domingo, 12 de março de 2023

Educação para a Organização Social

              Enquanto instrumento privilegiado para o desenvolvimento da sociedade, na observância da plena cidadania, a Educação desempenha, de facto, um papel insubstituível. No sistema liberal, que Pinheiro Ferreira tanto defendeu, até pela abolição de todo e qualquer privilégio, aceita-se que o principal ideal de educação é o da Escola, ao serviço de todas as classes, de não estar ao serviço de nenhum credo religioso ou político ou de interesses inconfessáveis.

A Escola e a instrução não devem servir de instrumento àqueles que possuem títulos, dinheiro, tempo para exercerem o poder, porque a Escola deve ser o local de formação do indivíduo, do homem no seu todo: livre, ativo, realizado e cidadão responsável.

Na Escola e na educação que os liberais idealizam, a Filosofia tem uma importância nada desprezível, como de resto deveria acontecer noutros domínios do conhecimento e da formação pessoal. Independentemente de outros veículos, e/ou instrumentos, para a dignificação da pessoa, parece pacífico, e aceita-se, que a Escola se preocupe com o Homem, sem estigmas ou benefícios resultantes da família, classe, religião, política, estatuto social, mas atendendo ao desenvolvimento de cada um, estimulando os dotes inatos, valores intrínsecos, talentos, aptidões e vocações.

A propósito de vocação, o projeto educativo de Pinheiro Ferreira, prevê que o aluno deverá ser encaminhado segundo os seus desejos e aptidões e não por imposição dos pais, porque é a partir dos talentos e vocações individuais que a escola melhor poderá realizar a sua função, aproveitando as qualidades inatas dos seus alunos.

O último quartel do séc. XVIII foi pródigo na reflexão filosófica, com incidência educativa, tendo-se elaborado alguns projetos verdadeiramente aliciantes; algo utópico, é certo, mas que já refletiam, apesar de tudo, alguns dos ideais liberais. Na sequência da Revolução Francesa, Condorcet (onde Pinheiro Ferreira investigou) elaborou um “Plano de Instrução Pública”, cujos pontos fortes assentam em princípios e valores que se recordam:

«(a) Ensinar a todos os cidadãos os conhecimentos necessários ao exercício dos direitos comuns ao gozo da independência, que os colocarão em estado de se conduzirem a si mesmos, sem recorrerem a nenhuma razão estranha: de gozarem seus direitos naturais; de exercerem uma profissão remunerada – em poucas palavras, de não dependerem senão de si mesmos nos actos ordinários da vida económica, intelectual, moral e social. (...) (b) dar a cada um o saber técnico em vista de uma profissão determinada. Esta instrução técnica não deverá ser idêntica para todos. É preciso, ao contrário, diferenciá-la em tantos cursos especiais quantas são as profissões análogas. (...). (c) Assegurar a cada um a cultura que desenvolverá plenamente os diversos talentos pessoais. Para isto é necessário que a instrução varie segundo a sua natureza e potencial, que ela se diversifique, por assim dizer, de acordo com cada indivíduo.» (in: CUNHA, 1978:41-42).

O pensamento europeu, designadamente da França das últimas décadas do século XVIII, influenciou, significativamente, a obra filosófica de Pinheiro Ferreira e, a partir desta toda uma doutrina político-liberal, que ele procurou divulgar e implementar no Brasil, aperfeiçoando-a através de inúmeros escritos.

As ideias educativas de Pinheiro Ferreira procuraram responder à organização social do seu tempo, ajudar a resolver os problemas que então se colocavam à sociedade, e dotar o cidadão de capacidades que lhe permitissem, pragmaticamente, inserir-se numa vida de trabalho. Na escola idealizada pelo luso-brasileiro, não há tanto a preocupação do aluno progredir de graus inferiores para os superiores, mas antes dotar o jovem de conhecimentos técnico-profissionais com alguma polivalência.

A educação a ministrar às crianças, proposta por Silvestre Ferreira, tem, à partida, uma intenção elitista, porquanto prevê a separação entre os que pertencem a classes inferiores e superiores; no entanto, e para evitar arrogâncias aristocráticas assentes num critério hereditário, a separação das crianças é feita em função da graduação profissional de seus pais.

O estatuto social dos chefes de família resulta, em primeira análise, das atividades em que desenvolvem as suas profissões as quais se distribuem por uma hierarquia de doze classes. A separação das crianças assenta no critério de que sendo oriundas de classes diferentes, os hábitos adquiridos por elas também são diversos; por via disso, não seria possível sujeitarem-se todas a um mesmo nível e género de vida. Acresce que a educação física e moral de crianças que pertencem a classes diferentes, também tem de ser diferente.

Nestas circunstâncias e segundo o autor de referência: 

«Não é, pois, justo fazer passar logo da casa paterna para o colégio primário da municipalidade, e a um género de vida mais delicado aquele que até então fora costumado a uma vida mais dura, e muito menos constranger a privações aquele que fora criado em abundância. Cumpre, pois, que as crianças pertencentes a classes inferiores sejam reunidas em colégios puramente municipais, enquanto aquelas que pertencem a classes superiores devem ser educadas sim em colégios de educação primária, mas situados nas cabeças das divisões territoriais de uma categoria tanto mais elevada quanto o for na ordem da hierarquia social a classe a que o aluno pertence”. (FERREIRA, 1834b:457).

Na perspetiva Silvestrina, este modelo adotado para as crianças, com idade de sete anos, corresponderia a uma organização que visava proporcionar um verdadeiro ideal de educação nacional, na medida em que, numa fase posterior do processo educativo, os alunos mais capazes encontrar-se-iam nos mesmos colégios, independentemente das suas origens sociais.

 

Bibliografia

 

CUNHA, Luís António, (1978). Educação e Desenvolvimento social no Brasil. Rio de Janeiro: Francisco Alves Editora SA. Págs. 27-60.

FERREIRA, Silvestre Pinheiro (1834b) Manual do Cidadão em um Governo Representativo. Vol. I, Tomo II, Introdução António Paim (1998b) Brasília: Senado Federal.

 

“NÃO, à violência das armas; SIM, ao diálogo criativo. As Regras, são simples, para se obter a PAZ”

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Venade/Caminha – Portugal, 2023

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Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

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