domingo, 24 de abril de 2016

Revolução dos Cravos

Quem passou pela experiência de viver num período difícil, da História de Portugal, como foi o da ditadura do século XX, que se prolongou por quase cinquenta anos, certamente que tem uma perspetiva muito singular do regime político que então vigorou, e que decorridos mais de quarenta anos, após o vinte e cinco de Abril de mil novecentos e setenta e quatro, estará em condições de fazer uma reflexão pessoal, e realista, sobre este acontecimento extraordinário.
A ditadura política que vigorou durante quase meio século, em Portugal, constitui um período negro da nossa História, do qual não nos devemos afastar e, muito menos, branquear, porque conforme nos podemos orgulhar de um outro passado de glória, através da epopeia dos Descobrimentos, da Evangelização, da Cultura e dos valores do humanismo, levados aos quatro cantos do mundo, ainda que tal passado “glorioso” também tenha pingos de manchas censuráveis, como a prática da escravatura, a inquisição e outros flagelos, o saldo, apesar de tudo, será positivo, porque também é verdade que muito foi investido nos povos autóctones, que ao longo dos séculos fomos contactando, bem como nos seus territórios.
A História, não sendo uma ciência exata, ela tem um objeto de estudo, que são os factos do passado, como, igualmente, utiliza uma metodologia específica, com recurso à investigação, análise documental, testemunhos e todo um conjunto de bens materiais e imateriais, que fundamenta as suas conclusões. Ela, a História, é, também, uma ciência dinâmica, sempre em busca da verdade.
A narrativa do período ditatorial, em Portugal, ainda não está encerrada, e dificilmente algum dia se chegará a uma epílogo definitivo, porque cada instituição, cada governante, cada individualidade terá a sua versão dos factos, o conhecimento direto, ou não, a circunstância em que os viveu, mas haverá alguma unanimidade quanto às atrocidades que se terão cometido, com o recurso a meios de investigação, repressão e punição, contra aqueles que ousavam manifestar-se contrários ao regime imposto pelos ditadores.
Qualquer que seja o Poder: político, militar, religioso, empresarial, desportivo, cultural ou outro, ele, o Poder, nunca será bem recebido e acatado, quando exercido com violência, despotismo, no desrespeito pelos mais elementares direitos e valores humanos, atentando contra a dignidade, a liberdade, a compreensão, a tolerância e a benevolência, em relação aos governados.
O período ditatorial, em Portugal, conduziu o país a guerras fratricidas com os povos africanos, já que no Brasil foi tudo bem diferente e, a independência desta ex-colónia, foi relativamente pacifica. Os governantes portugueses desse período negro da História de Portugal, obcecados pelo domínio colonial, não quiseram aprender com os bons exemplos dados por outros países colonizadores que, rapidamente, compreenderam a justeza das reivindicações dos povos colonizados, materializadas no seu direito à independência.
A perseguição, repressão e punição dos cidadãos portugueses, que se assumiam contra o regime ditatorial, era permanente, a polícia política, coadjuvada por um “batalhão” de colaboradores (então denominados, na gíria popular, por bufos), não tinha “mãos a medir”, os julgamentos sumários, as prisões arbitrárias e desterros eram o “pão-nosso” de cada diaQuantas pessoas foram, severa e cruelmente, torturadas por se oporem ao regime? Quantos jovens e adultos se viram obrigados a abandonar o seu próprio país para se livrarem de uma guerra, que nada lhes dizia e também para fugirem às perseguições policiais, respetivamente? Quantos milhares de jovens morreram ou ficaram deficientes para o resto da vida? Quantas mães ainda hoje choram a perda de seus filhos? Quantas viúvas continuam a derramar lágrimas pelos seus maridos? Quantos órfãos não chegaram a conhecer os seus pais?
Felizmente, como em tudo na vida, sempre há um princípio, um meio e um fim e, paulatinamente, os ditadores vão caindo dos pedestais em que se colocaram, ilegítima e ilegalmente, porque a paciência, a dor, o sofrimento e a humilhação têm limites que não podem ser ultrapassados. Os portugueses atingiram esse limite e, só lhes restava derrubar um regime que não cumpria com a maior parte dos mais sagrados Direitos Humanos.
A ditadura portuguesa também viria a ter o seu fim com a “Revolução dos Cravos”, em vinte e cinco de Abril de mil novecentos e setenta e quatro, na qual as Forças Armadas e o Povo saíram à rua para abater um regime desumano, quer para os cidadãos portugueses, quer para os povos colonizados, muito embora nos territórios ocupados se tenha verificado um grande desenvolvimento, porém, sem os valores da democracia: liberdade em todas as suas vertentes; solidariedade, igualdade, fraternidade, entre outros.
É claro que a “Revolução dos Cravos” não foi apenas de “flores”, também houve alguns “espinhos”, principalmente para os cerca de meio milhão de portugueses que tiveram de abandonar, à pressa, as então colónias: a maior parte dos quais, perdendo tudo o que tinham conseguido, ao longo de uma vida de trabalho, de sacrifícios, de riscos; outros, inclusivamente, incentivados pelo governo ditatorial, venderam os seus bens em Portugal continental, para investirem nos territórios ultramarinos.
A descolonização que se seguiu à “Revolução dos Cravos”, com a justa independência dos territórios ocupados, não acautelou a integridade física, os bens materiais imóveis e financeiros dos empresários e colonos portugueses, pese, embora, o esforço realizado com as “pontes aéreas” para transportar, em segurança, para a então denominada “metrópole”, os milhares de portugueses que, em certos círculos, foram apelidados, pejorativamente, de “Retornados”, adjetivação que nunca foi utilizada, por exemplo, em relação aos restantes portugueses emigrados, quando regressavam definitivamente a Portugal.
Centenas de jovens, muitos colonos e autóctones, que desejavam continuar a ser portugueses, morreram vítimas de uma guerra sem sentido, cujos corpos foram enterrados em “cemitérios” improvisados, no meio do mato e abandonado às ervas daninhas e animais selvagens, sem o mínimo de respeito pela dignidade da pessoa humana, independentemente da sua etnia, convicção política, religiosa e cultural.
É claro que o espírito e capacidade de adaptação dos portugueses acabaram por resolver este drama da descolonização. O Estado-Governo que se seguiu à “Revolução dos Cravos”, enquadrou e integrou nos seus quadros, milhares de funcionários, assim como as grandes empresas e bancos, entre outras. Resta, passados mais de quarenta anos, indemnizar os portugueses que perderam os seus bens: imobiliários, financeiros, empresariais e empregos.
Apesar de todas as dificuldades, Portugal pode orgulhar-se da sua “Revolução dos Cravos”, da implementação de um regime democrático com amplos direitos, liberdades e garantias, que fez inveja a muitos outros países. Não há dúvida que somos um “povo de brandos costumes”, pacífico, hospitaleiro e humanista.
A “Revolução dos Cravos” proporcionou aos portugueses uma vida nova, com esperança num futuro de desenvolvimento, emprego e justiça social, porque Democracia é isto mesmo: igualdade de oportunidades, redistribuição justa da riqueza nacional, cuidar de todos os cidadãos de igual modo, sem discriminações negativas, nem marginalização dos mais fracos.
A “Revolução dos Cravos”, ainda não terminou todos os projetos então prometidos, mas possibilitou retirar o país do isolamento internacional em que já se encontrava. Abriu as portas para a integração na União Europeia, com todos os deveres e direitos que tal implica, reconhecendo-se, hoje, segunda década do século XXI, que valeu a pena correr os riscos que uma revolução provoca para aqueles que nela se envolvem.
Naturalmente que é justo e sempre pertinente que se faça um rasgado elogio às Forças Armadas Portuguesas e ao Povo, porque sem a conjugação das sinergias, talvez a “Revolução dos Cravos” se tornasse num banho de sangue. O sentido patriótico, e de Estado, dos nossos militares, foi, é e, seguramente, continuará a ser uma garantia de estabilidade democrática para Portugal.

