uma articulação totalizadora do universo do discurso humano.

O homem vive numa permanente dependência duma interpretação do passado, e assim se ousa designar o homem de “animal hermenêutico”, que se compreende a si mesmo, em termos de interpretação de uma herança que está constantemente presente, ativante em todas as suas ações e decisões.

Interpreta, e está sempre interpretado em relação ao mundo que constrói, e em que vive, por isso, a sua existência como interpretante imerge no pré-conceito (experiência), porque o homem esteve, está e estará sempre carregado desta experiência tradicional, que pavimenta e sustenta a sua possibilidade de compreender.

Há que entender que: os pré-conceitos são sempre o ponto de partida; e que a linguagem é o reservatório e o meio de comunicação da tradição; a linguagem e a história não estão, somente, relacionadas, mas também misturadas: «Não é o tempo quem dirá as coisas – o tempo diz apenas o que a linguagem sabe» (ORTIZ-OSÉS, 1983:26).

O homem vive numa relação de pertença com a tradição, a partir da qual elabora, segundo as normas transmitidas, um discurso que retoma e altera através da dialética: passado/presente; pergunta/resposta, e pondo em jogo os pré-conceitos do interpretante.

A compreensão, o novo sentido, a nova visão (pensar) corresponderá a um processo de integração gradativa, que se vai tornando inteligível no contexto do discurso pré-elaborado.

Mas esta linguagem implicada no ato de compreender, não deve tornar-se, apenas, num meio transmissivo, deve ser uma linguagem crítica (razão crítica), transformadora da realidade, isto é, a conjugação entre reconstrução e integração implicada (círculo hermenêutico), tem que ser pensada, criticamente, através da linguagem.

Falar da tradição cultural como condição “sine qua non”, no ato de compreender, é perguntar pelos últimos pressupostos (paradigmas e pré-paradigmas, segundo KHUN), que tornam possível o entender e a verdade como tal, circunstância fundamental para uma teoria da ciência.

Bibliografia

ORTIZ-OSÉS, Andrés, (1983). Antropologia Hermenêutica. Tradução, L. Ferreira dos Santos. Braga: Eros.

PALMER, Richard E., (1969). Hermenêutica. Tradução, Maria Luísa Ribeiro Ferreira. Lisboa: Edições 70 

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Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

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