domingo, 27 de agosto de 2017

Relação Profissional: Consequências na Amizade Pessoal

O exercício de uma atividade profissional, em contexto de trabalho, em equipa, implica, por parte dos seus membros, a maior colaboração possível entre eles, tendo em vista alcançar determinados objetivos que a todos beneficiam: instituição, empresários, trabalhadores, clientes e fornecedores. A regra de ouro, eventualmente, entre outras, será, portanto, a coesão da equipa, a lealdade pessoal e profissional, a solidariedade e a cooperação dos seus membros.
É certo que, estará provado, a mistura entre amizade pessoal e o relacionamento profissional não produzirá os melhores resultados, na medida em que os contextos de relacionamento são diferentes: enquanto uma relação, uma amizade verdadeira, leal, solidária, em princípio, deverá ser para sempre; uma relação profissional será mantida enquanto durar o trabalho de equipa, e/ou no seio de uma mesma instituição.
É verdade que, a partir de uma relação profissional, permanente, se podem estabelecer laços de amizade que perduram para além daquela circunstância, inclusive, podem resultar num enlace matrimonial. Mas também se admite que uma relação profissional desleal provoca, inevitavelmente, mais tarde ou mais cedo, um desgaste emocional que afeta a amizade pessoal.
A questão que se coloca é a seguinte: o que será mais importante, uma relação pessoal de sincera amizade, com aquele amar próprio do “Amor-de-Amigo”, em que: «Amar outra pessoa, também significa desejar-lhe o melhor, olhar por ela, tratá-la de forma excepcional, dar-lhe o melhor de nós mesmos. Significa a outra nossa alma gémea da amizade sincera e dos valores a ela associados.» (cf. (ROJAS, 1994), ou uma, quantas vezes, “amizade” ou relação profissional casuística, oportunista, interesseira, hipócrita e leviana?
Em qualquer dos contextos – pessoal, profissional, político, social, religioso e outros – é essencial para uma boa relação a interiorização e boas-práticas de lealdade, porque: «Ser leal é estar comprometido com algo em que acreditamos. E, se acreditamos, queremos que continue, queremos conservar aquela crença, aquele estado criado no grupo. A condição de estabilidade assim compreendida tem sido fugidia.» (Ávila, 2005:12).
Epicuro, filósofo grego, nascido na Ilha de Samos, em 341 a.C., ilha grega no leste do mar Egeu, afirmava, já ao seu tempo, que: «A amizade e a lealdade residem numa identidade de almas raramente encontrada.» (http://pensador.uol.com.br/frase/MTI5MTk/, consultado em 17.08.2017).
Estes dois nobilíssimos valores, - Amizade e Lealdade - que tanto dignificam o ser humano, são indissociáveis, porque um implica o outro, em quaisquer situações, isto é, não se pode ser amigo e manifestar amizade pessoal e ao mesmo tempo ser-se incoerente e desleal em contexto profissional.
Poderá ser muito complexo levar para o trabalho a amizade pessoal, na medida em que esta é um valor que não pode ser colocado ao serviço do todo, é um sentimento que apenas diz respeito a dois amigos, os quais não devem permitir que alguém se valha desta amizade para outros fins: influências à custa daqueles amigos, exibições e autopromoções.
O ideal será, portanto, a ampliação, consolidação e preservação de uma verdadeira amizade pessoal, e evitar, a todo o custo, que esta venha a ser prejudicada por comportamentos profissionais inadequados e até injustos, mantendo-se sempre, em todas as situações, uma absoluta lealdade, porque assim se poderá conservar a confiança, a fidelidade, a cumplicidade e a coesão. Colocar acima de um “Amor-de-Amigo”, outros interesses, situações e pessoas, poderá constituir um autêntico suicídio nas restantes relações.
A lealdade no trabalho exige reciprocidade, isto é, a lealdade de um colaborador só se justifica se o colega adotar idêntico comportamento, - reciprocidade - de contrário e quando se verificar a infidelidade, então o melhor será a desvinculação do compromisso de retribuição, mantendo-se, todavia, relações de cordialidade, educação, respeito e colaboração, estritamente profissionais, sob pena dos objetivos serem prejudicados e tudo ficar em causa, incluindo a instituição e os postos de trabalho.
A inexistência de comportamentos leais, solidários, cúmplices, em contexto profissional, envolve, eventualmente, um afastamento pessoal, social e relacional fora da instituição, o que nada tem a ver com a amizade exatamente pessoal.
Parece incompatível querer ser-se amigo e bem relacionado fora da instituição, mas com comportamentos “encapuzados” no âmbito profissional e vice-versa. A coerência, a verdade, a frontalidade, serão sempre a chave das atitudes corretas e do sucesso das relações.
Claro que é difícil conciliar comportamentos, baseados numa verdadeira amizade pessoal, com os que resultam da atividade profissional. As barreiras a vencer, por vezes, são muitas e, aparentemente, intransponíveis. É nestas circunstâncias que: «Aprendemos muito mais quando temos de enfrentar obstáculos pela frente, ou quando estes não são nenhuns. Uma vida com relações difíceis, preenchida de obstáculos e perdas, representa sempre uma oportunidade para o crescimento da alma.» (BRIAN, 2000:64).
