Os avanços científicos e tecnológicos são dois vetores fundamentais para o progresso e bem-estar das pessoas e da humanidade, e quanto mais forem acompanhados pelo pensamento reflexivo e profundo, melhores serão os resultados. O ser humano, em parte, continua um mistério, na vida e na morte e esta é a convicção da maioria das pessoas, em todo o mundo religioso.
E se a ciência e a tecnologia não devem
intrometer-se nesta dimensão, algo misteriosa, também a fé e a religião não
terão condições materiais para colocar em dúvida os resultados a que aquelas
vão chegando. A alternativa consiste numa de duas soluções: complementaridade
ou divergência.
Optar pela primeira alternativa – complementaridade
– afigura-se a mais correta, sem prejuízo por outras opiniões, mais
fundamentadas, como é óbvio. De resto, o ser humano não é só dimensão
religiosa, nem dimensão corpórea, e nesta incluídos os aspetos técnicos e
científicos, é tudo isto e muito mais, ainda que em momentos e contextos
diferentes.
Desvalorizar uma das muitas dimensões do homem
significa amputar-lhe um pouco da sua cultura, que constitui, afinal, toda a
sua riqueza e diferença em relação ao resto da natureza existente, e conhecida
na terra. Dificilmente se poderá imaginar o homem inculto, seja na perspectiva
antropológica, seja no conceito elitista, porque pelo menos uma daquelas
culturas será possível detetá-la. Evidentemente que a dimensão cultural é,
apenas, uma entre diversas outras, igualmente importantes.
A vida humana só faz sentido quando vivida em todas
as suas dimensões ou, pelo menos, com mais intensidade numa delas, todavia, o
ser humano poderá tentar melhorar o seu desempenho, mais numas do que noutras,
sendo, todavia, certo que dificilmente, alcançará a perfeição.
Na verdade, todas as dimensões humanas acabam por
identificar e distinguir o ser humano, dos restantes seres da natureza e,
seguramente, o homem, tem plena consciência do poder que a cultura lhe confere,
desde logo em toda a sua pessoalidade.
Com efeito: «Tornar-se
pessoa não é meramente integrar-se às pautas de conduta e de valores
predominantes, assumindo a responsabilidade, deveres e direitos que se
reconhecem às pessoas (não a todos os indivíduos); é também ter consciência da
sua singularidade enquanto sujeito e agente de sua vida. Outro tanto acontece
com a individuação. Tornar-se indivíduo é algo mais que saber-se único e
intransferível; é também reconhecer-se no outro como ente semelhante na
diferença. O indivíduo é consciente de sua diferença na sua semelhança com os
outros. » (ROMERO, 1998:73).
Será, portanto, nesta cultura de
interdisciplinaridade, de conjugação das várias dimensões, que uma sociedade
mais compreensiva poderá desenvolver-se, justamente a partir do homem cultural,
com todos os seus valores, presentes e passados, adaptando aqueles a um novo
tempo, mantendo outros e, se possível, reforçando-os. O caminho para se
instaurar uma cultura para a vida não será fácil, e se o seu início poderá ser
apontado, logo na família, o seu fim talvez não se vislumbre, porquanto ele
poderá entender-se como uma herança que passa de geração em geração.
A pessoa, culturalmente interessada numa sociedade
melhor, certamente, terá de abdicar de algumas práticas e pensamentos que,
eventualmente, não se ajustam a estes tempos modernos, onde todos clamam por
melhores condições de vida, mas poucos contribuem para tal objetivo,
principalmente aqueles que teriam todos os recursos e capacidades intelectuais
e, elitistamente, culturais para o fazer.
Significa isto que, uma cultura para a vida constrói-se
de cima para baixo, de quem governa para quem é governado, seja qual for o
setor dessa governação, porque investindo-se na educação, na formação e na
cultura, os governados conseguem adquirir hábitos que os conduzem a melhores
situações de vida.
Claro que aqui surge esta dificuldade: muitas vezes
quem governa, também não está culturalmente preparado para governar e,
inevitavelmente, as condutas menos boas, partem, justamente, de tais pessoas.
Entra-se, então, num círculo vicioso, que é necessário romper com ele. Como?
