domingo, 9 de novembro de 2014

Liderança Democrático-Humanista


O mundo do trabalho revela-se cada vez mais exigente, seja em contexto profissional, seja no âmbito associativo-amador, porque para além do exercício dos respetivos cargos, ocupados nos diversos níveis da cadeia hierárquica, a realização das tarefas que cabem a cada trabalhador e/ou colaborador institucional, devem, igualmente, ser desempenhadas com rigor, qualidade e competitividade. A tudo isto acresce a responsabilidade de prestar contas às entidades competentes, sejam estas Departamentos oficiais do Estado, sejam acionistas, sejam sócios da respetiva associação, sejam clientes.
Todo o trabalho deve ser exercido com profissionalismo, com ética, com respeito pelos direitos dos trabalhadores/colaboradores, também com exigência do cumprimento dos seus deveres, naturalmente com um sentido humanista, com tolerância e compreensão por erros involuntários, que devem ser corrigidos com metodologias pedagógicas, jamais pela repressão, pela punição sem argumentos graves, provados e irrefutáveis. É muito importante que se saiba fazer uma análise correta das funções desenvolvidas pelo funcionário/trabalhador/colaborador.
Exigir, por exemplo, a execução de funções sem que seja dada formação teórica e prática adequadas, ainda que seja para cargos em que é suposto os responsáveis, quando são admitidos, possuírem as respetivas qualificações, não serão uma política de trabalho e progressão na carreira corretas. Por outro lado, cada trabalhador deve saber, exatamente, quais são as suas funções para, posteriormente ser avaliado, classificado, incentivado, reconhecido e promovido.
Tornou-se, portanto, necessário interiorizar que a: «Análise de funções consiste num processo estruturado e sistemático de recolha e organização sobre as tarefas e operações que uma pessoa ou um grupo devem realizar no âmbito do seu trabalho. (...) A análise de funções ocorre como um processo relativamente organizado, sistemático e estruturado, cujo produto final é igualmente o de conhecer a função e o trabalho.» (CUNHA, et. al., 2010:142-3).
Adotando-se aquele conceito, caberá, então, à entidade empregadora, ou associação, organizar o processo referente à elencagem de funções para cada colaborador, tendo em vista o público-alvo a servir, os resultados a alcançar os meios necessários para a realização das respetivas funções, os instrumentos e acompanhamento, avaliação, correção, atualização, reavaliação e assim sucessivamente, intercalando, periodicamente, as formações em ordem à melhoria contínua do empregado e à satisfação do cliente.
É injusto, ilegítimo e, eventualmente, ilegal despedir um colaborador, sem que primeiro se lhe tenham dado as oportunidades necessárias par se sentir motivado, frequentar as ações de formação adequadas às suas funções específicas e, sempre que conveniente, para uma certa polivalência, bem como ao nível de conhecimentos teóricos e boas práticas, nos domínios da ética e deontologia profissionais, relacionamento interpessoal, gestão do tempo, liderança e motivação de equipas, entre muitas outras formações, de curta duração.
Qualquer líder, dirigente, minimamente responsável por um determinado setor de uma empresa, instituição, serviço público ou associação, não pode, em circunstância alguma, descurar a condição verdadeiramente humana dos colaboradores, porque as pessoas não são meros objetos, que se manipulam, coercivamente, conforme as vontades do dirigente, porque este tem a obrigação de respeitar e salvaguardar os legítimos direitos e exigir os respetivos deveres dos seus subordinados, todavia, sem represálias, sem estratégias escondidas por uma muito bem dissimulada “gentileza”, uma inofensiva mas, provavelmente, falsa candura do dirigente.
Quando se aborda a questão dos direitos dos colaboradores, destaca-se, desde logo, a formação profissional, como resulta, inclusivamente, do próprio Código de Trabalho Português: «1. No âmbito da formação contínua, o empregador deve:
a) Promover o desenvolvimento e a adequação da qualificação do trabalhador, tendo em vista melhorar a sua empregabilidade e aumentar a produtividade e a competitividade da empresa; b) Assegurar a cada trabalhador o direito individual à formação, através de um número mínimo anual de horas de formação, mediante acções desenvolvidas na empresa ou a concessão de tempo para frequência de formação por iniciativa do trabalhador; c) Organizar a formação na empresa, estruturando planos de formação anuais ou plurianuais e, relativamente a estes, assegurar o direito à informação e consulta dos trabalhadores e dos seus representantes; d) Reconhecer e valorizar a qualificação adquirida pelo trabalhador.
2 - O trabalhador tem direito, em cada ano, a um número mínimo de trinta e cinco horas de formação contínua ou, sendo contratado a termo por período igual ou superior a três meses, um número mínimo de horas proporcional à duração do contrato nesse ano.»
(LEI N.º 7/2009, de 12 de fevereiro, Artº 131º).
Por outro lado, também não se ignora que a progressão numa carreira profissional, e que entre muitas outras variáveis, uma delas prende-se com a formação contínua profissional, e esta será selecionada a partir da análise de funções porque: «Uma descrição correta das funções ajuda a estabelecer as necessidades de formação profissional dos ocupantes de cada posto de trabalho. Se for conhecido o tipo de exigências que se colocam numa função, será possível estabelecer as necessidades formativas dos seus titulares.» (CUNHA, et. al., 2010:145).
