É normal, desejável e aconselhável que qualquer
pessoa, ao longo da sua vida: se esforce por construir a sua própria imagem, a
sua personalidade, o seu caráter; que adote e pratique princípios e valores;
que não se envergonhe de exteriorizar os seus sentimentos e emoções, mesmo que
outras pessoas pensem que tudo isto são sinais de fraqueza, lamechices,
designadamente quando existentes num homem que, ainda segundo certas
mentalidades, deve transmitir e revelar comportamentos ditos e tidos por
virilidade, coragem, força, superioridade e outras adjetivações próprias,
também, de um certo culto masculino de forte personalidade, assim considerada
quando reúne aqueles qualificativos.
Quando se reflete sobre princípios, valores,
sentimentos e emoções, gestos, atitudes, comportamentos, e se pretende
adotá-los para construir uma identidade cívico-profissional e ético-moral,
entre outras dimensões da constituição da pessoa verdadeiramente credível e
respeitável, pensa-se numa perspectiva civilizacional moderna, irredutivelmente
humanista, em ordem ao bem-público e, legitimamente, em benefício próprio e de
todo um agregado familiar e coletivo.
É claro, e
ninguém prova o contrário, por nenhum recurso técnico-científico,
político-religioso, ético-moral e sócio-profissional que é totalmente perfeito
ou, que é o que parece e vice-versa, por muito boas que sejam as opiniões
públicas e/ou a opinião publicada a nosso respeito, porque durante a vida
aprende-se que, por circunstâncias diversas, em muitos casos incontroláveis,
alteramos, conscientemente, a nossa própria imagem, embora tal modificação não
seja percetível à análise de qualquer pessoa.
No decurso da nossa existência, de facto vamos
construindo uma imagem que vai sendo aceite, valorizada, credibilizada,
apontada, quantas vezes, como exemplo a seguir. Conquistam-se amizades, a boa
reputação vai-se consolidando, as pessoas confiam cada vez mais e até,
eventualmente, nos convidam para determinadas funções que aceitamos, ou não.
Daqui podem nascer, presumivelmente, pelo menos,
duas novas identidades, que até podem ser mitigadas por uma terceira: ou nos
tornamos vaidosos, egocêntricos, arrogantes, prepotentes e insensíveis perante
situações sociais, dificuldades diversas que as pessoas, algumas das quais até
seriam nossas amigas, e começamos a agir como se de repente o mundo tivesse de
girar à nossa volta, convencidos de que somos os melhores do planeta; ou então
adotamos comportamentos de humildade, que por vezes até se configuram como
próximos da auto-desvalorização, baixa auto-estima, rejeitando honrarias,
benefícios e convites aliciantes, ainda que, possivelmente, rentáveis do ponto
de vista material e no contexto de uma sociedade complexa, nem sempre justa,
frequentemente inverdadeira. Acredita-se que é possível o meio-termo.
É muito provável que uma forte imagem de dignidade
impoluta, de credibilidade irrefutável, de sociabilidade agradável, de
competências diversas reconhecidas, construídas ao longo de décadas venham a
ser alteradas, precisamente porque este SAL da vida, cuja sigla significa:
Solidariedade, Amizade e Lealdade, seja perturbado e nos leve a cometer atos
contrários à auréola que nos tem envolvido, e nos colocava no pedestal dos
insuspeitos, do que quer que seja de criticável e até de condenável.
Com efeito, pode acontecer que para mantermos
certos princípios, valores, sentimentos e emoções, perante uma dada situação,
pessoa, grupo ou instituição, optemos por comportamentos incorretos, para com
outras pessoas, sempre que estas atentam, precisamente, contra a dignidade,
honra, reputação, bom-nome e profissionalismo de nós próprios, dos nossos
amigos, grupos e instituições, porque nós sentimos e exercemos, naturalmente,
solidariedade, amizade, lealdade (o tal SAL da vida), bons e nobres sentimentos.
