Naturalmente que o Estado democrático organizado pressupõe normas
jurídicas, reguladoras do funcionamento uniforme da sociedade, face ao conjunto
de bens que é necessário preservar. Os cidadãos devem pautar o seu
comportamento em função dos valores a defender, que constituem o património
nacional: da cultura à economia; da política à religião; do trabalho ao lazer;
da família à sociedade.
Dispensando-se um Estado excessivamente interventor na vida comunitária
em geral, e o mais afastado possível das iniciativas particulares, no que toca
à sua intromissão, exige-se, isso sim, um Estado atento, regulador e
fiscalizador dos interesses coletivos, intervindo apenas e tão só quando estão
em perigo valores e princípios da convivência democrática, ou interesses
legítimos e legais dos cidadãos, das empresas e das organizações.
O funcionamento da sociedade está sujeito, desde sempre, a regras que,
de mínimas, nas comunidades mais simples, se tornaram mais abrangentes e
rígidas nas sociedades modernas, o que só se consegue, ainda assim e em parte,
através de meios preventivos, persuasivos e punitivos, consubstanciados em
legislação apropriada e instrumentos de fiscalização e de força, esta quando
necessária e devidamente proporcionada, porque: «a lei tem a vantagem de tornar o procedimento mais previsível. As
ameaças que contém podem ser mais eficazes à proporção que tornam as punições
desnecessárias. Ela indica ao bom cidadão um mínimo determinado de segurança em
sua vida.» (MABBOTT, 1968:120).
No verdadeiro Estado de direito democrático, nenhum cidadão está acima
da lei, seja qual for o seu estatuto. O Estado de direito pressupõe leis
genéricas, abstratas e objetivas, de cumprimento obrigatório para todos, leis
que, elas mesmas, não podem ser arbitrárias e injustas ou violadoras dos
supremos preceitos constitucionais, dos quais o poder político recebe parte da
sua legitimidade e que, por isso mesmo, tem o indeclinável dever de ser o
primeiro a respeitar.
Verifica-se que a lei fundamental do genuíno Estado de direito
democrático é a respectiva Constituição política atendendo a que: «As democracias constitucionais ou
constituições democráticas, correspondem, assim, ao máximo de racionalização,
ou institucionalização do poder político, que é exercido em nome do povo e de
acordo com as normas estabelecidas pelo texto constitucional. A legitimidade do
poder resulta, pois, primeiro, da sua origem, o mandato popular, e, segundo, do
seu exercício em conformidade com a lei.» (CORBISIER, 1978:56).
Aos cidadãos, enquanto tais considerados, não se lhes exige formação
jurídico-constitucional aprofundada, mas ao cidadão moderno, que se deseja
implementar na sociedade atual, pede-se-lhe que aceite toda a preparação que
lhe for proporcionada pelas instituições competentes, desde logo a partir da
escola.
É essencial que, ainda que em linhas gerais, o novo cidadão tenha uma
noção sobre o que é e para que serve a Constituição política de um país, porque
a partir deste conhecimento e da sua consciente interiorização é que poderá
intervir positivamente no bom funcionamento, em primeira instância, da sua
própria comunidade, por muito pequena que ela seja.
A ideia de Constituição, enquanto Lei Fundamental que pré-ordena,
institucionaliza e disciplina o funcionamento da sociedade, à qual todas as
leis se devem conformar, pode parecer insuficiente mas, ao nível do leigo em
Direito Constitucional, já possibilita uma razoável compreensão, para um melhor
enquadramento e integração na sociedade.
Considera-se interessante deixar anotada, neste trabalho, a importância
e a necessidade da Constituição política, pelo menos quanto ao seu sentido,
estrutura e função, a partir das dificuldades de universalização de um conceito
que satisfaça todas as sensibilidades, culturas, sistemas políticos e
institucionais, tentando salvaguardar, pelo menos, o interesse na busca de um
conceito mais abrangente. Nesse sentido a Constituição política pode ser
objetivada como: «Ideia de lei
fundamental como instrumento formal e processual de garantia (…); as
Constituições podem e devem ser também programas ou linhas de direcção para o
futuro.» (CANOTILHO, (1983:65).
O cidadão luso-brasileiro, modelo que se deseja venha a ser uma
realidade, já neste primeiro quarto do atual século, tem de estar comprometido,
justamente, com o futuro, na perspetiva do total respeito pelas normas
constitucionais democráticas, livremente escolhidas pelo povo, através da
delegação de poderes nos seus legítimos representantes.
Por isso defende-se sempre a melhor formação para este cidadão, no qual
o Estado e a Constituição devem investir e consagrar direitos e deveres,
respetivamente. Para se alcançar tal objetivo importa, desde já, e em idade
adequada, aceitar-se e estudar-se a Constituição política como, a outros níveis,
nomeadamente religioso, se aceitam e estudam as grandes obras específicas e
clássicas, de uma época, de um tema, de um autor e, consequentemente, não
prescindir do estudo dos importantes livros sagrados: Bíblia, Evangelhos,
Alcorão, Novo e Velho Testamento das grandes religiões universais; tratados de
política; economia; direito, medicina, sociologia; filosofia e muitas outras
áreas do conhecimento; igualmente será essencial o ensinamento das normas
constitucionais, aos cidadãos das novas e promissoras gerações.