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
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Jornal: “O Caminhense”
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domingo, 17 de abril de 2016

Amigo Especial: Onde Estás?

Defende-se, com muita frequência, que por via do avanço da ciência e da tecnologia, o mundo está cada vez mais pequeno. Não há, numa perspectiva espacial, distâncias intransponíveis, essencialmente quando se aborda a questão das viagens. Hoje, as distâncias são medidas em unidades de tempo, para cada trajeto a percorrer, utilizando um qualquer meio de transporte. Vive-se na era da globalização, que é irreversível e à qual nos temos de adaptar.
O conhecimento, a cultura, a ciência, a técnica, a circulação de mercadorias, pessoas e bens, praticamente, não tem limites. As relações humanas acompanham esta evolução, sendo possível comunicar-se, com uma pessoa, a milhares de léguas de distância, em direto, ao vivo e em simultâneo; assistir a um determinado acontecimento, participar, interagir, um pouco como se estivéssemos na presença com quem se conversa, do facto a decorrer, do acontecimento cultural, desportivo, científico, tecnológico, bélico, sideral. Quase tudo é possível neste mundo global.
Pode-se, portanto, admitir, sem grande constrangimento, que o mundo é tão pequeno que facilmente as pessoas se cruzam, em condições que se aproximam da realidade, quando se utilizam as tecnologias da informação e da comunicação - mundo fantástico -; como também, em poucas horas, elas se encontram, presencialmente, numa parte qualquer do planeta – mundo real -. Há duas dimensões que, cada vez mais, se complementam e completam: dimensão virtual; dimensão real.
Assim se pode chegar a uma grande verdade, infelizmente, para muitas pessoas, ignorada: o mundo é cada vez mais pequeno, tem imensas “esquinas”, as quais, as pessoas vão dobrando, ao longo das suas vidas. Nestas “esquinas” encontram-se, quase que se tocam, fisicamente, amigos, conhecidos, colegas, adversários e inimigos, sendo que a alegria ou a tristeza, podem provocar extroversão ou introversão, respetivamente.
É sempre interessante refletir, sobre aspetos concretos da situação da vida real das pessoas. Meditar, profundamente, com rigor e honestidade intelectual, é um exercício muito exigente, que pode colocar, em circunstâncias desagradáveis, perante a consciência de quem se predispõe a este ato de recolhimento, de auto-avaliação muito crítica, eventualmente, muito negativa, quando se analisam princípios, valores, sentimentos, emoções, comportamentos ações e reações, deles decorrentes e realmente efetuados. O Tribunal da nossa Consciência é infalível.
Atualmente: corre-se à procura de bens materiais – que sem dúvida são necessários à vida, com alguma qualidade -; luta-se pelo poder, qualquer que este seja, em detrimento do ser, do ser pessoa digna, de respeito, de princípios, de valores e de sentimentos – igualmente se concorda com a existência e fruição do poder (não o poder-pelo-poder) porque ele é essencial à satisfação de necessidades básicas de toda a pessoa (veja-se a pirâmide de Maslow) -; vive-se na preocupação de se ganhar, pelo menos, uma etapa da vida, qualquer que seja a natureza da corrida, porque é importante, para alegadas supostas “super-auto-estimas” demonstrar que se é melhor, mais forte, mais influente, mais dominador, ainda que, quantas vezes, à custa da humilhação, da rejeição, da mágoa, dor, sofrimento e desgosto dos mais fracos e inocentes.
Mas de facto, o mundo é muito pequeno, está pontuado das tais “esquinas” e, muitas pessoas, assoberbadas com o ritmo louco da vida que pretendem levar, ignoram que, mais tarde ou mais cedo, vão “tropeçar” numa dessas “esquinas”, encontrar-se, precisamente, com outras pessoas a quem, eventualmente, já tenham beneficiado ou prejudicado, de quem já se tenham considerado amigas e, entretanto, esquecendo, ou, quem sabe, “matando” tal amizade, se tornam indiferentes, desconfiadas, adversárias e, pior do que isso, inimigas. Numa destas “esquinas” pode acontecer o arrependimento, a resolução do que ficou mal resolvido na vida passada.
É nesta perspectiva racional-axiológica e sentimental-emocional que se devem dobrar as “esquinas” do mundo e, já agora, também as da vida. É, igualmente, nesta linha, que a imprescindibilidade do exercício assertivo, de uma amizade sincera, incondicional, conquistada e consolidada, ao longo da vida, (ou mesmo durante um pequeno período de convivência mais intensa e íntima), se pode revelar como a grande solução de situações que, por uma qualquer incapacidade, circunstância ou infelicidade, ficou mal resolvida no passado, mais ou menos remoto e que, quanto mais tarde demorar a solução, maiores são as mágoas, os sofrimentos e os desgostos.
Afirmar-se que a par da saúde, da família, do trabalho, da qualidade de vida, da felicidade (qualquer que seja o conceito que cada pessoa dela tiver), da Graça Divina, ter um amigo, pelo menos um, que nos ame com um genuíno e ilimitado “Amor-de-Amigo”, certamente, isso representa um valor, também um sentimento. É sabido que a amizade implica muitas exigências, valores, caráter, dádiva, renúncia à desconfiança, ao egoísmo, à humilhação, à indiferença, à desconsideração, à vingança e ao ódio.
