No âmbito do contexto humanista, pode-se afirmar
que, de entre os mais diversificados e até contraditórios sentimentos, que
caraterizam toda a pessoa humana, o amor é, porventura, aquele que mais
desejamos receber e oferecer. Pelo exercício claro e incondicional dos
sentimentos, nos elevamos ao mais alto nível da dignidade humana, ou
submergimos nas profundezas da depravação,
sordidez, enfim, crueldade.
De uma forma muito genérica, sabemos que a força
dos sentimentos vence os mais complexos e difíceis obstáculos, e contribui para
a união das pessoas, aliás: «A conexão
entre as pessoas só é plenamente exercida quando a intimidade é vivida pela
expressão clara dos sentimentos. Elas não eram capazes de experimentar a
intimidade sem uma maior clareza no coração.» (BAKER, 2005:130).
Num mundo “apressado” em que nos movimentamos
aceleradamente, nem sempre temos tempo para valorizar os nossos sentimentos
mais nobres, pelo contrário e, infelizmente, por vezes, preocupamo-nos em como
colocar em prática os mais mesquinhos, no sentido de prejudicarmos alguém, por
uma qualquer “razão” e/ou objetivo: humilhação, vingança, perseguição. É nestas
circunstâncias que o ódio toma conta do nosso comportamento, com consequências
frequentemente imprevisíveis e irreparáveis.
É, portanto, num labirinto de sentimentos, dos mais
belos aos mais hediondos que surge o Amor, seja qual for a sua natureza e
intensidade: conjugal, fraternal, maternal, paternal, filial, “Amor-de-Amigo”,
entre outros. Amar é, por conseguinte, uma faculdade humana, de inegável
grandeza, de inigualável generosidade, de total entrega à pessoa que amamos e
que, quando nos retribui este amor tão puro, quanto incondicional, nos leva a
um determinado prazer que afinal é a felicidade de sermos amados.
Sabemos bem que: «A felicidade não acontece automaticamente, não é uma graça que um
feliz sortilégio possa espalhar sobre nós e que um revés da fortuna nos possa
tirar; depende só de nós. Não nos tornamos felizes numa noite, mas à custa de
um trabalho paciente, elaborado dia-a-dia. A felicidade constrói-se, o que
exige trabalho e tempo. Para ser feliz, o próprio indivíduo precisa de saber
mudar.» (LUCA e FRANCESCO CAVALLI-SFORZA, in RICARD, 2003:9).
De igual forma, amar alguém, gostar verdadeira,
incondicional e imensamente de outra pessoa, afigurar-se-á uma tarefa que nunca
estará concluída, bem pelo contrário, exige empenhamento permanente, renovação
constante, ultrapassar situações de aparente conforto, para resolver conflitos,
sofrer o desgosto de nem sempre sermos correspondidos, ainda que acalentando a
esperança de que um dia, finalmente, venhamos a ser recompensados pela
retribuição da pessoa que sempre amamos.
O sentimento do amor, para quem o possui, revela-se
a mais poderosa “arma” para vencer muitos obstáculos que a vida nos coloca
neste mundo, porque na verdade: «Viemos
cá para estarmos em comunhão, para aprendermos sobre o amor com outros seres
humanos que estão no mesmo caminho que nós, que aprendem as mesmas lições. O
amor não é um processo intelectual. É sim uma energia dinâmica que entra em nós
e flui todo o tempo através de nós, estejamos nós conscientes desse facto ou
não. O fundamental é aprendermos a receber amor, assim como a dá-lo. Só podemos
compreender a energia envolvente do amor na comunhão com os outros, nas
relações, no serviço.» (BRIAN, 2000:64).
Por vezes, experienciamos na vida situações que nos
marcam, indelevelmente, para todo o sempre, que até nos provocam receios,
pânico e escapatórias para a frente, como que fugindo de um passado que não
queremos recordar e, muito menos repetir, provocando-nos bloqueios de diversa
ordem.
É muito natural que um amor intenso, uma relação
extremamente apaixonada, um “impulso” afetuoso, que terminam abruptamente: ou
por causas que ofendem os nossos princípios, valores, sentimentos, e emoções;
ou por mero capricho de uma das partes; ou, ainda, por imponderáveis da
natureza e da vida, nos provoque uma mágoa excessiva, um desgosto profundo e
uma atitude de desconfiança para o futuro, que realmente nos impede de
tentarmos uma outra oportunidade para sermos felizes, através de um novo amor.
Qualquer pessoa que venha de uma situação desta
natureza, obviamente, quando procura a felicidade, através de uma nova relação,
ou da renovação da afinidade que fracassou, os cuidados a ter serão redobrados,
principalmente, por quem se aproxima da pessoa sofrida, ou então por ela mesma,
quando é causadora do seu próprio sofrimento e/ou vítima da que lhe deu origem.