A componente tempo profissional, corresponde, sensivelmente, a pouco mais do que um terço da vida de cada pessoa. Adotar atitudes profissionais que prejudicam uma relação pessoal de amizade sincera, revela-se improcedente, até pela razão de que muito dificilmente dois ou mais colegas de trabalho vão conviver toda uma vida enquanto tais. Hoje, os empregos para toda a vida são, praticamente, inexistentes, logo, não se justificam comportamentos incorretos que afetam valores extraprofissionais.
A preservação da verdadeira amizade é, portanto, uma prioridade em quaisquer níveis de relacionamento. Naturalmente que a manutenção de uma amizade sincera, pura e que se deseja para toda a vida, envolve alegrias e tristezas, vitórias e derrotas, felicidade e desventura.
Mas a nossa existência humana é assim mesmo: «O sofrimento faz parte da vida e não temos de sentir que ele acontece por termos sido nós pessoalmente a dar um passo errado. Na realidade, aliás, quando sentimos sofrimento, pensamos que algo está errado. Como estamos dependentes da esperança, sentimos que podemos sintonizar a nossa experiência, animá-la ou alterá-la de algum modo e continuamos a sofrer imenso.» (CHODRON, 2007:61).
Resulta que será incompreensível todo e qualquer comportamento profissional que venha a agravar ainda mais a vida extraprofissional, concluindo-se que para atenuar, ou evitar efeitos nocivos na amizade, de um ou mais colegas de trabalho, estes devem ter atitudes de grande abertura, transparência, ajuda mútua e, principalmente, honestidade intelectual, lealdade pessoal, comunhão, tanto quanto possível de juízos de valor, quando justos, verdadeiros e pertinentes.
O relacionamento profissional que contrarie determinadas regras, princípios, valores, sentimentos e condutas, está condenado ao fracasso, à desilusão, à desmotivação e à improdutividade, o que, uma vez mais, se reflete na relação de amizade pessoal, nos sentimentos de “amor-de-amigo”, de carinho, de estima, de consideração.
Caminha-se, então, para a hipocrisia, para o cinismo, para o “faz-de-conta”, para uma “paz-podre”, que conduz à infelicidade, à doença, à morte psicológica e física das pessoas, sobre quem recaem os comportamentos desleais dos colegas.
A relação pessoal de amizade extraprofissional é o “motor” que faz movimentar os mais nobres princípios, valores e sentimentos: Amor, lealdade, companheirismo, justiça, cumplicidade, motivação, alegria, comunhão de objetivos.
Como ideia central poder-se-á reter que a amizade pessoal, quando assente num grande e indestrutível “Amor-de-Amigo”, jamais deverá ser exposta e muito menos misturada com outras relações, a começar no contexto de trabalho, e noutras atividades que, de alguma forma, atraiçoem aquele sentimento tão profundo, porque a amizade assumida entre dois amigos que, descomplexadamente, se querem muito bem, independentemente de estatutos, faixas etárias, património e outros valores materiais, não deverá ser destruída, em circunstância alguma.
Por isso as relações profissionais, também estas, devem pautar-se pela transparência, pela verdade, pela solidariedade e pela reciprocidade e, então sim, poderá acontecer que desta surja uma relação pessoal. O contrário, uma relação pessoal, sincera, íntima, esta no sentido da cumplicidade, da confidência de situações que afetam os amigos, deve ser sempre preservada e evitar recorrer a esta relação privilegiada em contextos profissionais se daí resultarem situações nefastas para aquela amizade pessoal.
Não se devem misturar os planos, porque em contexto profissional, as funções estão estabelecidas, é só cumprir com as regras: cada pessoa tem as suas competências; exerce as suas capacidades o melhor que sabe e que pode; não tem de levar para o trabalho o que é de natureza particular e, de igual forma, não deve transportar para casa ou para o seio de amigos, as dificuldades laborais, se estas vierem a provocar a degradação das relações pessoais.
Não se defende que tudo seja, ou deva ser, estanque na vida. O que se preconiza é que se evite “misturar” princípios, valores, sentimentos e emoções em quaisquer contextos. Que se acautele toda e qualquer possibilidade de magoarmos os nossos verdadeiros amigos, aqueles de quem temos sobejas provas de que realmente estão sempre connosco, do nosso lado, preocupados com o nosso bem-estar. Temos de aprender a conhecer os nossos amigos do coração e não custará nada, se realmente os queremos como amigos, compreendê-los, considerá-los, estimá-los, acarinhá-los.
A amizade pessoal é um bem preciosíssimo. Quem tem uma amizade profunda, com um amigo verdadeiro, seguramente que, nas dificuldades da vida, terá sempre a seu lado uma pessoa doadora, carinhosa, meiga e que atenuará o sofrimento, qualquer que este seja. Por tudo isto é que a relação pessoal, em circunstância alguma poderá ser prejudicada pela ligação profissional.