Ter um amigo é uma responsabilidade imensa porque, não sendo exigência ou caraterística da amizade, na verdade, o comportamento recíproco, tácita e voluntariamente, como que se impõe, sob pena de um dos amigos não retribuir a afeição recebida, pela simples razão de que nem sequer sabe como reage o amigo, quando recebe uma determinada gentileza. Gestos simples que valem tudo na vida.
É claro que quando se conquista e consolida um amigo, não se está à espera de qualquer atitude de retribuição, até porque esta decisão cabe, por inteiro, à pessoa que recebe por amigo, quem a considera, estima e ama, com o singular e exclusivo “Amor-de-Amigo”, ou seja: a Amizade só é verdadeiramente um sentimento único, quando funciona nos dois sentidos, entre duas pessoas que, sem quaisquer dúvidas, se querem bem, se gostam, se respeitam e estimam. Os amigos incondicionais estão sempre solidários.
Mas então que qualidades, princípios, valores, sentimentos e atitudes deverá ter uma pessoa para que se possa considerar amiga de outra? Será possível selecionar os amigos? Por vezes escolhemos determinadas pessoas para nossas amigas e começamos por dar o exemplo, tornando-nos amigos delas.
Nesse sentido, e com tal objetivo, fazemos a nossa aproximação e, poderá, então, nascer uma certa empatia, um desejo de estarmos mais presentes. Começamos a abrir o nosso espírito, fazermos daquela pessoa nossa confidente, nossa conselheira, nossa protetora. Esta pessoa entra de facto na nossa vida.
O perfil do amigo, que se busca nesta reflexão, passa, inevitavelmente, por princípios, valores, sentimentos, conduta ético-moral, respeito, solidariedade, amizade, lealdade, cumplicidade, sigilo total, consideração e estima, defesa intransigente do amigo, sempre que este for vítima de injustiças, quaisquer que estas sejam, sempre que afetem a honra, reputação e dignidade do nosso amigo. É o amigo que “dá a cara pelo amigo”.
O amigo em quem se pode confiar plenamente é aquele que: nunca nos abandona; que mesmo sem ser solicitado, está permanentemente presente; que se apercebe das nossas dificuldades e nos ajuda a superá-las, sem lhe pedirmos; que se preocupa com o nosso bem-estar e o da nossa família; que nos incentiva, orienta e rejubila para e com o nosso sucesso, respetivamente.
O amigo de verdade, do coração, especial, é aquele que nos ama, pura e incondicionalmente, com o tal ilimitado “Amor-de-Amigo”; é aquele que, quantas vezes, humilhado, desconsiderado, ridicularizado, eventualmente, odiado, por aquele de quem é amigo, continua ao seu lado, desejando-lhe sempre, para ele e família, todo o bem do mundo, felicidade, saúde, trabalho, sucesso, e proteção Divina. Este é o amigo único, exclusivo, do peito, especial, que continuará a afirmar que nunca será inimigo de quem o desprezou. Este é, sem qualquer dúvida, o amigo incondicional.
O amigo verdadeiro, integral, solidário, leal, generoso, tolerante, carinhoso, meigo enfim, muito especial, é aquele que: se preocupa com a saúde do seu amigo que, se necessário, o vai visitar a casa ou ao hospital; que incute ânimo e coragem, lhe transmite mensagens de esperança, de confiança, votos reiterados e sinceros de melhoras definitivas; aquele que, mesmo sendo ignorado, continua do lado de quem o magoa.
Com efeito: «A relação de Amizade é uma grande manifestação do Amor humano. O Amor de Amigos é Amigável, puro e sem hipocrisia. A pessoa escolhe livremente gostar dessa pessoa, amar essa pessoa, a que chama AMIGO. A pessoa não está ligada à outra pelo instinto! É uma simpatia pela pessoa. Amizade pode existir entre homem e mulher, entre homem e homem, entre mulher e mulher. Neste Amor de Amizade não há! Não existe atracção sexual. A verdadeira Amizade ou seja Amor de Amigos, trás muita alegria, a pessoa Ama e dá sem esperar nada em troca. Não Ama o Amigo pelo que ele fez ou faz! Ama independentemente da ajuda, de qualquer coisa que a pessoa Amiga faça.
Nós Amamos os nossos Amigos queremos estar perto deles. Desejamos o melhor para eles. Desculpamos os erros. Temos bons pensamentos, boas palavras, bons sentimentos, bons desejos para os nossos Amigos. Desejamos tudo de bom para os nossos Amigos. Somos sinceros! Puros! Amáveis! Honestos! Leais! Verdadeiros! com os nossos Amigos. Esta é a verdadeira relação de Amizade. Gostamos dos nossos Amigos.” (ROBERTSON, 2007).
Pode deduzir-se que tal amor deve ser cultivado como um sentimento profundo, muito especial, sem reservas, obviamente traduzido nos atos compatíveis com ele. Os verdadeiros amigos, que se sentem inundados por este “Amor-de-Amigo”, devem respeitar-se dentro dos limites que, reciprocamente, se impõem, sem prejuízo das atitudes e dos gestos carinhosos, reveladores de pessoas com bons sentimentos e sem quaisquer outras intenções inconfessáveis.
A amizade traduzida e levada às respectivas manifestações do “Amor-de-Amigo” implica, inclusivamente, passar por uma necessidade de maior proximidade, acompanhamento, atenção, carinho, estima e consideração especiais em relação aos amigos ditos de ocasião. Se em cada duas pessoas houvesse este verdadeiro “Amor-de-Amigo”, o mundo estaria bem melhor e a felicidade seria possível.