Neste contexto é fundamental um papel mais ativo das filosofias, na
circunstância, da educação, do direito e da religião, precisamente em
complementaridade com outras áreas disciplinares das ciências sociais e
humanas, aceitando, por exemplo, que: «A
filosofia do direito não pode ser cultivada por homens que sejam simples
juristas, terá de ser cultivada por homens que tenham alguma coisa de filósofos
e juristas, ou de juristas e filósofos; ou por homens que, sabendo alguma coisa
de Direito, tenha em si o amor da filosofia!» (MONCADA, 1955:5).
A partir do momento em que, ao mais alto nível do exercício do poder
político, se manifesta vontade inequívoca para construir uma sociedade
definitivamente democrática, na qual, todos, sem exceção, estejam em condições
cívicas de assumir responsabilidades inerentes à cidadania, a formação do
cidadão do século XXI será uma inevitabilidade, que os responsáveis devem
garantir, através da escola, incluindo as matérias jurídicas, filosóficas e
constitucionais, adequadas a cada grau de ensino e idade dos alunos e
formandos.
A consagração constitucional do direito e do dever de ensinar e aprender
representa um avanço significativo, garante estar-se no bom caminho, na medida
em que, havendo liberdade de escolha no acesso a uma formação integral, que
contemple as dimensões essenciais do homem, se poderá ter, num futuro próximo,
cidadãos menos individualistas, menos etnocêntricos e, portanto, mais abertos à
sociedade dos valores humanistas.
Conforme resulta das seguintes análises:
«Um dos aspectos da história e da
política educacionais brasileiras que tem despertado crescente atenção dos
pesquisadores é o relativo à legislação constitucional e sua contextualização
social e política.» (OLIVEIRA & CATANI, 1993:13), e que observando o
que estipula a Lei Fundamental Portuguesa: «…
a educação, realizada através da escola e de outros meios formativos contribua
para a igualdade de oportunidades, a superação das desigualdades económicas,
sociais e culturais, o desenvolvimento da personalidade e do espírito de
tolerância, de compreensão mútua, de solidariedade e de responsabilidade para o
progresso social e para a participação democrática na vida colectiva.»
(CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA PORTUGUESA, 2004: Artº. 73º, nº. 2).
O texto constitucional é, indiscutivelmente, um instrumento
poderosíssimo, que os cidadãos não podem ignorar e, sempre que possível, ou
quando as circunstâncias o justificam, invocá-lo e aplicá-lo, com o maior rigor
e civismo. A Constituição regula no presente e aponta para o futuro, o
funcionamento da sociedade, no respeito pelas liberdades, direitos e garantias,
seja no quadro coletivo público, seja no âmbito mais restrito e privado,
justificando-se a sua inclusão neste trabalho, porque se considera
absolutamente necessário o conhecimento desta realidade, seja na sua forma
escrita, seja na prática da jurisprudência. Trata-se do principal motor do
funcionamento dos elementos Estado e da Sociedade e que importam à formação do
cidadão moderno.
A Constituição, enquanto instrumento legal e fundamental para
estabelecimento de uma sociedade e do seu funcionamento político deve, em
princípio, atender às realidades existentes no espaço e no tempo, e ao povo
sobre quem vai vigorar. São conhecidas algumas dificuldades nos países
lusófonos, quando se pretende impor um determinado tipo de constituição
política, importado de outras realidades bem diferentes.
Esta preocupação de adaptação da Constituição e sua articulação com a
realidade institucional era, já no século XIX e no caso português, bem patente
em Silvestre Pinheiro Ferreira, segundo o qual: «a principal razão porque entre nós, como outros países, têm caído tão
facilmente debaixo dos mal dirigidos ataques de força bruta do absolutismo,
tantas constituições defendidas pelos homens mais ilustres, era o não se
acharem apoiadas no sistema de leis orgânicas, sem as quais é impossível
conceber a sua execução» (in CANOTILHO, 1983:137).
A posição moderada e pragmática de Pinheiro Ferreira, vem reforçar a
necessidade de se legislar, de acordo com as realidades vigentes, para que não
se verifiquem conflitos de resistência, que provocam situações que são
prejudiciais a uma sociedade, que se pretende moderna e defensora de toda uma
cultura de valores.
Nesse sentido, o cidadão que é investido em poderes legislativos e
executivos, deve não só conhecer a realidade do país, como do círculo eleitoral
pelo qual é eleito, para poder exercer as suas funções com competência,
realismo, equilíbrio e justiça. O poder deve ser desempenhado em benefício de
todos, segundo o princípio do melhor bem para todos.
