O ordenamento disciplinador da sociedade,
encontra-se compilado em inúmeros documentos jurídicos, que, por sua vez,
obedecem a uma lei geral, na qual são consagrados: os deveres e os direitos
fundamentais, organização económica, poder político, liberdades e garantias.
Neste conjunto de normas, a Autoridade e o Direito
devem caminhar em perfeita consonância, na medida em que a legalidade e a
legitimidade daquela, advêm do Direito e da adesão popular. A eficácia das
normas jurídicas depende da intervenção da Autoridade, no quadro dos
condicionalismos normativos impostos pela tradição.
A força do Direito reside na observância habitual,
sem conflitos, e com frequente utilização das normas que ele consagra, por
parte da maioria dos cidadãos, que a ele está subordinada, contrariamente ao que
muitos possam pensar, que veem no Direito, uma consequência da violação e o
respetivo castigo, ainda que este aspeto também possa caracterizar o Direito.
Cabe aos órgãos com atribuições jurisdicionais, a
aplicação e vigilância das normas jurídicas, órgãos, por vezes, dotados de alto
grau de especialização, relativamente à fiscalização, investigação e coerção.
Tais órgãos, revestem um carácter policial e, nessa qualidade, nem sempre são
aceites, compreendidos e obedecidos pela comunidade.
Podemos entender, que a ordem jurídica deve ser
encarada como ordem prático-normativa e, como tal, existe para se cumprir, nem
verdadeiramente subsiste, senão enquanto se cumpre na realidade social. Aqui
surge outro aspeto, o qual é o da atuação do seu normativo nessa realidade,
distinguindo-se, então, os critérios de procedimento ou operatórios, e os
órgãos de atuação que se consubstanciam no ato que há-de desempenhar-se dessa
aplicação, no qual terá de ser definido, o modo de proceder, e um agente que
realize tal ato.
Ora, se o Direito é duma consequência de uma
sociedade organizada, a administração a justiça resulta da aplicação do
Direito, nessa mesma sociedade, nesta intervindo a Autoridade como primeira
avalista dos deveres, direitos, liberdade e garantias dos cidadãos.
A justiça é a outra componente, tão necessária
quanto dignificante, para a convivência intersubjetiva do homem. Quando
analisada no sentido absoluto: ela é atributo da divindade; expressa a
infalível perfeição da vontade divina; todavia, se colocada numa perspectiva ética,
enquanto conduta humana, então a justiça, adquire vários significados como
sejam: a virtude total ou perfeição moral em geral; a virtude particular que
leva a dar a cada um o que lhe pertence; ou, também, não faças aos outros o que
não queres que te façam a ti.
Ao nível da conceção filosófica, entendemos a
justiça como virtude universal, e que tem em Platão o seu grande
desenvolvimento (cf. A República)
traduzindo, em síntese, a harmonia e a hierarquia das partes no todo, o que,
levado à concreticidade da Polis,
significa que cada uma das classes sociais, deve cumprir a sua missão
específica, sob o impulso da virtude correspondente, aliás, em S. Tomás, a
justiça é considerada como virtude geral, no sentido de ordenar para o bem
comum, os atos da virtude ética, isto é, a justiça é a virtude cardeal, que
consiste na disposição da vontade de atribuir a cada um, o seu direito, ou
seja, objetivamente, o direito de cada um.
A justiça implica, também, o outro, e assim a
autoridade integra a sua essência, o que postula, igualmente, a diversidade de
sujeitos. A justiça funda-se, afinal, nas virtudes da prudência e também da
sabedoria, enquanto medida reguladora do querer e do agir e destina-se a
traduzir na conduta, a verdade do real, porque, e ainda em S. Tomás, a lei que
se afasta da lei natural, não será lei, mas corrupção desta, pelo que as leis
injustas, não vinculam em congruência, exceto se tais leis evitarem um mal
maior de desordem social geral, sendo legítimo resistir, e até desobedecer, às
leis injustas.
Direito e Justiça, só fazem sentido num verdadeiro
estado de direito, logo, numa sociedade onde os Direitos Humanos possam fazer
parte da consciência cívica dos cidadãos, onde o direito à cidadania, seja um
princípio radical de convivência democrática, e, uma vez mais, socorrendo-nos
do Preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos do Homem, encontraremos, igualmente,
um apelo segundo o qual: «... é essencial
que os direitos do homem sejam protegidos por um regime de direito para que o
homem não seja obrigado, como supremo recurso, à revolta contra a tirania e a
opressão» (in: HAARSCHER, 1993: 170).
Atualmente, há quem considere Habermas, como o principal
nome do pensamento hegeliano-marxiano que, tal como Rawls, pretende propor uma
conciliação entre o elemento liberal e o democrático, da política moderna.
