Acredita-se que em
quase todos os seres humanos, ao longo das suas vidas, tenham existido
períodos, relativamente longos: anos, meses, semanas, dias ou horas, em que as
vivências, mais ou menos otimistas e/ou pessimistas, tenham sido experimentadas,
com maior ou menor intensidade, e que nelas se cruzem estados de espírito muito
diferentes, que até podem ser divergentes e/ou convergentes, levando a
determinadas atitudes e comportamentos, que nem sempre são detetados e
compreendidos pelas pessoas em geral, embora quem conheça, minimamente, certas
situações, que potenciam aquelas reações, tenha uma visão diferente: de
aceitação e tolerância; ou mesmo ajuda, se tal for o caso.
Pretende-se
refletir um pouco, sobre as alterações do estado de espírito e o comportamento
que elas implicam, que influem na própria personalidade, avançando-se, então,
alguns pseudo-diagnósticos sobre alegadas patologias como: comportamento
bipolar; transtorno de personalidade e outras situações consideradas anormais,
eventualmente, de rutura, definitiva e/ou prolongada, com um modo de viver em
sociedade, em família, no trabalho, nos estudos.
Acontece que, por
vezes, a origem de transformações, mais ou menos profundas, da personalidade,
esta considerada como um conjunto de traços pessoais, relativamente estáveis,
que levam as pessoas a reagir com uma certa uniformidade, perante situações idênticas,
tem origem em: alterações sócio-comportamentais mais visíveis, que podem estar
influenciadas por causas relacionadas com atitudes, valores e sentimentos de
outras pessoas, que interferem, intensamente, com o estado de espírito de um
colega, amigo ou familiar.
Ao longo da nossa
vida, praticamos boas e más ações, a favor e contra nós, familiares, amigos,
colegas e a sociedade no seu todo, das quais nos regozijamos ou nos
arrependemos, respetivamente. Se adotamos normas e princípios de vida, no
sentido do bem e nunca recebemos qualquer reconhecimento, uma palavra que seja
de gratidão, ficamos infelizes.
Portanto, se em vez
de um agradecimento, recebemos atitudes de: desvalorização, indiferença e,
finalmente, de rejeição por parte da pessoa, ou grupo a quem nós fizemos bem, aqui
pode surgir um primeiro sentimento de mágoa, tristeza, dor, sofrimento e
desgosto, tanto mais profundos quanto mais nós gostávamos da pessoa a quem
ajudámos, em vários aspetos, de quem fomos verdadeiros e incondicionais amigos,
solidários e leais. Certas atitudes acabam, invariavelmente, por destruir a
confiança, o carinho, a amizade e consideração que tínhamos para com as pessoas
que receberam de nós os mais nobres e sinceros sentimentos.
A ingratidão,
acompanhada da indiferença, da rejeição, da falta de consideração, estima e
amizade, de facto constituem um rude golpe na autoestima, na própria honra, nos
valores e sentimentos de quem é vítima de tal comportamento que, ferida na sua
dignidade mais profunda, pode, inclusivamente, cometer atos irreversíveis.
Nestas
circunstâncias, será muito difícil recuperar a alegria, a paz, a felicidade,
por vezes a própria saúde, porque as dores psico-sentimentais, causadas pela melancolia,
ferida, padecimento e desgosto, são como uma doença física incurável que, em
muitas situações, pode conduzir à morte, seja por profunda depressão ou suicídio,
cuja responsabilidade moral será sempre da pessoa que, injusta e cruelmente,
nos rejeitou, sem qualquer razão para o fazer.
Certamente que as
vítimas de ingratidão, insensibilidade, desfeita e repulsa, dentro de
determinados parâmetros, e desde que as ofensas não atinjam uma gravidade
incontrolável, podem tentar como que uma espécie de mitigação para o
sofrimento, adotando medidas que conduzam à separação gradual daquelas pessoas,
sem lhes faltar ao respeito, nem entrar em contra-ofensivas, métodos
retaliatórios, chantagens, maledicências e hipocrisias. Devem tentar,
educadamente, afastar-se, com todo o sofrimento e desgosto que carregam.
No relacionamento
que travamos, uns com os outros, existem regras, princípios, valores e
sentimentos que devem ser observados. Numa relação de grande amizade, em que já
permanece uma bem definida aceitação da outra pessoa, como uma verdadeira e
sincera amiga, certamente que nasce um amor muito especial, a que se ligam
atitudes e comportamentos muito próprios e distintos dos demais, envolvendo,
precisamente, uma disponibilidade total para a generosidade, para a dádiva e
para a proteção da pessoa que queremos para nossa exclusiva amiga, e de quem já
nos tornamos intensamente cúmplices.
Nesta relação de
profunda amizade: «Não podemos esquecer
que somos seres temporários, impermanentes, e deveríamos desejar fazer o bem ao
maior número de indivíduos possível durante nossa efêmera existência. Esta é a
ética da responsabilidade.» (CARVALHO, 2007:102).
Ao assumirmos esta
postura, com total sinceridade, evidentemente que não esperando qualquer
retribuição, mas desejando receber um sinal de agradecimento, ou mesmo de
simpatia, de consideração, se tal não acontecer, esse comportamento
entristece-nos, e até nos pode magoar intimamente.
Por vezes, quase que
temos motivos para pensar que as pessoas, grupos ou organizações, a quem
fazemos bem, elas podem considerar que temos essa obrigação, talvez por se
sentirem com um estatuto superior ao nosso, materialmente assim qualificado.
Ora, ninguém tem o
direito de exigir que lhe façamos bem, mas muitos de nós temos o dever
ético-moral, pelo menos neste domínio, de agradecer, estimar, considerar quem
nos ajuda de alguma forma: seja através de valores e sentimentos; seja por via
de quaisquer dádivas sinceras e incondicionais.