Considere-se, igualmente, uma outra interpretação, segundo a qual:  «Um amigo verdadeiro é aquele que nos apoia, que é leal connosco, que nos respeita, que investe no nosso desenvolvimento, nos ajuda a expandir os nossos horizontes, que nos incentiva, alguém com o qual temos afinidades idênticas ou diferentes mas que nos completa, com quem partilhamos os nossos sonhos, aquele que nos elogia ou nos diz as verdades no momento certo, aquele que nos empresta um ombro para chorar, mas também aquele que nos faz rir, aquele com quem gostamos de conversar sem receio, ter um diálogo sincero e verdadeiro, aconselhar-nos, alguém que não nos cobra nada, que nunca desconfia de nós, alguém de quem temos saudades quando não está por  perto, em suma que faz de nós uma pessoa melhor e feliz. Por vezes, nem sempre dizemos aos nossos amigos o quanto eles são importantes para nós… por isso quebrem esse silêncio e digam-lhes!» FERNANDES in http://oquemevainacabecaagora.blogspot.com/ acessível em 10.09.2010).
O amigo que todos precisam de ter, ainda que seja apenas um, é aquele que: gentilmente, e com sinceridade, aprecia os nossos pequenos gestos, palavras simples, dádivas humildes; compreende as nossas fraquezas, os nossos erros, os nossos momentos menos felizes e nos aconselha, protege e reforça, ainda mais, se possível, a sua amizade. Costuma-se dizer que os verdadeiros amigos se revelam na doença, na prisão e nas dificuldades da vida, em relação ao amigo. Este será o amigo incondicional, especial, aquele que guardamos no nosso coração, para sempre.
Indubitavelmente que ter um amigo verdadeiro, muito especial, é um grande privilégio, uma dádiva Divina, porque é extremamente difícil ter-se um amigo com tantas qualidades, virtudes, valores e sentimentos, também muitas exigências, mas não é impossível, basta que sejamos sinceramente honestos e saibamos amar o amigo, retribuir-lhe tudo o que ele nos dá, ou até muito mais! É possível encontrar um amigo com estas dimensões? Acredito que sim, embora reconheça que cada vez é muito mais difícil. Vive-se uma crise de valores, de caráter e de honra.
Ao longo da vida convivemos com milhares de pessoas: da família, passando pelas instituições, as mais diversas; aos locais da escola, do trabalho, da formação, do lazer, das atividades cívico-políticas e religiosas. Nas várias intervenções e papéis que vamos realizando, umas vezes ganhamos, outras perdemos. Ganhar um amigo, custa muito; mas perdê-lo, é num ápice.
É frequente sermos prepotentes, arrogantes e dominadores, quando ganhamos; e sermos invejosos, mesquinhos, repressivos e vingativos, quando perdemos. Esquecemo-nos, então, das tais “esquinas do mundo e da vida” e que a inversão de situações, tanto nos pode ser favorável, como prejudicial. Quase tudo é efêmero, mas uma amizade sincera, uma entrega leal, um comportamento solidário, podem durar para lá da morte física, mas para isso é necessário sermos firmes, ética e intelectualmente honestos.
Quando estamos na “mó de baixo” aceitamos o amigo, tudo o que ele, eventualmente, faz por nós, todavia, se passamos para a “mó de cima”, tendemos a esquecer quem esteve, incondicionalmente, ao nosso lado, quando ninguém mais quis saber de nós. Nesta posição, de aparente superioridade, até há quem humilhe, rejeite, desconsidere ridicularize o amigo que agora está por baixo, eventualmente, devido a insuficiência económica, perda de influência, doença, idade. Isto dói muito.
Esquecemo-nos que, algumas vezes, quando tínhamos uma vida com algumas dificuldades, foram aqueles que, incondicionalmente, estiveram ao nosso lado, com solidariedade, amizade, lealdade, completamente disponíveis para nos ajudar a vencer os momentos menos bons da vida. Foram aqueles que se preocuparam connosco, com a nossa família, com o nosso êxito. Nunca nos abandonaram, nem tiveram vergonha de nós, por muitas falhas na vida que pudéssemos ter.
Ignoramos que, aqueles nossos amigos verdadeiros, nos abriram os seus corações, as suas vidas, que sempre quiserem partilhar connosco: os seus sucessos, projetos, singulares banalidades, convívios, um simples cafezinho, uma palavra amiga, um olhar terno e carinhoso, uma companhia, social e profissionalmente, amigável.
Agora, cansamo-nos destes amigos. Não queremos saber deles porque já não nos servem, os nossos projetos são muito importantes para os partilharmos com amigos tão fracos, ingénuos, demasiado humildes, sem influências nem poder. Provavelmente, hoje, estaremos noutras dimensões, que consideramos superiores. Teremos, até, vergonha daqueles amigos, tão simples, eventualmente, tão cândidos.
Por vezes pensamos que determinada pessoa é nossa sincera amiga e então, nela confiamos tudo da nossa vida, solidarizamo-nos com ela, sempre que houver injustiças; somos leais, educados, atenciosos, generosos e, se for necessário, até nos incompatibilizamos com outras pessoas que foram injustas e/ou incorretas com o nosso amigo. Tudo se faz por uma amizade incondicional.
Acontece que se a pessoa que consideramos ser nossa amiga, pela qual tudo demos e fizemos, ela não tem igual procedimento, quando somos nós os alvos de injustiças e, pelo contrário, até se relaciona com outras pessoas que, em dado momento, nos ofenderam, magoaram ou foram incorretas connosco, será aquela pessoa, verdadeiramente nossa amiga, quando se junta aos que nos ofenderam e magoaram?