O que se verifica com alguma frequência é: por um lado, uma grande
produção legislativa, face à complexidade das sociedades modernas; por outro
lado, uma preocupante revogação e ou alteração de diplomas legais, em vigor e
aprovados no passado recente, o que poderá significar entre outras
possibilidades que o legislador não conhecia suficientemente bem a realidade à
qual se iria aplicar a lei que entretanto aprovou. Se este procedimento é
grave, no que respeita às leis ordinárias, muito mais grave é no que à
Constituição se refere quando em curtos períodos de tempo se introduzem
alterações. A dúvida, porém, poderá ser esclarecida pela dinâmica da sociedade.
É com estes fundamentos que se pretende um novo cidadão, com melhor
preparação política e técnica para exercer determinados cargos. O novo cidadão
há-de de ser uma pessoa sensibilizada para a realidade do povo que serve e que
nele pode confiar pelas capacidades e virtudes que lhe são reconhecidas. Ainda
há um longo caminho a percorrer para a escolha daqueles que, democraticamente,
governam.
E para que se possa confiar nas virtualidades do regime democrático
constitucional e representativo é necessário: em primeiro lugar, formar um
cidadão que se vincule aos grandes valores e princípios de um povo, na defesa
dos legítimos interesses coletivos e particulares, quando estes não colidem com
aqueles; em segundo lugar, que haja uma preocupação político-partidária na
escolha dos seus representantes, com base nos conhecimentos técnicos,
científicos e teóricos, na comunhão de valores universais humanistas, na
autoridade reconhecida, na experiência e maturidade, na sabedoria, esta no
sentido da prudência adquirida. Alguns destes critérios, são possíveis de se
obter desde que se coloquem os cidadãos em processos de aprendizagem, sob
tutela e responsabilidade direta de órgãos credíveis, independentes e
suprapartidários.
O que seria correto e desejável é que através da preparação adequada,
quer nos partidos e forças concorrentes, quer e principalmente em instituições
do Estado, do tipo escolas de Ciência Política, fosse ministrada a formação
técnico-político-democrática de candidatos a funções políticas e que se
instituísse uma certa hierarquia dos cargos políticos, de forma a possibilitar
àqueles que se empregam, profissionalmente, na atividade política, fossem
percorrendo os diversos cargos, de tal forma que estivessem melhor preparados
para as mais altas funções da Nação. Não se deve recear a política exercida com
profissionalismo.
A análise das Constituições políticas de todas as nações não cabe no
âmbito deste trabalho, nem o autor teria essa competência, mas considera-se
assumido que nos países democráticos os direitos humanos são uma referência
constitucional obrigatória, normalmente inserida no capítulo dos Direitos,
Liberdades e Garantias.
Admitem-se maiores ou menores influências político-partidárias na
conceção da lei fundamental, porque no interior das formações partidárias
destacam-se personalidades com credibilidade suficiente para darem um
contributo mais decisivo e sensibilidade suficientes, na inclusão de
determinados preceitos constitucionais.
O conhecimento da Constituição política do país onde o cidadão
desenvolve as suas atividades profissionais, sociais, políticas, associativas e
quaisquer outras legais, é tanto mais benéfico quanto melhor se conhecerem os
responsáveis pela sua feitura, aprovação e aplicação, porque os valores e
princípios nela consagrados são de fundamental importância para desenvolver uma
praxis coerente e quotidiana.
Ainda mais importante do que o preceito legal, segundo o qual “o
desconhecimento da lei não aproveita ao seu infractor” é, de facto,
essencial conhecê-la, interiorizá-la, respeitá-la e sensibilizar os concidadãos
para igual atitude. Ora, este cidadão que se deseja, para hoje e para sempre,
será ele o primeiro a dar provas e, para o fazer, naturalmente que tem de estar
suficientemente preparado e ser visto como um exemplo a seguir, com a
preocupação de todos, no sentido de manter o modelo cada vez mais atualizado e
tendendo para a perfeição.
Bibliografia
CANOTILHO, José Joaquim Gomes, (1983). Direito Constitucional, 3ª. Edição,
Coimbra: Livraria Almedina.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, (2004),
Versão de 2004. Porto: Porto Editora.
CORBISIER, Roland, (1978). Filosofia, Política e Liberdade, 2ª Ed., Rio de Janeiro: Paz e
Terra. (Colecção Pensamento Crítico; Vol. 27).
MABBOTT, J.D., (1968). O Estado e o Cidadão, uma introdução à Filosofia Política, Trad.
Jorge Natal da Costa, Rio de Janeiro: Zahar Editores.
MONCADA, Luís Cabral de, (1955). Filosofia do Direito e do Estado, Vol.
1, 2ª. Ed. revista e acrescentada, Coimbra: Coimbra Editora.
OLIVEIRA, Romualdo Portela &
CATANI, Afrânio Mendes, (1993). Constituições
Estaduais Brasileiras e Educação, São Paulo: Cortez.
Diamantino
Lourenço Rodrigues de Bártolo
Telefone: 00351 936 400 689
Imprensa Escrita Local:
Jornal: “Terra e Mar”
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