É aqui que uma e outra devem pronunciar a palavra “Amo-te”, se realmente já
estão conscientes que estão a experienciar este digno sentimento.
Compreender, demonstrar e vivenciar certos
sentimentos é quase sempre muito difícil, considerando que a constituição
biofísica e espiritual da pessoa humana é extremamente complexa, que escapa às
mais elementares regras de quaisquer ciências exatas e tecnologias mais
avançadas, por isso, e muito embora se espere de certas pessoas alguma
previsibilidade, em determinadas circunstâncias, o que acontece com mais
frequência é, precisamente, alguma instabilidade, insegurança, medos, também
atitudes de coragem, esperança e decisões: umas vezes certas; outras erradas. A
Vida faz-se assim mesmo.
Amar alguém é diferente de gostar, porque o amor,
quando autêntico, incondicional, para a vida, implica uma inequívoca
exclusividade, dedicada à pessoa que se ama, abnegação, sofrimento, desgosto,
como também solidariedade, alegria, lealdade, entusiasmo, proteção, confiança,
cumplicidade, companheirismo, gratidão e felicidade.
Em boa verdade: «A
pessoa que sabe vivenciar e exercitar o amor com todos os contornos salutares,
dessa inquestionável energia tonificante, transbordando paz, exercitando com
desprendimento o carinho, entendendo com compreensão humilde os homens para
saber perdoar as suas fraquezas e falhas, é evidente que jamais deixará escapar
de suas mãos o sabor extraordinário que lhe oferece a experiência da
felicidade.» (FRANCESCHINI, 1996:167-8).
Gostar incondicionalmente de uma pessoa
significará: manifestar-lhe atitudes de elevada consideração, carinho,
respeito; demonstrar-lhe solidariedade quando entender conveniente; ajudá-la,
sempre que necessário, em tudo o que for possível e para tal existam recursos
adequados; conviver com ela, partilhar princípios, valores, alguns sentimentos
e emoções.
Amar uma pessoa é um sentimento bem diferente do
gostar. O amor, quando autenticamente sentido e vivido, implica, desde logo:
entrega total, apaixonada, amorosa; com uma intensidade, por vezes,
incontrolável; os atos que lhe estão subjacentes envolvem uma intimidade
inigualável, tal como: o olhar afetuoso, o beijo na boca; os desvelos
carinhosos nas mais diversas partes do corpo e, finalmente, a relação sexual
amorosa. É uma dádiva sem condições.
Ao abordarmos o amor no contexto matrimonial, então
aqui deve-se procurar atingir a plenitude, em todas as dimensões relacionais,
que ao casal lhe estão reservadas, que são incentivadas por esse sentimento tão
nobre e altruísta como é o amor, por isso, a partilha em tudo e de tudo, na
vida do casal deve ser a regra de oiro, sem o que, muito rapidamente, as
condições para um casamento e/ou união de facto, de singular felicidade, passa
a ser uma utopia.
O amor no qual se deve sustentar uma união, não
concede qualquer supremacia de um, em relação ao outro membro do casal, porque
ambos devem estar vinculados por aquele sentimento, independentemente do modo
como o exteriorizam e exercitam. A reciprocidade deve existir sempre, seja qual
for a natureza do relacionamento: matrimónios, namorados ou simplesmente
amigos, neste caso, no “Amor-de-Amigo”.
Concorda-se, defende-se e assume-se aqui que: «A mulher não é escrava do homem, sem
direitos nem privilégios (…) nem tão pouco um brinquedo para preencher as horas
livres do homem (…). Por mais que o homem se empenhe em afundá-la até às raízes
e a converta numa mulher da rua, sem categoria humana, ninguém nem coisa alguma
a derrubará do pedestal de “mãe”. (…) A mulher não é um objeto de comodidade
material do homem (…). É companheira com os mesmos direitos e as mesmas
obrigações.» (GUERRERO, 1971:99).
Inegavelmente, o que acima se transcreve para a
mulher, também vale, pela inversa, para homem, apenas se substituindo o género
e a palavra “mãe” pelo vocábulo “pai”. Homem e mulher, quando verdadeiramente
se amam, são um só corpo, uma só alma, com um só destino, caminho comum aos
dois.
O amor, quando verdadeiramente existe, não
discrimina os géneros, homem e mulher têm, obviamente, deveres e direitos
idênticos, de resto o rumo a seguir, para o Porto Seguro da Felicidade, também,
algumas vezes do Sofrimento, estabelece reciprocidade, partilha, coesão,
tolerância e perdão, porque não existem pessoas perfeitas, que ao longo da vida
não tenham cometido erros, que não guardem um ou outro segredo: muito pessoal,
muito íntimo, que não desejam divulgar nem dividir com mais ninguém, seja por
vergonha, por receio a uma eventual censura ou até por temor de perder uma
pessoa amada.