Sensibilizando todas as pessoas de boa-vontade, independentemente da idade,
estatuto e poder, para desencadearem o projeto cultural, que conduzirá à
elaboração de boas-práticas, e a objetivos consentâneos com uma sociedade
civilizada: da mais pequena aldeia ou bairro à maior cidade ou área
metropolitana. Na sua origem, devem intervir as famílias, a Igreja e as
Escolas, pelo menos.
Institucionalizar: numa sociedade em particular; e
no mundo em geral, uma cultura para uma vida digna, de respeito, tolerância e
entreajuda entre os cidadãos é um projeto que se reconhece extremamente
ambicioso e, eventualmente, utópico, tanto mais difícil de concretizar, quanto
menos a sociedade estiver preparada, todavia, as dificuldades não devem
constituir obstáculo para a desistência.
O homem continua a ter uma imensidão de
potencialidades, que é necessário explorá-las e passá-las a atos concretos. A
intolerância só tem conduzido à explosão da violência em todo o mundo, com
consequências dramáticas para as populações inocentes, sofrimento atroz para
crianças, idosos, mulheres e pessoas indefesas.
O homem não se tem revelado em todo o seu
esplendor, ainda que se considerem os grandes avanços científicos e técnicos,
porque os conflitos, a guerra, a exclusão e a fome continuam presentes em todo
o mundo. Então deve-se perguntar: que cultura pode a humanidade esperar para a
sua vida?
A esperança, enquanto atitude positiva de
perspectiva futura, deverá acompanhar cada pessoa, cada grupo, cada comunidade
e a sociedade global, portanto importa acreditar num mundo melhor, apostando na
valorização das pessoas, pelos valores culturais. É com um pensamento otimista
que melhor se poderá construir um futuro mais justo, uma sociedade que,
verdadeiramente, respeite a dignidade humana.
Acreditar numa vida humana diferente, para muito
melhor, daquela que milhões de pessoas continuam a ter, é um imperativo que se
exige, justamente pela preparação cultural, nas suas diversas vertentes.
Certamente que haverá outras soluções, igualmente viáveis e, provavelmente, com
a previsão de melhores resultados, todavia, o princípio do qual se deve partir
poderá ser o mesmo.
Na verdade: «A
vida humana se distingue da dos animais e dos outros seres viventes pelos
níveis espirituais que atinge e pelas dimensões sociais que alcança: por isso
se pode falar em vida espiritual, vida intelectual, vida social, vida política,
etc. (…) Ele pode elaborar o seu próprio conceito de vida perfeita e é por essa
vida que ele sente um fascínio ardente. O homem é dono da própria vida, pode em
larga escala controlá-la, dirigi-la, aperfeiçoá-la. » (MONDIN, 1980:60).
Uma cultura
para a vida verdadeiramente digna passa, indiscutivelmente, pela luta por um
aperfeiçoamento constante, em todas as dimensões que são específicas do ser
humano, onde todas as pessoas se saibam respeitar, compreender e ajudar. Passa
por uma educação bem precoce, no seio das instituições com mais influência na
vida de cada um – família, Igreja, escola, coletividade, empresa, comunicação
social, entre outras -, pese, embora, a circunstância de se verificar, em
certos meios e mentalidades, alguma desvalorização daquelas instituições,
concretamente, das famílias.
Bibliografia
MONDIN, Battista, (1980). O Homem quem é ele? Elementos
de Antropologia Filosófica, Tradução, R. Leal Ferreira e M. A. S. Ferrari; revisão
de Danilo Morales, 3ª Edição, São Paulo: Edições Paulinas. (Coleção Filosofia 1)
ROMERO, Emílio, (1998). As Dimensões da Vida
Humana: Existência e Experiência, São José dos Campos: Novos Horizontes
Editora.
“NÃO,
ao ímpeto das armas; SIM, ao diálogo criativo/construtivo. Caminho para a PAZ”
https://m.facebook.com/story.php?story_fbid=924397914665568&id=462386200866744
Venade/Caminha – Portugal, 2023
Com o protesto da minha permanente
GRATIDÃO
Diamantino Lourenço Rodrigues de
Bártolo
Presidente do Núcleo Académico de
Letras e Artes de Portugal
http://nalap.org/Directoria.aspx
http://diamantinobartolo.blogspot.com
Sem comentários:
Enviar um comentário