Onde estão a solidariedade, a amizade, a lealdade, a reciprocidade? Será correto que um amigo pactue com pessoas que humilharam o meu amigo? Cabe aqui a sabedoria popular: “Quem não se sente não é filho de boa gente”, ou então: “Quem é amigo do meu adversário, não pode ser meu amigo”, ou ainda: “quem é amigo de quem não é meu amigo, não será amigo meu”. Para as consciências bem-formadas, não se pode “Amar a Deus e ao Diabo” ao mesmo tempo. Se se estiver dos dois lados, então tudo não passa de falsidade, hipocrisia, traição. Nestas circunstâncias, não poderá existir amizade verdadeira, pura, solidária. Não existe amigo incondicional.
Em boa consciência e honestidade intelectual, quando os valores e sentimentos em que acreditamos e os oferecemos, generosamente, à pessoa que consideramos nossa amiga, que pela amizade desta pessoa, lhe abrimos o nosso coração, confiamos os nossos desejos, projetos, dificuldades, às vezes, as mais íntimas, e dela, mais tarde, recebemos a indiferença, a rejeição, a desconsideração, a falta de estima, de carinho e de amizade, tal comportamento provoca profunda mágoa, tristeza, dor, sofrimento e desgosto. Pode conduzir, a emoções fortíssimas, a uma ansiedade tão acentuada e, finalmente, eclodir em situações irreversíveis.
Nestas conjunturas, o amigo que se doou a quem pensava que também era seu amigo, sente-se traído nos seus valores e sentimentos não retribuídos e, pior do que isso, a dor da humilhação, da rejeição, da ridicularização a que fica submetido, pode conduzir à doença: primeiro, do foro psicológico, apatia, depressão; depois, fisicamente, caminhando, inexoravelmente, para a degradação, para a morte inglória, por uma amizade que deixou de ser correspondida e acabou por ser atraiçoada.
Sem dúvida que o mundo é demasiado pequeno: 1) tem imensas “esquinas” e, em muitos momentos da vida, ao dobrarmos uma dessas esquinas, encontramo-nos com pessoas que foram nossas amigas, que nos apoiaram, mas que depois nós abandonamos, desprezamos e humilhamos; 2) Deus é imenso, - e para quem não é crente – Ele, fica representado pelo Tribunal da Consciência, ao qual não temos escapatória possível, que sancionará todos os nossos atos; 3) a vida ensina-nos muito do que precisamos para sobreviver num mundo de falsidades: desde hipocrisias, deslealdades, faltas de solidariedade, desconsideração, mágoas, desgostos, tudo nos vai caindo em cima e assim vamos aprendendo; 4) o passado fica inscrito para sempre na nossa consciência e tudo o que tivermos feito, de bom e de mal, nos será premiado ou censurado, até que a morte nos leve; 5) finalmente, vai surgir a maturidade, o bom senso, alguma sabedoria, a tranquilidade. Aqui haverá uma réstia de esperança na reconciliação e, quem sabe, a retoma de uma amizade que estaria “enferma”; 
Poderá, então, surgir a humildade, a gratidão, a paz de espírito, porém, quantas vezes, estes nobres sentimentos chegam tarde, muito tarde. Restará, então, desejar ao amigo que nos abandonou que siga o seu rumo, que vá com Deus. Numa frase bem sentida, diremos então: “Vai, vai com Deus, Querido Amigo. Vai, vai com Deus, meu Amor-de-Amigo. Deus te proteja.”
Este amigo, que nos abandonou, que nos trocou, que traiu as nossas esperanças numa amizade duradoura, quantas vezes com argumentos injustos, com a frieza de uma racionalidade cirurgicamente orientada para outras pessoas, outros interesses, outras situações, um dia sofrerá, também ele, a hipocrisia de algumas dessas mesmas pessoas com as quais nos traiu. Então saberá valorizar a grandeza dos nossos valores, sentimentos e dedicação que tivemos para com ele. Surgirá aqui a Reconciliação?
Amigo do coração, especial, responsável por promessas de “Amor-de-Amigo”, para sempre, juras de solidariedade, de amizade, de lealdade, do: “estar do seu lado” e nunca do lado do “Amo e do Servo”, ou “em cima do muro”, onde estás amigo exclusivo, verdadeiro, incondicional? Mas esse amigo existe e todos nós poderemos ter a oportunidade de ganhar um amigo assim, o que é um privilégio, diria mesmo, uma Dádiva Divina e que, por isso mesmo, tudo, mesmo tudo, deveremos fazer para nunca o perder.
Como é maravilhoso, então, podermos ouvir de uma pessoa que consideramos nossa verdadeira amiga, frases como: «Querido Amigo, a minha amizade por si continua a mesma, não estou do lado de Deus e do Diabo ao mesmo tempo, estou sempre do mesmo lado (Deus), em particular do seu, poderá sempre contar comigo, seja a nível pessoal, familiar ou profissional em projetos futuros. Também lhe lanço um desafio, aguardo que no próximo ano lance um Manual de Ciências Sociais (por um especialista em CS)! Aguardo este manual e outros livros que venha a comunicar! Obrigado pela sua amizade pura, sincera e incondicional. Muitos beijos para um amigo especial!».
É de um amigo puro que precisamos. Um amigo, com as dimensões já identificadas, é suficiente para sermos felizes no campo da amizade. Quem conseguir conquistar e consolidar um amigo destes, não morrerá sozinho no hospital, nem na cadeia, nem no infortúnio e terá as dificuldades da vida muito amenizadas.
Eu quero um amigo destes! Onde encontrá-lo? Onde estás amigo especial? Eu sei onde está: tal amigo reside em quem me quer bem, em quem me é solidário, naquela pessoa que me tem amizade, que me é leal, que confia em mim e que, inequivocamente, está incondicionalmente do meu lado, tanto: na alegria, na felicidade, na prosperidade; como na tristeza, na adversidade e nas contrariedades da vida. Esse amigo existe, certamente, e eu acredito nele.