Bibliografia

ÁVILA, Lauro António Lacerda de (2005). Lealdade nas Atuais Relações de Trabalho, Vale do Rio dos Sinos - Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Cadernos IHU, Ano 3, Nº 14 - 2005
BRIAN L. Weiss, M.D. (2000). A Divina Sabedoria dos Mestres. Um Guia para a Felicidade, alegria e Paz Interior. Trad. António Reca de Sousa. Cascais: Pergaminho.
CHODRON, Pema, (2007). Quando Tudo se Desfaz. Palavras de coragem para tempos difíceis. Trad. Maria Augusta Júdice. Porto: ASA editores.
ROJAS, Enrique, (1994). O Homem Light. Tradução Pe. Virgílio Miranda Neves. Madrid: Ediciones Temas de Hoy, S.A.

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

Jornal: “Terra e Mar”

Portugal: http://www.caminha2000.com (Link’s Cidadania e Tribuna)

domingo, 20 de agosto de 2017

Autoridade Docente

Na perspetiva da Filosofia Social é necessário considerar a existência legal do quadrinómio: sociedade, autoridade, norma e bem-comum. O exercício da autoridade funda-se na norma legal e, em algumas atividades, nomeadamente, a política, na legitimação proveniente da adesão popular. Em sentido lato, e para o enquadramento da autoridade, em geral, considerem-se as normas jurídicas, morais, cognitivas, profissionais ou quaisquer outras que reconhecem e legitimam aquele poder.
A autoridade docente, nas suas diferentes abordagens: específicas de cada disciplina; culturais, humanas, sociais, políticas e de cidadania, deve ser exercida, não só em contexto escolar da sala de aula, mas também noutros âmbitos da vida do professor, o qual deve ser o primeiro a manifestar um comportamento ético-deontológico compatível com a sua nobre função e estatuto exemplar, porque só por esta forma revelará competência e inspirará segurança. Ao longo da sua carreira, o professor é, também, um cogestor de interesses, recursos, expetativas e classificações.
O sucesso do sistema educativo inicia-se, portanto, a partir da maior harmonia, solidariedade e cumplicidade entre dois protagonistas: aluno/professor; formando/formador. Tudo o resto à sua volta desempenha um papel fundamental, ao nível da complementaridade e da compreensão das posições que os atores principais vão assumindo, de forma responsável e segura, sem prejuízo, relativamente aos menores, de os respetivos encarregados de educação poderem (e deverem) decidir para o bem dos seus educandos, escutando, embora, as opiniões especializadas dos correspondentes técnicos e dos docentes.
Para se compreender, e aceitar, a autoridade docente, uma boa estratégia poderá ser aquela que, no seio da família, desenvolve o exercício pleno da autoridade dos pais: não num sentido totalitário e autoritário; não com uma pressão esmagadora; não com o recurso à violência física e psicológica, mas adotando, precisamente, regras, princípios e valores que, mais tarde, serão aperfeiçoados na escola, o que desde logo tem a vantagem de a criança, o jovem, ou mesmo o aluno, não sofrer com a integração, entretanto em curso.
A urgência em se dotar as instituições intervenientes no processo educativo/formativo de um novo educador, impõe-se, nitidamente, à sociedade que, através das suas organizações: públicas, privadas, profissionais, culturais, sociais e outras, nas diversas áreas específicas, têm o dever de contribuir, ativamente, com todo o tipo de recursos, para que a figura de um novo educador se transforme, posteriormente, numa nova sociedade educativa, progredindo do educador individual, para as famílias, escolas, cidades e nações educadoras.


Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

Jornal: “Terra e Mar”

Portugal: http://www.caminha2000.com (Link’s Cidadania e Tribuna)

sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Bodas de Alabastro


Quarenta e seis anos ininterruptos de matrimónio já corresponde, praticamente, a mais de meia existência de uma pessoa, considerando, atualmente, que a “esperança de vida” se aproxima dos noventa anos para uma população idosa, felizmente, em crescendo, muito embora se reconheça que a percentagem de pessoas que atingem os noventa e dois anos, ainda não é muito elevada, mas também, e segundo as estatísticas oficiais, cada vez há mais pessoas com uma vida longa e já com alguma qualidade.
Esta idade matrimonial, a que corresponde, ao que em boa tradição se convencionou designar por “Bodas de Alabastro”, é um marco indelével na vida matrimonial de todos os casais, considerando que, nestes tempos pós-modernos, alcançar uma tal duração de relacionamento diário, com: amor, felicidade, afabilidade, carinho e respeito, revela bem a solidez de um sentimento tão nobre, quanto necessário no seio de uma família formal ou informal.
Ao longo de uma vida matrimonial, várias são as comemorações para cada ano de vida conjugal, contudo, existem alguns anos que são, tradicionalmente, mais marcantes e festejados. Refiro-me, por exemplo, às: “Bodas de Prata”, vinte e cinco anos de matrimónio; “Bodas de Ouro”, cinquenta anos nupciais; “Bodas de Diamante”, setenta e cinco anos, de consórcio e, finalmente, para quem tiver a felicidade de lá chegar, o que por enquanto não se tem conhecimento de que tenha acontecido com alguém, as “Bodas de Jequitibá”, correspondente a cem anos de vida conjugal.
Neste ano de 2017, tenho a felicidade de celebrar com a minha esposa, filhas, genros e netos, as nossas “Bodas de Alabastro”, que corresponde a 46 anos de vida a dois e cujo significado, entre muitos outros, certamente, se poderá aceitar: «Escolhido como símbolo dos 46 anos de vida a dois, o alabastro é uma espécie de mármore branco, translúcido e suscetível ao polimento. Mineral ou rocha calcária pouco dura, de granulação fina e translúcida, e de cor branca. É um mineral branco, usado desde a antiguidade na Grécia, esculpido em forma de pequenos vasos para queimar perfumes e incensos; tem a aparência de mármore, mas é translúcido, com fibras. Significa prosperidade e fartura. Antigamente quanto mais abastada a família, maior o vaso de alabastro, significa então prosperidade e fartura no casamento. Frascos feitos de genuíno alabastro eram usados para os unguentos e perfumes mais caros, como aqueles com os quais Jesus foi ungido em duas ocasiões. Sugestões de presentes: frascos com perfumes, vasos.» (in: http://dalvaday.blogspot.pt/2014/08/2014-significado-de-bodas-de casamento_10.html em 11.08.2017).
Naturalmente que não pretendo fazer aqui a apologia de uma existência conjugal perfeita, porque acredito que ela não existe em absoluto, de resto, sempre se verificam diferenças nos dois cônjuges, desde: princípios, valores, sentimentos, emoções, a que se juntam, por vezes, estatutos diferentes, aos níveis sociais, profissionais e ainda as respetivas origens genealógicas.
É minha convicção que em qualquer casal, independentemente da sua constituição, sempre haverá: com maior ou menor frequência; com mais ou menos intensidade; com argumentos mais poderosos de um das partes, alguns momentos na vida em que a harmonia dos cônjuges se desestabiliza, por mais ou menos tempo, todavia isso é normal, e até será salutar, na medida em que ajuda a clarificar posições, atitudes, pensamentos, contribuindo, afinal, para, em determinadas circunstâncias, minimizar uma ou outra consequência, menos agradável
É sabido que a “Filosofia Popular”, por vezes invoca situações e frases tão assertivas que não necessitam de contra-argumentos, como por exemplo: “Casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão”. O pão, aqui, até poderá ter um significado meramente modelar, porque em boa verdade, ao longo da existência, muitas são as ocorrências na vida familiar, que provocam discussões, mais ou menos acaloradas e, no limite, até conduzem à violência doméstica.
Na comemoração das nossas “Bodas de Alabastro”, não pretendemos negar que, durante estas mais de quatro décadas e meia, a vida nem sempre foi fácil, todavia, tem havido um cuidado extremo em ultrapassar divergências, em encontrar as melhores soluções, em passar para as filhas, genros e netos as dificuldades, mas também as estratégias para as superar, por isso, os “conflitos” conjugais são bastante atenuados, uma ou outra vez, impercetíveis, contribuindo para a solidez e estabilidade da família.