A vida quotidiana, nos tempos conturbados que
correm, não é nada fácil. Muitas são as contrariedades que, ao longo de um dia
de trabalho, nos surgem (para quem tem a sorte de ter um emprego) e que no
final da jornada laboral nos deixam exaustos, quase sem disposição para mais
nada, a não ser a vontade de descansar, física e mentalmente, compreendendo-se,
por isso mesmo, que um ou outro conflito possa surgir no seio do casal, mesmo
amando-se, porque amor também é sofrimento e, acreditem, como dói enfrentar
tais situações.
Quando não se ama, não se sofre com as situações
mais difíceis. Tais pessoas “passam ao
lado”, porque não amam incondicionalmente, preferem satisfazer os seus
egoísmos, fugir das suas responsabilidades, partindo para as diversões,
encontros com os “amigos da borga”, prazeres extraconjugais, adultérios,
traições e humilhações para com aquela pessoa que verdadeiramente nos ama e
merece, no mínimo, respeito.
É claro que, como diz o povo: “não se manda no coração”, por vezes pode acontecer que, em pessoas
mais vulneráveis, mais sentimentais, elas sejam demasiado sensíveis e agarrarem-se
a amizades, que depois se transformam num amor sincero, incondicional, sem
limites, não obstante saberem que não será correto, se outros compromissos já
existirem. Mas estas situações, fazem parte das fragilidades do ser humano e as
pessoas envolvidas certamente tudo farão para as corrigir.
Inequivocamente que o amor é, hoje em dia, a
solução para muitos conflitos. Ele tem de existir com cedências, com
compreensão, com tolerância, com perdão, quando e sempre que necessário,
porque: «Alguém precisa de nos encorajar
a não pormos de lado aquilo que sentimos, a não termos medo do Amor e do
sofrimento que ele gera em nós, a não termos medo da dor. Alguém precisa de nos
encorajar para o facto de esse ponto macio em nós poder ser desperto e, ao
fazermos isso, estaremos a alterar as nossas vidas.» (CHODRON, 2007:117).
Lutemos, então, para aumentar, engrandecer,
preservar e consolidar o amor que sentimos pela pessoa que amamos
incondicionalmente, para que ela, por sua vez, também nos retribua com este
maravilhoso sentimento. Saibamos ser generosos, humildes e amantes.
Esforcemo-nos por conservar a amizade da/s pessoa/s
que sabemos ser/em verdadeiramente nossa/s amiga/s e rejeitemos toda/s a/s
aquela/s com a/s qual/ais não nos deveremos identificar, porque o/s seu/s
comportamento/s, atitude/s é/são incompatível/eis com os nossos princípios,
valores, sentimentos, emoções, reputação, dignidade e que, em certas
circunstâncias, até prejudicam a nossa relação com outras pessoas amigas e, no
limite com a pessoa que amamos.
Escolher as companhias, as amizades, os interesses,
os projetos que desejamos, que possam vir a contribuir para a nossa felicidade,
em partilha com a pessoa que amamos e também com mais algumas, poucas, muito
poucas, pessoas, que nos são autenticamente amigas, será sempre a grande
orientação que deveremos ter na vida, porque o Amor e a Amizade, quando
incondicionais, são sentimentos que nos proporcionam: alegria, prazer,
serenidade, confiança e felicidade; mas também tristeza e sofrimento dolorosos,
quando não retribuídos. Mas vale a pena AMAR.
Bibliografia
BAKER, Mark W., (2005). Jesus o Maior Psicólogo que já
Existiu.Trad. Cláudia Gerpe Duarte. Rio de Janeiro: Sextante.
BRIAN L. Weiss, M.D. (2000). A Divina Sabedoria dos Mestres.
Um Guia para a Felicidade, alegria e Paz Interior. Trad. António Reca de Sousa.
Cascais: Pergaminho.
FRANCESCHINI,
Válter, (1996). Os Caminhos do Sucesso. 2ª Edição, Revista e Ampliada. São
Paulo: Scortecci.
GUERRERO, José Maria, (1971). O Matrimónio Hoje, à
Luz do Vaticano II, Trad. José Luís Mesquita, Braga: Editorial Franciscana.
RICARD, Matthieu,
(2005). Em Defesa da Felicidade. Trad. Ana Moura. Cascais: Editora Pergaminho,
Ldª.
Diamantino
Lourenço Rodrigues de Bártolo
Blog
Pessoal: http://diamantinobartolo.blogspot.com
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