Sendo ponto assente que o ensino/educação e a formação são requisitos essenciais para que um trabalhador desempenhe, o melhor possível, as suas funções, também é verdade que o rigor, o profissionalismo, a qualidade e até a motivação tenham de ser avaliados. Para estes aspetos devem os dirigentes estar atentos e serem facilitadores, incentivadores das iniciativas, experiências e entrega dos colaboradores, ajudando-os a suprir as dificuldades, sem ameaças nem processos de despedimento. As pessoas não são objetos descartáveis que apenas servem para objetivos de realização pessoal.
Seguramente que não será aconselhável a implementação de culturas negativas nas organizações, nem estilos de liderança que promovam medidas discriminatórias, embora se tenha conhecimento de que ainda há instituições cujos líderes entendem que é a partir de uma disciplina férrea, exigências para além das capacidades humanas e caraterísticas específicas dos funcionários, que vão obter bons resultados, recorrendo, por vezes, ao desgaste psicológico, para levar os colaboradores a falhar e assim terem argumentos para os despedir, alegadamente, com justa causa e admitirem outros que lhes convém. Este é o protótipo do líder ditatorial, que até é capaz de se disfarçar em amabilidades, com intervenções e gestos brandos, até conquistar as simpatias de quem os rodeia.
Com efeito verifica-se que o: «Estilo autocrático-paternalista, a impulsividade e a emoção dominam as ações e decisões dos executivos, tanto nas cobranças como concessões, com prejuízo a uma necessária postura profissional requerida por essas funções.» (RESENDE, 2000:144), conduz a situações de uma autêntica cultura institucional negativa e injusta, transmitindo parta o exterior a pior imagem da organização e dos seus dirigentes.
E se infraestruturas, equipamentos, tecnologias e capital financeiro são fundamentais para o sucesso da instituição, obviamente que o fator humano é imprescindível e quanto melhor for a sua formação, a todos os títulos, tanto melhor será a produtividade, a qualidade, a satisfação do cliente e o prestígio da instituição.
Na verdade e infelizmente: «Cultura de valorização do fator humano: por incrível que possa parecer a quem não está habituado a conviver em ambientes empresariais, a grande maioria das organizações valoriza mais as estruturas, os equipamentos, os processos, do que as pessoas.» (Ibid.:146).
O capital humano numa instituição é, inequivocamente, o mais importante. Pode-se investir massivamente, por exemplo, em equipamentos, mas se não houver formação contínua, de pouco valem; podem-se atualizar modelos de gestão, transferir de umas instituições para outras tais arquétipos, mas se os colaboradores não forem respeitados, acarinhados, estimulados, de nada servem os modernos paradigmas organizacionais; pode-se recorrer à intimidação, ao controlo “monitorizado” por funcionários ditos “fidedignos” ao líder (espreitas), todavia, mais tarde ou mais cedo, serão desmascarados pelos seus próprios atos de prepotência, de comprovada incompetência para gerir recursos humanos.
O desenvolvimento organizacional está a alterar-se rapidamente com a preocupação de centrar no colaborador a maior parte das expectativas, e no qual se sabe que é necessário investir, não só na formação técnica para manusear bem os equipamentos, como também no domínio pessoal.
As relações entre os diversos níveis da cadeia hierárquica e os próprios trabalhadores tendem a estreitar-se, e o que se verifica é que: «Competências e requisitos outrora pouco relevantes transformaram-se em aspectos essenciais a considerar na execução do trabalho (e.g., as competências interpessoais relacionadas com a gestão das emoções, o conflito, a comunicação e a negociação com as pessoas de diferentes culturas). Já não se requer que as pessoas executem apenas o papel inscrito no cargo – requer-se-lhes também que executem co portamentos extra-papel, ou comportamentos de cidadania organizacional.» (CUNHA, et al., 2010:178-9).
Ao líder deste século XXI também se lhe exige que tenha qualidades pessoais humanistas, competência e vontade para se relacionar, honestamente, ao nível de “pessoa-a-pessoa”, com os seus colaboradores, numa postura autêntica, sem metamorfoses, de aparentes inocências, apenas para ganhar a confiança dos seus colaboradores, obter destes todo o tipo de apoios, informações, conivências e até adesão a determinadas medidas para, logo que não precise deles, os afastar de forma desleal, incluindo os próprios colegas dirigentes, e assim controlar tudo e todos, a seu belo prazer, praticamente sem qualquer oposição.
Estes líderes, naturalmente, não prestam um bom serviço aos seus colaboradores, aos colegas, aos clientes da instituição e a esta própria. Tais líderes desempenham o seu papel prepotentemente, buscando protagonismo através de uma liderança autocrática, injusta, discriminatória, eventualmente, patológica, o que, evidentemente, é criticável e sem qualquer dúvida, condenável.
Não se pode, nem deve fazer das pessoas meros instrumentos para alimentar vanglórias pessoais, porque: quer se queira, quer não, mais tarde ou mais cedo, líderes desta natureza, quais tiranos, também caem dos seus pedestais dourados, com pilares de barro, e então quererão receber a compreensão, a tolerância e o indulto daqueles que até então humilharam, até ao sofrimento psicológico e físico. É tempo destes líderes começarem a ser inteligentes, competentes, humildes e humanos.

Bibliografia

CUNHA, Miguel Pina, et. al., (2010). Manual de Gestão de Pessoas e do Capital Humano. 2ª Edição. Lisboa: Edições Sílabo, Ldª.
MINISTÉRIO DO TRABALHO E SEGURANÇA SOCIAL (2009). LEI N.º 7/2009, de 12 de fevereiro, Artº 131º que aprova o Código do trabalho.
RESENDE, Enio, (2000). O Livro das Competências. Desenvolvimento das Competências: A melhor Auto-Ajuda para Pessoas, Organizações e Sociedade. Rio de Janeiro: Qualitymark
 

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