Em tais circunstâncias a imagem credível, da boa
exemplaridade, de nobres valores, de excelentes colegas em quaisquer
atividades, acaba por ser prejudicada e, paradoxalmente, até com notória
ingratidão, pelas opiniões das pessoas, grupos e instituições, em relação aos
quais nós nos vinculamos solidariamente. Ou seja: para que os princípios,
valores, sentimentos e emoções sejam verdadeiros, em relação a uma dada pessoa,
grupo ou instituição, deixamos de ter o mesmo comportamento para com as pessoas
que de alguma forma molestam ou prejudicaram aquelas com quem nos
solidarizamos.
Novamente resultam, pelo menos duas posições: ou
continuamos fiéis para com as pessoas, grupos e instituições, com quem nos
solidarizamos e afastamo-nos de todas as outras que lesaram, ou são hipócritas
para com os nossos amigos, grupos e instituições e assumimos as consequências;
ou então fazemos um jogo duplo com todo o mundo, traindo, simultaneamente,
todas as pessoas que sobre nós formularam e divulgaram uma opinião positiva.
Por vezes, o “preço” a pagar pelo exercício de
determinados valores, pela dádiva generosa de sentimentos, pela demonstração
permanente e humilde de algumas emoções, é muito alto porque: as pessoas,
grupos e instituições, com quem nos solidarizamos e apoiamos,
incondicionalmente, incompatibilizando-nos com outras, acabam por nos
abandonar, a tal ponto de: por um lado, nem sequer quererem saber da nossa
situação, ao nível da saúde, trabalho, família, projetos e situação financeira;
por outro lado, a nossa própria consciência, acaba por nos julgar, por vezes
com assertivas e máximas bem justas e acertadas.
Coloca-se então a questão: teria valido a pena
indispormo-nos contra determinadas pessoas, grupos e instituições, para
mantermos a nossa solidariedade, amizade, lealdade e sentimentos com outras,
verificando-se, depois, que estas, quando julgam que já não precisam de nós,
nos afastam e nos trocam e/ou se mantêm ligadas e, eventualmente, interagindo,
paradoxalmente, ou não, com as que estiveram na origem das nossas tomadas de
posição, justamente para mantermos a consideração, a estima e o respeito por
elas?
Afigura-se, cada vez com mais evidência, que é
difícil desenhar-se uma personalidade de exemplaridade positiva, de bons
princípios, valores, sentimentos e emoções, isto por vários motivos: primeiro,
todos nós somos extremamente vulneráveis a situações que não controlamos, seja
no âmbito racional, seja no quadro emocional; segundo, porque nos enganamos,
frequentemente, em relação a quem demos todo o SAL da nossa vida –
Solidariedade, Amizade e Lealdade – da nossa própria imagem, construída,
quantas vezes, ao longo de uma vida; terceiro, porque com muita facilidade
certos interesses, situações e pessoas conseguem influenciar, contra nós,
aqueles por quem tudo demos, a quem tudo confiamos e que, pensando eles que
somos humildes, aparentemente fracos, que não temos nenhum tipo de influências
sócio-materiais, já não servimos para mais nada, passam-nos, então, para o
grupo dos indesejáveis, descartáveis.
Quando alguém é contemplado com avaliações
positivas, gerais e/ou específicas, isso não quer dizer que a pessoa
beneficiária de tal apreciação seja perfeita, que não tenha cometido erros, que
seja inatacável. As opiniões favoráveis até podem ser amplamente consensuais,
mas haverá sempre alguém que sabe, eventualmente, que aquela pessoa tem falhas,
seja na família, nas amizades, no trabalho, nos estudos, na sociedade, mas
também poderá ser verdade que tais falhas e erros se ficam a dever, justamente,
ao preço do tal SAL – Solidariedade, Amizade e Lealdade – que essa mesma pessoa
sabe que foi por causa dela, que a primeira cometeu erros, porque de resto, a
pessoa aureolada com uma boa imagem pessoal, pública ou privada é merecedora
deste prestígio.