Apoiando-se nos pensamentos políticos de Kant, Hegel e Marx, bem como na
Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, a qual revela
que a ignorância, o esquecimento ou o desprezo pelos Direitos Humanos, são os
grandes responsáveis pela infelicidade pública, e que estes mesmos fatores
contribuem, sem dúvida, para a corrupção dos governos.
Todo o homem tem direitos iguais e imprescindíveis,
salientando-se: a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à
opressão (Artº. 2º). A liberdade, sempre tão desejada, consiste, portanto, em
poder fazer/dizer tudo aquilo que não prejudique o outro, o semelhante. Assim
sendo, e se o exercício dos direitos naturais do homem, não possui outro
limite, que não seja assegurar que os restantes membros da sociedade gozem
deste mesmo direito, (Artº. 4º), então coloca-se a interrogação, sobre as razões
pelas quais os Direitos Humanos não são respeitados?
Rousseau, redefine a liberdade como algo que,
previamente, consiste numa autonomia pública e que pelo Artº. 11º da Declaração
dos Direitos do Homem e do Cidadão, se entende a liberdade: por um lado, sob o
ponto de vista liberal, e como um direito antecedente à constituição da
sociedade política; e, por outro lado, como um elemento do exercício da
soberania, resultando que a livre comunicação de opiniões, e de palavras, é um
dos direitos mais preciosos do homem e de todo o cidadão, portanto, falar e
escrever, estão, naturalmente, dentro dos limites estabelecidos
democraticamente, pelas leis das sociedades livres e responsáveis. Habermas vai
mais longe quando nos indica que: « (…)
ninguém deve ser molestado devido às suas opiniões, sejam elas políticas ou
religiosas, desde que a sua manifestação não perturbe a ordem política
estabelecida pela lei.» (HABERMAS, 1998:11)
O desenvolvimento das sociedades modernas, a partir
da Revolução Francesa, constitui um conjunto sequencial de mutações profundas,
implicando, correlativamente, e por via da desintegração das conceções
religiosas do mundo, uma nova cultura profana, onde se incluíram: «as modernas crenças empíricas, a
autonomização das artes e as teorias da moral e do direito, fundamentadas a
partir de princípios, conduziram à formação de esferas culturais de valores que
possibilitaram processos de aprendizagem, segundo as leis internas dos
problemas teóricos, estéticos ou prático-morais.» (Ibid.:13).
Compreensivelmente, para nós, não se colocaria,
como então, para aqueles grandes pensadores, o problema central dos Direitos
Humanos, na linha de preocupações, que hoje nos afeta, muito embora e,
designadamente, em Kant, uma teoria axiológica fosse profundamente construída,
e divulgada, através das suas obras, nas quais os grandes axiomas se mantêm
pertinentes e vigentes: «Age apenas
segundo uma máxima tal que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne
universal» (KANT (1960:14), sabendo-se que as máximas são projetos de livre
vontade, princípios humanos que é necessário distinguir, radicalmente, das leis
objetivas.
E se é certo que: no discurso da modernidade, há
uma censura, que consiste na acusação dirigida contra uma razão subjetiva, que
só denuncia, e procura abalar todas as formas de ostensiva opressão e
exploração, aviltamento e de exploração, para em seu lugar se impor o domínio
expugnável da própria racionalidade; também é verdade que a crítica dos
hegelianos de esquerda, orientada para a prática, e tendo por objetivo a
revolução, pretende mobilizar todo aquele potencial da razão.
Ora, competirá aos Estados normativizar as regras
que não só conceptualizem os Direitos Humanos, como também os imponham
coercivamente, aliás, já se fala hoje no “Direito
de Inferência Humanitária”, uma nova figura que se encontra em fase
embrionária nos grandes areópagos mundiais, onde os Direitos Humanos ganham
cada vez mais importância.
Bibliografia
HAARSCHER,
G., (1993). A Filosofia dos Direitos do Homem, Tradução, Armando F. Silva, Cap.
VI, págs. 123-140, Coleção Direito e Direitos do Homem, Lisboa: Instituto
Piaget
HABERMAS, J., (1998). Facticidade y Validez, Cap. III, págs. 147-198, Madrid: Editorial Trotta, AS,
Coleccion Estructuras y Processos, Série Filosofia,
HABERMAS,
J., (1998). O Discurso Filosófico da Modernidade, Tradução, VVAA, Cap. III, págs.
57 - 80, Lisboa: Publicações Dom Quixote, Ltdª.
KANT, Immanuel, (1960).
Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Coimbra: Atlântida.
“NÃO, ao ímpeto das armas; SIM, ao diálogo criativo/construtivo.
Caminho para a PAZ”
https://m.facebook.com/story.php?story_fbid=924397914665568&id=462386200866744
Venade/Caminha – Portugal, 2024
Com o protesto da minha permanente GRATIDÃO
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Presidente HONORÁRIO do Núcleo Académico de Letras
e Artes de Portugal
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