Bibliografia:

FERNANDES, Cecília Manuela Gil Fernandes (2010). Profissão versus Amizade. (Disponível em http://oquemevainacabecaagora.blogspot.com/ acessível em 10.09.2010).
ROBERTSON, Maria, (2007). Amor de Amigos. (http://blogamor.blogs.sapo.pt/30407.html, consultado em 05.11.2011).
 
Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
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domingo, 10 de abril de 2016

O Direito Subjetivo de Mediação Social


Antes, porém, de se entrar no sistema dos Direitos, conviria referir que Habermas entende que «O conceito de razão prática como capacidade subjectiva é uma cunhagem moderna», aliás, desde Aristóteles que a filosofia do sujeito apresentava diversas vantagens, entre as quais aquela pela qual a «razão prática ficava referida à felicidade, individualmente entendida, e à autonomia, moralmente levantada do sujeito individualizado, a liberdade do homem como um sujeito privado que também pode assumir os papeis de membro da sociedade civil, de cidadão de um determinado estado e cidadão do mundo.» (HABERMAS, 1998a:63).
Se é certo que uma teoria crítica da sociedade, não pode circunscrever-se à descrição da relação entre a norma e a realidade, também é verdade que é necessário ter em conta que os direitos que os cidadãos reconhecem mutuamente entre si, devem regular-se, legitimamente, na sua convivência com o direito positivo, o que revela que o sistema de direitos em conjunto (direito subjetivo e direito positivo) está angustiado pela tensão interna entre a facticidade e a validade que carateriza o ambivalente modo de validade que é a validade jurídica.
Os direitos subjetivos estabelecem as balizas entre as quais o sujeito está legitimado para afirmar livremente a sua vontade, definem iguais liberdades de ação, para todos os indivíduos, enquanto portadores de direitos, ou na qualidade de pessoas jurídicas, de resto, se se refletir no Artº 4º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, onde se proclama o princípio/direito, compreende-se muito bem que: «A liberdade consiste em poder fazer tudo o que não cause prejuízo a outro.» Assim: «(…) o exercício dos direitos naturais de um homem não tem outros limites se não os que assegurem aos demais membros da sociedade o desfrute dos mesmos direitos. Esses limites só podem estabelecer-se por lei.» A partir deste princípio, Kant comunica através da sua formulação do princípio geral do direito, segundo a qual é legítima toda a ação que seja compatível ou conforme com a máxima segundo a qual a liberdade e o arbítrio de cada um serão igualmente de todos, segundo e em conformidade com uma lei geral, ou seja: «toda a pessoa há-de ter um igual direito às liberdades básicas, as mais extensas possíveis, compatíveis com idênticas liberdades para os demais.» (HABERMAS, 1998a:147).
Habermas, esclarece que: «O Direito não pode limitar-se a cumprir os requisitos funcionais de uma sociedade complexa, tem, também, que satisfazer as precárias condições de uma integração social que, em última instância se efectua através das operações de entendimento intersubjectivo de sujeitos que actuam comunicativamente, ou seja, através de aceitação de pretensões de validade.» (Ibid.:148).
Significa que o direito positivo terá sempre de se compatibilizar, de cooperar e, se complementar, reforçando o direito natural ou subjetivo, porque é aqui que, de momento, reside a sede do cumprimento, ou não, dos Direitos Humanos, que, como se sabe têm, ainda, a força coerciva para se imporem definitivamente, deixando-se então à vontade de os cidadãos se entenderem, ou não, quanto às regras fundadoras do direito subjetivo ou natural, em função dos direitos consuetudinários de cada sociedade, que, obviamente, não serão, necessariamente, iguais em todo o mundo, mas que são imprescindíveis para uma boa convivência, no sentido do bem-comum, o que, em última análise, nos é dito por Habermas, citando Puchta, em que sentido o direito, essencialmente o direito subjetivo, é conceptualizado: «(…) o direito é o reconhecimento da liberdade que compete por igual aos homens como sujeitos do poder da sua vontade.» (Ibid.:150).
Mais à frente, Habermas cita H. Coing, para mostrar a importância e influência do direito subjetivo, para o cumprimento implícito dos Direitos Humanos, conforme se pode deduzir da citação que utiliza: «A ideia do direito subjectivo mantém viva a concepção de que o direito privado e a protecção do direito fundado nele, serve, em última instância, a manutenção da liberdade do indivíduo, na sociedade; mantém viva a concepção de que a liberdade individual é uma das ideias fundamentais, por via das quais existe o direito privado. Pois com a ideia de direito subjectivo não se quer dizer senão que o direito privado é o direito dos membros de uma sociedade jurídica, independentes uns dos outros, que actuam conforme as suas próprias decisões.» (Ibid.:152).
É importante a conceção que Habermas transmite dos direitos subjetivos, porquanto eles existem desde sempre e, por outro lado, pela importância vital que exercem na estruturação jurídica das sociedades modernas e, consequentemente, na harmonia entre os homens, coletivamente considerados, conforme resulta do seguinte passo: «Os direitos subjectivos não estão referidos já pelo seu próprio conceito a indivíduos singulares e estranhos que autopossessivamente se atropelam uns aos outros. Como elementos de ordem jurídica pressupõem melhor a colaboração entre sujeitos que se reconhecem como sujeitos de direitos livres e iguais nos seus direitos e deveres, os quais estão reciprocamente, referidos uns a outros.» (Ibid.:54).

Bibliografia

HABERMAS, Jürgen, (1998a). Facticdad y Validez. Madrid: Editorial Trotta SA.