Se pensarmos o seguinte: Se uma determinada pessoa
é muito querida na sociedade, no seu círculo de amigos, de colegas de trabalho
e na família, é porque ela tem manifestado e exercido princípios, valores,
sentimentos e emoções que justificam o seu prestígio, mas eu sei que por minha
causa, tal pessoa traiu parte do seu comportamento cordial para com outras
pessoas, para poder estar sempre do meu lado, solidária, amiga, leal, então eu
devo expressar-lhe, em quaisquer circunstâncias e tempos da vida, amizade,
consideração, estima e iguais valores, bem como a minha ilimitada gratidão.
Quando assim não acontece e alguém nos quer mal e
conhece esta nossa fragilidade, de facto pode destruir uma imagem de respeito,
credibilidade, honorabilidade, reputação, bom-nome e dignidade. Então é este o
“preço” elevadíssimo que se paga quando somos solidários, amigos
incondicionais, leais e cúmplices, aqui no bom sentido, mesmo que tenhamos de
violar comportamentos gerais e alterar uma excelente personalidade que fomos
construindo ao longo da vida, precisamente para estarmos sempre do mesmo lado,
na circunstância, da mesma pessoa, grupo ou instituição.
Como corolário, talvez se possa admitir que:
primeiro, somos merecedores de apreciações positivas, apesar da imperfeição de
que estamos “inquinados”, da subjetividade de quem as produz e da
inacessibilidade à verdade por parte da opinião pública geral; segundo, porque
ao tomarmos uma posição solidária, de amizade e lealdade para com alguém, não
temos condições objetivas para igual procedimento para com quem é prejudicial à
pessoa que nós defendemos (não se pode estar ao mesmo tempo com o amigo e o
inimigo do meu amigo); terceiro, somos o que em dado momento as circunstâncias
da vida nos impõem, porque em situações-limite temos de decidir, e nenhuma tomada
de posição agrada a “gregos e troianos”, quando uma das partes não se
identifica com os fundamentos da decisão.
Ignorar que há sempre alguém que conhece factos,
sentimentos, atitudes, erros, ilegalidades e situações diversas, ocorridos em
nossas vidas, que não abonam favoravelmente a nosso favor, é uma imprudência e
revela alguma ingenuidade, ou então um excesso de aparente firmeza, que só tem
paralelo nos comportamentos arrogantes e mesquinhos.
Como muito bem refere a sabedoria popular: “toda a gente tem, pelo menos, uma telha de
vidro no seu telhado”. Significa, portanto que todos temos algo a esconder,
todos temos um ou mais segredos, e que sempre haverá alguém que conhece um
bocadinho das nossas vidas. Então sejamos cuidadosos, humildes e tolerantes
quando estamos a fazer juízos de valor.
É verdade que este SAL - Solidariedade, Amizade,
Lealdade -, se “paga”: pela positiva, com a reciprocidade e gratidão, por quem
dele é beneficiário; pela negativa, por quem dele se sente prejudicado e não
tem a capacidade de separar as diversas situações, retribuindo com valores
negativos, como: a injúria, a difamação, a ofensa, a vingança, a perseguição,
quantas vezes até à destruição da personalidade e da própria vida, de quem não
abdica de ser solidário, amigo e leal, de quem faz deste SAL, um ideal e uma
orientação de vida.
Como diria Jesus: “Este é o Caminho, a Verdade e a Luz”, isto é, sermos compreensivos,
tolerantes, abertos ao nosso próximo, ao mundo e a Deus é o procedimento justo,
todavia sem abdicarmos dos nossos princípios, valores, sentimentos, honra,
bom-nome e dignidade e, quem nos quer bem, quem é verdadeiramente nosso amigo,
aceita e retribui esta nossa posição, com amizade, carinho e respeito e até nos
ajuda neste rumo de nobreza.
Diamantino
Lourenço Rodrigues de Bártolo
Blog
Pessoal: http://diamantinobartolo.blogspot.com
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