Por outro lado,
também é bem claro que quem pratica o bem não tem o direito de exigir,
indefinidamente, gratidão permanente, eterna, atitudes e comportamentos de
constante subserviência à pessoa que exerceu atos de ajuda, de apoios diversos.
Quem tem atitudes boas, de generosidade e dádiva, fá-lo sem exigir nada em
troca, mas seguramente que fica feliz quando verifica haver consideração e
estima da pessoa a quem realmente se dedicou de alguma forma.
A solidariedade,
amizade, lealdade, consideração, estima e gratidão, revelam-se em pequenos
gestos (que até poderão ser, simbolicamente, muito grandes), retribuição de
valores e sentimentos, obviamente, com total sinceridade, alegria e humildade.
Não é necessário retribuir um bem material recebido de uma pessoa, com outro
bem idêntico, de resto, o reconhecimento pela simpatia, carinho, preocupação
sobre a situação de quem nos fez bem, é a melhor prova da nossa gratidão.
Nem toda a gente é
sensível a certos valores, sentimentos e emoções. Muitas pessoas pretendem
manifestar-se com uma alegada racionalidade pragmática, concretizada em
comportamentos objetivamente materializados. Criticam, destrutivamente e com
grande ironia, quem valoriza atitudes de suaves e meigas relações pessoais,
através, justamente, da: correção, boa educação, respeito, consideração e
estima.
Entendem que tais
relações, assentes em gestos e atitudes de grande amabilidade e nobreza, são
pieguices, ornamentos e, eventualmente, efeminados. Tais pessoas, talvez
prefiram relações abrutalhadas, supostamente, enérgicas nas palavras, nos
gestos e nos comportamentos porque isso será distintivo das alegadas
“personalidades” ditas “fortes”.
Quando não
recebemos gestos, manifestações, sinais que são indiciadores das pessoas que,
para além de nossas verdadeiras amigas, são profundamente gratas e, pelo
contrário, nunca, ou raramente, têm uma palavra, um gesto de simpatia e gratidão,
estamos perante pessoas que, realmente, nem sequer gostam de nós, e essa
perceção que acabamos por sentir, leva-nos a formar uma mágoa muito grande, dor
e desgosto, não obstante e porque, eventualmente, a nossa amizade é intensa e
verdadeira, é que vamos aceitando o sofrimento e continuamos a preocuparmo-nos
com a pessoa ingrata, a fazer-lhe sempre o melhor bem possível.
Hoje, mais do que
nunca, precisamos todos uns dos outros, não pode haver lugar a atitudes e
sentimentos de: ingratidão, indiferença, rejeição, humilhação; faltas de:
consideração, estima, carinho, gentileza, educação e amabilidade, para com quem
nos faz bem, para com quem está sempre, e incondicionalmente, do nosso lado,
para com quem indubitavelmente nos ama, com um profundo “Amor-de-Amigo”,
Hoje, poderemos
estar muito bem na vida, pensar que, ainda assim, temos amigos, que continuam a
fazer bem, mesmo que seja apenas através de boas atitudes e ações, valores
imateriais e sentimentos sinceros, todavia, num futuro mais ou menos próximo
será possível não estarmos tão bem na vida e, apesar disso, aquele amigo
continua fiel, solidário, atencioso, delicado e meigo, sempre preocupado com o
nosso bem-estar.
A um amigo destes
só se pode “pagar” com tudo o que nos for possível, não no sentido da
obrigação, de termos que retribuir os bens recebidos, mas com o dever da
humildade que toda a gratidão comporta. Se assim procedermos, também
receberemos muito mais do que o que damos, porque passamos a receber mais
alegria, satisfação e felicidade, porque na verdade teremos um verdadeiro amigo
que: tanto recebe, como retribui, com sincera amizade.
Hoje, apesar de
todos precisarmos de todos, a verdade é que teremos de saber escolher muito bem
os nossos amigos, a partir das qualidades humanas que ele nos pode oferecer, os
princípios que professa, os valores que pratica, os sentimentos que vai
revelando e as emoções que a nós nos confia. Hoje precisamos de um amigo com
quem partilhar tudo da nossa vida, que nos compreenda e esteja
incondicionalmente do nosso lado, se preciso for, que esse amigo nos defenda,
eventualmente contra aqueles que se dizem amigos, apenas em certas
circunstâncias. Por isso é que cada vez é mais difícil, e raro, termos amigos
com tais nobres caraterísticas e graus de exigência tão elevados.
Como é da sabedoria
popular: “Os amigos verdadeiros, do coração”, são: aqueles que nos visitam no
hospital e nos acompanham carinhosamente na doença, dando-nos coragem para
enfrentarmos a falta de saúde; aqueles que no infortúnio da vida nos aparecem
na cadeia, sem vergonha, compreendendo os atos que levaram a esta situação;
aqueles que nas dificuldades da vida: pessoais, familiares, profissionais,
económicas e outras, nos apoiam incondicionalmente com tudo o que têm e podem,
para que nada nos falte e nos sintamos confortáveis; aqueles que estão sempre
do nosso lado, que em quaisquer circunstâncias dão a “cara” por nós, sem medo, nem
vergonha, que intercedem por nós, para o nosso bem; finalmente, são aqueles
que, se necessário, afastam-se de “supostos amigos” quando se sabe que estes, afinal,
não respeitam, nem têm qualquer consideração pelos nossos amigos
incondicionais, porque quem não é amigo do meu sincero amigo, não pode ser meu
amigo verdadeiro. Será possível termos amigos destes?
Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
Blog
Pessoal: http://diamantinobartolo.blogspot.com
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