Quarenta e seis anos de vida em comum, num ambiente de total cumplicidade, com imenso amor, respeito e entreajuda, revela bem que é exequível alcançar uma certa e relativa felicidade, já que, é impraticável medir este valor, tão desejado quanto procurado, mas considera-se que, a vida a dois, pode proporcionar o caminho adequado para se alcançar aquele desiderato.
Há sessenta, cinquenta e quarenta anos, pelo menos, a sociedade não nos oferecia as condições que hoje nos proporciona: seja na área da saúde, no domínio da educação, no âmbito das tecnologias, no contexto sociocultural e ainda noutras dimensões da existência humana.
Muitas pessoas trabalhavam: de “sol-a-sol”, nos campos, na pesca, na construção e noutros setores igualmente rudes; adoecia-se e falecia-se muitas vezes sem a possibilidade de um tratamento eficaz, e sem se saber o nome e origem da doença; as famílias eram extensas e, em muitas delas, os meios de subsistência eram escassos, portanto passava-se mal, ao nível da alimentação, do vestuário, da educação e da formação.
Tempos difíceis que, muito embora houvesse bastante trabalho, principalmente: na construção civil, na pesca, na agricultura, nas minas, os salários eram insuficientes, praticamente, uma miséria, poucas pessoas tinham descontos para a Segurança Social e isso viria a refletir-se mais tarde na reforma, que hoje sabemos haver uma grande parte de aposentações exíguas.
Por outro lado, a partir de meados da década de cinquenta, do século passado, os preparativos para as guerras colonias estavam em curso, porque os povos subjugados por Portugal queriam, e tinham o direito à sua independência, portanto, a partir do início de sessenta, o destino da esmagadora maioria dos jovens era a mobilização para combater nas então colónias, onde durante cerca de treze anos milhares perderam a vida, ficaram inválidos e impossibilitados de uma existência normal, para os que conseguiram regressar.
A alternativa a quem: não pretendia viver praticamente na miséria em Portugal; nem ir combater para as ex-colónias, era a emigração para diversos países europeus, à cabeça dos quais estava a França, Luxemburgo, Alemanha, Suíça, Venezuela, Brasil, entre outros. Hoje há uma comunidade portuguesa e de luso-descendentes de mais de cinco milhões de pessoas, com vidas confortáveis e estabilizadas.
Hoje, agosto de 2017, é necessário fazer uma referência à triste e deplorável situação que se verifica na Venezuela, onde centenas de milhares de Portugueses e luso-descendentes, estão a “fugir” para Portugal, deixando naquele país, tudo quanto ao longo de décadas conseguiram, através do trabalho competente, honesto e de grandes poupanças.
No decorrer deste percurso: primeiro, a dois; depois, a três; finalmente, a quatro, ou seja, o casal com duas filhas. Mas que felicidade Deus nos concedeu. De seguida vieram os genros e os netos, e que nestes vamos reforçando a nossa projeção, porque se numa primeira fase, com as filhas, nelas nos queremos rever, com os netos, já vislumbramos o prolongamento das nossas raízes mais fundas e fortalecidas.
Naturalmente que ainda é muito cedo para se abordar a data que muitos casais desejam: as “Bodas de Ouro”, ou também as “Bodas de Brilhante” como alguns preferem, todavia, independentemente dos nomes, o importante é: celebrarmos, de momento, esta data de “Alabastro”, com grande amor, que se deseja cada vez mais consolidado, se tal ainda for necessário e possível; comemorar, em Ação de Graças, este privilégio Divino, de nos mantermos unidos, amados e com projetos para alimentar este amor, que nos acompanha há mais de quarenta e seis anos.
Tal como já foi afirmado, noutro contexto: «A Felicidade dá muito trabalho …, mas vale a pena» (BÁRTOLO, 2017: capa). Claro que não é fácil harmonizar um conjunto muito vasto de diferenças: primeiro, entre os cônjuges, até pelo facto de, na circunstância, existir uma mulher e um homem, cujas sensibilidades são diferentes e, igualmente, as personalidades também não são idênticas; depois, entre todos os elementos da família nuclear. Vale o amor, o respeito, a persistência.