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
Telefone: 00351 936 400 689

Imprensa Escrita Local:
 
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domingo, 3 de abril de 2016

O Privilégio de Servir a Armada Portuguesa


A segunda metade do século XX, logo no início dos anos sessenta, começou para Portugal, no campo militar, com graves conflitos, nos territórios ultramarinos, ocupados desde há vários séculos, pelos exploradores e colonizadores portugueses, seguramente, com o incentivo e apoio sistemático do governo de então.
Naturalmente que a História sobre a colonização portuguesa, bem como todas as consequências que ela provocou, ainda não está escrita, em toda a sua amplitude e verdade, nem esta reflexão pretende dar qualquer versão sobre um período que, hoje, pensa-se, não dignificou Portugal, nem honra os valores da democracia e da liberdade dos povos, poderem escolher os seus destinos.
Para os jovens portugueses, a década de sessenta e até quase metade da de setenta, do século passado, foi um período de imensa preocupação, na medida em que, praticamente, só haveria duas alternativas: ou se emigrava, então e em força para França, Luxemburgo e Alemanha; ou se permanecia no país e se ficava sujeito à imposição do serviço militar obrigatório e, praticamente, com “Guia de Marcha” para ir combater numa das então colónias, sob jurisdição de Portugal, ninguém garantindo que se “livrava” de uma guerra, imposta pelo Governo de então, aos autóctones daqueles territórios.
As opções que cada jovem então tomou, não podem ser objeto de crítica negativa, mesmo perante aquelas pessoas que, atualmente, acusam que quem emigrou traiu a pátria, que foi para fugir à guerra; ou então, na perspetiva de quem acusa os jovens que optaram por cumprir o serviço militar e, invariavelmente, serem mobilizados para o então ultramar, designando-os de estarem ao serviço de um governo “fascista” e, defenderem um regime ditatorial.
Ambas as críticas serão, porventura, injustas, ilegítimas, no mínimo, e para usar um eufemismo, “inadequadas” porque cada jovem, tinha presente na sua consciência, os seus valores, a “liberdade”, relativa, de decidir qual o destino que gostaria de dar à sua vida: sujeitar-se a ser convocado para uma guerra; ou emigrar para construir um futuro de trabalho, de família, e de envio de riqueza para o seu próprio país e terem, posteriormente, uma velhice mais tranquila.
É, portanto, neste contexto que um jovem, relativamente desconhecido, praticamente imberbe, ainda no início da sua juventude, porém, com uma noção muito forte, do que deveria fazer, para cumprir os valores que, já então, defendia, enquanto cidadão responsável, respeitador, o melhor possível, dos usos, costumes, tradições e Leis do seu país, se confrontava com uma situação da sua própria consciência cívica.
Este jovem minhoto, natural de uma aldeia do concelho de Caminha, oriundo de família pobre, honesta e humilde, antes de tomar a decisão final, aconselhou-se com pessoas que já estavam a cumprir o serviço militar, nomeadamente, um primo seu que conhecia o teatro de guerra no então ultramar, que na época se vivia, concretamente, na Guiné. Obviamente que conversou com seus pais, de quem careceria da respetiva autorização, dado que aquele jovem ainda era de menor idade, o que, apesar desta circunstância, não o impediu de desenvolver todos os esforços, para concretizar os seus objetivos.
Finalmente, o mancebo teve uma conversa, sobre o destino que deveria dar à sua vida, com seu avô paterno, à época bastante doente, acamado, mas lúcido, que lhe disse o seguinte: “Gostava que fosses para a tropa e, se possível, para a Marinha”. Este encontro ocorreu uns meses antes do falecimento daquele ancião, já quase com noventa anos.
Reunidas informações, conselhos e a autorização dos pais, o jovem tomou a decisão de cumprir o serviço militar, desejavelmente, na Armada Portuguesa, sabendo, à partida, que seria muito difícil ser “apurado” para servir num dos ramos das Forças Armadas muito prestigiado, não só em Portugal, como em todo o mundo, desde há muitos séculos, principalmente, a partir da época dos descobrimentos portugueses, no século XV.
Ingressar na Armada Portuguesa era, portanto, o sonho, um objetivo a ser alcançado, por este indivíduo acabado de sair da adolescência, mas já com vontade própria, determinação e orgulho pela escolha que estava a fazer, porque ele sabia que teria de enfrentar muitas dificuldades para conseguir vestir uma farda tão prestigiada quando maravilhosa.
Iniciado o processo de candidatura ao ingresso na Armada Portuguesa, com toda a documentação necessária, veio a primeira vitória: o jovem é convocado para prestar provas, nas unidades militares da Marinha, do Alfeite, margem sul do Tejo. Nesse dia, uma imensa alegria se apoderou de um jovem sonhador, que apenas desejava servir o seu país, através do serviço militar na Armada Portuguesa.
As provas para admissão na Armada Portuguesa, fosse para jovens voluntários, como era o caso, fosse para jovens já na idade de cumprir o serviço militar, aos vinte/vinte e um anos, eram muito rigorosas, compostas de um exame médico minucioso, em que todo o corpo em geral e, particularmente, todos os órgãos dos sentidos eram avaliados ao pormenor, seguia-se depois uma avaliação de conhecimentos literários e culturais, na época, há cerca de cinquenta anos, ao nível da quarta classe e, finalmente, as provas físicas com várias modalidades, sobressaindo a natação.
Paulatinamente, uma a uma, aquele jovem foi vencendo todas as etapas para realizar o seu sonho, concretizar um projeto de vida para a sua idade. Chegou ao fim com aprovação em todas as fases deste itinerário, com boa nota, e a satisfação de que de ora em diante seria mais um cidadão com responsabilidades acrescidas, no seu próprio pais.
Servir na Armada Portuguesa, de facto, não era para qualquer pessoa. Esta circunstância alimentou e reforçou a autoestima de um jovem humilde, pobre, mas que não virou as costas a um sonho, lutou, correu atrás dele e venceu, sempre convicto de que seria capaz atingir este primeiro desiderato na sua vida, foi um pouco como refere o adágio popular: “O homem sonha; Deus quer e a obra nasce”, neste caso, o projeto, concretiza-se.