Bibliografia

BARTOLO, Diamantino Lourenço Rodrigues de, (2017). Em Busca da Felicidade, 1ª Edição, Lisboa: Chiado Editora.

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

Jornal: “Terra e Mar”

Portugal: http://www.caminha2000.com (Link’s Cidadania e Tribuna)



domingo, 6 de agosto de 2017

Docência: Paradigma da Autoridade Democrática?

É desejável e, provavelmente, benéfico que a docência seja entendida como uma forma pedagógica, cognitiva e didática do exercício da autoridade educativa/formativa. A autoridade docente deve, preferencialmente, circunscrever-se aos níveis educativos, formativos e cívicos, de tal forma que o docente, no seu espaço físico interterritorial, que começa na escola, se amplia no laboratório/oficina, e se prolonga pela sociedade, seja sempre reconhecido pela autoridade que exerce, no poder que tem de ensinar/aprender/formar e preparar para a vida, todos aqueles que ingressam no sistema educativo/formativo, ele próprio, o professor/formador, incluído.
Exige-se ao cidadão investido de autoridade docente, que seja testemunho vivo e atuante, paradigma das boas-práticas da cidadania democrática, com todos os deveres e direitos que ela comporta; igualmente se requer aos poderes, legal e democraticamente constituídos, que valorizem e prestigiem a autoridade docente.
A quadratura para a formação do cidadão, com autoridade, pode ser aplicada em quaisquer situações socioprofissionais e estatutárias. Educar, formar, instruir e integrar no seio da família, da escola, da igreja e da comunidade, constitui o espaço privilegiado e delimitado por estas organizações.
 A urgência em se dotar as instituições intervenientes no processo educativo/formativo de um novo educador, impõe-se, nitidamente, à sociedade que, através das suas organizações, públicas e privadas, profissionais, culturais, sociais e outras, nas diversas áreas específicas, tem o dever de contribuir, ativamente, com todo o tipo de recursos, para que a figura de um novo educador se transforme, posteriormente, numa nova sociedade educativa, progredindo do educador individual, para as famílias, escolas, cidades e nações educadoras.
O novo tipo de educador vai promover, a médio prazo, um modelo de cidadão profissional, de pessoa humana, no limite, contribuir para um novo mundo, mais justo, solidário, fraterno e competente. Um projeto educativo, para a formação de um tipo novo de educador, terá de envolver, à partida, pessoas disponíveis e sensibilizadas para assumirem funções muito exigentes, com um elevado nível de rigor e espírito de missão.
Cidadãos que da vida e do mundo tenham, entretanto, uma determinada vivência experienciada, uma sabedoria prudencial e, consequentemente, o bom-senso que caracteriza as mulheres e os homens de boa-vontade, moderados, tolerantes, compreensivos, clarividentes e firmes.
Uma nova escola, para formar um novo tipo de educador, deve recorrer àqueles cidadãos que reúnam as condições consideradas adequadas, obviamente com a formação especializada para os domínios que vai orientar: «Eu digo que é preciso antes de mais que ele próprio seja um homem ou uma mulher verdadeiros, adultos que atingiram a maior idade, com maturidade afectiva equilibrada, indispensável para tomarem conta de crianças e para a sua relação com elas. É este o ponto fundamental porque não se pode pretender nem esperar formar homens autónomos por pessoas que não sejam elas próprias livres, responsáveis e autónomas. (…) Nestas condições, o educador não pode esperar ter êxito na sua tarefa se não possuir quatro qualidades fundamentais: optimismo pedagógico, imaginação criadora, espírito científico, espírito de equipa.» (GLOTON, 1974:255).