Um de Abril de mil novecentos e sessenta e seis, data histórica que prevalece na memória de um cidadão, hoje, pai e avô, que continua a orgulhar-se do privilégio de servir na Armada Portuguesa, com total empenho, desvanecimento incontido e, acima de tudo, um grande respeito pelos valores que continuam a orientar todas as pessoas que, nas diversas especialidades, com as diferentes patentes e motivações, que excedem todas as expetativas, continuam a “Amar” a nossa Armada.
Cinquenta anos se passaram, o lema que continua a orientar a vida deste cidadão: “A Pátria Honrae que a Pátria vos Contempla” tem, precisamente, aquela idade. A escolha feita, há meio século, considera-a, ainda hoje, como sempre, a mais acertada, isto é: “servir a Armada Portuguesa, foi a forma que considerou a mais abnegada, de amar o seu país”, nada pedindo, então, em troca.
No dia um de Abril (que não foi nenhuma mentira) aquele jovem sonhador apresentava-se no Corpo de Marinheiros no Alfeite, onde adquiriria todo o fardamento necessário, para, de imediato, e ainda no mesmo dia, receber a respetiva “Guia de Marcha” e dirigir-se para o Grupo número Um de Escolas da Armada, em Vila Franca de Xira, onde se processaria a preparação militar dos mancebos e também dos recrutas, que se prolongou até quinze de Julho, data do “Juramento de Bandeira”, a que correspondia o fim da recruta.
O contingente de Abril de mil novecentos e sessenta e seis era composto por mais de mil homens: cerca de quinhentos e cinquenta, mancebos voluntários, com dezasseis/dezassete anos; os restantes, jovens recrutados na idade normal para o serviço militar, com vinte/vinte e um anos de idade.
Cumprir o serviço militar na Armada Portuguesa, como de resto, nos restantes ramos das Forças Armadas, era, naturalmente, uma imposição que pendia sobre todos os jovens portugueses, todavia, existia a outra alternativa, que já foi identificada: a emigração que, até ao vinte e cinco de Abril de mil novecentos e setenta e quatro, era feita sob a “capa” da clandestinidade, com imensos riscos, incluindo perigo de vida, para os portugueses que optavam por sair do país.
O cumprimento do serviço militar na Armada Portuguesa constituía e, continua a ser, uma incomparável “Escola de Vida Excecional”. Aqui se cultivavam os valores da solidariedade, da camaradagem, da lealdade, do humanismo, do respeito, da tolerância, da compreensão e da entre-ajuda; nela, na Armada, se cumprem: com rigor, profissionalismo e atualização, as diversas funções que cabem a cada mulher e a cada homem; neste ramo das Forças Armadas o “espírito de missão”, o altruísmo com que se realizam as gratificantes tarefas, por mais “penosas” que possam parecer, é uma constante.
A Pátria honrae que a Pátria vos Contempla”. E não há que ter complexos ao se escrever e/ou pronunciar a palavra “Pátria”, porque ela significa o Território, a Língua, a História, a Cultura com as suas tradições, usos e costumes, os Objetivos, enfim um Destino comum. Tudo isto se defende no serviço militar, em geral e na Armada em particular.
É muito importante, para a formação da pessoa, verdadeiramente humana, que as/os jovens portugueses, cumpram um período, ainda que de alguns meses, de serviço militar, mesmo que seja em regime de voluntariado, sem prejuízo das suas atividades profissionais, pelo menos em tempo de paz, porque não há melhor escola na vida do que tudo o que se aprende na Escola Militar.
Há cinquenta anos, realmente, os jovens portugueses eram mesmo obrigados ao serviço militar, em alguns casos, por longos anos, a maioria daqueles com “Destino” marcado para as ex-províncias ultramarinas, das quais não sabiam se voltavam vivos, onde muitos realmente perderam a vida, outros regressaram com deficiências, mais ou menos profundas, para o resto da vida e, também, muitas mulheres portuguesas ficaram sem os seus filhos, milhares de viúvas, enfim, uma autêntica tragédia humana, porque as lições da História, os exemplos de outros países colonizadores, não foram bem estudados por quem, então, tinha a obrigação e a responsabilidade de tudo fazer para evitar este holocausto nacional.
Decorridos cinquenta anos, neste primeiro de Abril de dois mil e dezasseis, poderemos, contudo, continuar a proclamar, em voz bem alta, o lema de que tanto nos orgulhamos, nós, mulheres e homens de Portugal, aquelas e aqueles que serviram a Armada Portuguesa: “A Pátria Honrae que a Pátria vos Contempla”. Não tenhamos vergonha, nem complexos de sermos genuinamente portugueses, democraticamente patriotas, sem ressentimentos nem vergonha do nosso passado cultural, humanista e tolerante.
 E para concluir, um pouco de História: «A exemplo do que sucede em muitos outros países, também os navios da Marinha Portuguesa ostentam uma divisa patriótica. Numa época em que os nacionalismos varriam a Europa, coube ao rei D. Luís (1861-1889), por inspiração do seu Ministro da Marinha e Ultramar, a decisão de colocar uma divisa a bordo dos navios da Marinha Real. José da Silva Mendes Leal (1820-1886), Ministro da Marinha e Ultramar entre 1862 e 1864, assinou a 20 de março de 1863 a portaria que abaixo se transcreve, atribuindo aos navios da Marinha o célebre lema:
«Manda Sua Majestade El-Rei declarar ao conselheiro inspector do arsenal da marinha, que sendo muito conveniente estimular por todos os modos os brios patrioticos e os nobres sentimentos, ha por bem ordenar que immediatamente faça apromtar e assentar nos navios que tenham tombadilho no vau d’este, e nos outros no ponto mais visível da tolda, a seguinte inscripção em letras de metal bem visíveis A PATRIA HONRAE QUE A PATRIA VOS CONTEMPLA».
Muito embora todos os navios da Marinha Portuguesa ostentem este lema, o NRP Sagres é o único que atualmente cumpre com a portaria de 1863, que determina a sua colocação no tombadilho. (in: http://www.marinha.pt/pt-pt/historia-estrategia/simbolos-tradicoes/Paginas/Patria-Honrae-Patria-Contempla.aspx consultado em 27.03.2016)

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