Um novo tipo de formador, está diretamente correlacionado e conduzirá ao bom cidadão docente. Poderá ser, num futuro próximo, este o novo educador, progressivamente extensível a todos os níveis de ensino e formação profissional, que terá toda a autoridade docente para, coniventemente, com o aluno/formando e as instituições, desenvolver os projetos educativos e formativos.
Numa perspetiva de curto prazo e na execução de projetos abrangentes de todas as idades, etnias e estatutos, as qualificações requeridas serão mais exigentes e avançam para um conceito mais profundo, agora designado por bom cidadão docente. Haverá uma evolução de mentalidades, de técnicas, de estratégias e metodologias, a partir do novo tipo de educador.
O bom cidadão docente implica ter características muito específicas, que determinam condutas muito difíceis, designadamente: ser consciencioso, altruísta, civicamente virtuoso, cortês, pacificador e desportista, as quais se podem descrever como: «Ser consciencioso significa ir para além do que está formalmente prescrito para a função. O altruísmo engloba os actos de ajuda a pessoas específicas (docentes, discentes …). A virtude cívica denota a participação responsável na vida da organização. Ser cortês implica agir com tacto, respeito e consideração na relação com os outros. O desportivismo reflecte a tolerância para com situações menos agradáveis e desconfortáveis. Ser pacificador significa agir como moderador de conflitos e zelar pelo ambiente social da escola.» (REGO, 2003:57-58).
A docência exercida por pessoas com tais características recuperará e consolidará, definitivamente, a autoridade, tantas vezes reclamada. Assumir a docência apenas como uma ocupação provisória, como um complemento remuneratório a outras atividades, pode revestir uma atitude de lesa-cidadania.
A atividade docente ganha autoridade, não tanto pela apresentação de um diploma de licenciatura e/ou especialização, direcionada para a educação/formação, mas também por uma conduta docente irrepreensível, paradigmática dos princípios, valores, sentimentos e atitudes, a partir da qual a comunidade lhe atribua, espontânea e responsavelmente, essa autoridade, à qual adere sem nenhuma oposição.
Selecionem-se, então, bons-cidadãos docentes, para bons-educadores docentes. Parece ser este o caminho a seguir para um novo tipo de educador intercultural que, simultaneamente, congregue em si o cidadão, a pessoa humana revestida da dignidade que lhe pertence.

 Bibliografia

GLOTON, Robert, (1976). A Autoridade à Deriva, Trad. Carmen González, s.l. Ulisseia.
REGO, Arménio, (2003). Comportamentos de Cidadania Docente: na Senda da Qualidade no Ensino Superior, Coimbra: Quarteto Editora.
  
Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

Jornal: “Terra e Mar”

Portugal: http://www.caminha2000.com (Link’s Cidadania e Tribuna)