O homem é um fim, e não
um meio, para a concretização de uma dignidade universal e única e,
simultaneamente, o lugar exclusivo da eticidade. A pessoa é, desde logo, uma
realidade ética, o centro da irradiação dos valores morais e, na sua
transmissão, cada sujeito humano é, também, um elo da corrente intersubjetiva,
que num comportamento de reciprocidade proporciona a difusão dos princípios
fundamentais da convivência humana.
Mas o homem é, também, um
ser-com-os-outros, numa atitude dialógica permanente e, como tal, protagonista
de inúmeras atividades, especificamente humanas. A atividade política é, nesse
contexto heterogéneo, uma vertente ou dimensão do homem que, não o globalizando
nem o substancializando, não deixa, porém, de ser uma componente importante, na
caraterização do seu todo.
A pessoa humana é um ser
social e relacional, orientada para outras pessoas e, nessa relação, cada uma
toma posição relativamente às outras, por isso, só relacionando-se corretamente
é que o homem se realiza com autenticidade. A sociabilidade implica deveres e
garante direitos, mas para que estes sejam usufruídos, plenamente, e aqueles
cumpridos com rigor, é necessário que cada um trate o outro como pessoa sua
igual, numa dinâmica de “justiça-amor”.
Estes dois termos do
binómio “Justiça-Amor”, serão fundamentais para a formação da pessoa, bem como
para o desempenho do papel que socialmente lhe cabe, no âmbito da defesa e
dignificação do ser humano, na convivência quotidiana, sejam quais forem os
papéis em que ela se verifique.
Num contexto social, o
agente da Autoridade Policial, tal como qualquer outro cidadão, é sujeito de
deveres e titular de direitos. É sujeito de deveres gerais, desde logo, no
cumprimento das leis que regem a sociedade em que se integra, de acordo com os
valores coletivamente aceites, inseridos numa da cultura.
Compreensivelmente a
Autoridade Policial não pode restabelecer todas a legalidades atingidas, na
medida em que outras instituições existem para acudir aos sectores das
respectivas áreas de competência. A missão da Polícia enquanto Autoridade da
Ordem, da Segurança, da Fiscalização e do Bem-estar e Tranquilidade da
população está constitucionalmente bem definida.
Acontece, frequentemente,
que as pessoas invocam a Autoridade a propósito dos mais diversificados
acontecimentos e/ou situações, sendo muito corrente aplicar o termo no seu
sentido policial, repressivo e violento, com o objetivo de se fazerem cumprir
as leis, no respeito pelos direitos de cada um e, então, genericamente, a
Autoridade seria a capacidade de impor e influir noutros, podendo ser pessoal
ou real, respetivamente, se de um indivíduo, coletividade, de um documento ou
ainda das diversas instituições.
Os valores fundamentais
que ao homem dizem respeito, enquanto pessoa de direitos e deveres, não estão
irremediavelmente perdidos mas, talvez, preconceituosamente esquecidos, porque
certos valores referenciais a ideais absolutos, eventualmente, serão incómodos,
tais como a Família, Justiça, a Educação, a Saúde, o Trabalho, mais
avançadamente, a Cidadania Universal, a Graça Divina, entre outros, onde a
equidade de acesso à realização igualitária destes valores não está assegurada.
O ordenamento
disciplinador da sociedade encontra-se compilado em inúmeros documentos
jurídicos que, por sua vez, obedecem a uma Lei Constitucional, na qual estão
consagrados os direitos e deveres fundamentais, organização económica e
organização do poder político.
Neste conjunto de normas,
a Autoridade e o Direito devem caminhar em perfeita consonância, na medida em
que a legalidade e legitimidade daquela advém do Direito e da adesão popular. A
eficácia dos preceitos jurídicos depende da intervenção da Autoridade, dentro
dos condicionalismos legais impostos pela tradição, pelos usos e costumes,
obviamente, desde que conformes à Lei geral.
A força do Direito reside
na observância habitual, sem conflitos e com frequente utilização das normas
que ele consagra, por parte da maioria dos cidadãos que a ele está subordinada.
Contrariamente ao que muitos possam pensar, que vêm no Direito uma consequência
da violação e o respetivo castigo, ainda que este aspeto também possa
caraterizar o Direito, todavia, não será, porventura, o mais importante, nem o
seu objetivo essencial, até porque cabe aos órgãos com atribuições
jurisdicionais a vigilância e aplicação das normas jurídicas.
Reconhecer que a
Autoridade Policial é um indispensável instrumento de unidade dinâmica de
qualquer sociedade, e que visa o bem dos que lhe estão subordinados, não é
tarefa difícil, e dela resulta a definição do âmbito da sua competência, sendo
da maior importância que seja corretamente entendida e, correlativamente,
aceite no seio da comunidade em geral.
É no domínio da
investigação dos crimes contra o Estado, a propriedade e as pessoas, que a
atividade policial tem grande importância e se sente a sua necessidade, na
medida em que a utilização das táticas policiais, como estudo da aplicação dos
métodos de investigação mais convenientes, conjugados com a técnica psicológica
e processual, possibilitam, com muita frequência e eficácia, a descoberta da
verdade e a consequente punição dos autores materiais e morais do crime.
Se a ação policial não se
mostrar apta a combater o delito, principalmente o crime organizado e as
grandes organizações criminosas, assistir-se-á: por um lado, ao revigoramento
da criminalidade, com destemor e audácia, por parte dos delinquentes; e, por
outro lado, verificar-se-á um fenómeno de intranquilidade individual, coletiva
e social, de descrença na proteção pública das pessoas e bens, instalando-se um
sentimento generalizado de terror.
O agente policial
responsável, como agente livre que é, deve, todavia, dar conta dos seus atos à
autoridade superior, a fim de lhe sofrer as sanções, positivas ou negativas,
com a dignidade que distingue toda a pessoa humana de boa formação. Da
responsabilidade assumida, ou não, pelos atos praticados deriva o mérito ou o
demérito, respetivamente.
Como grande princípio,
deve o agente policial ter o hábito de: agir em conformidade com o dever,
adquirido pela repetição frequente de atos moralmente bons; obedecendo com
inteligência, amor e energia; uma conduta exemplar no sentido de se esforçar
por ser um autêntico exemplo de virtude, de boas-práticas e de atos meritórios,
a fim de melhor intervir junto da sociedade. (Cap. 6).
Do que ficou exposto, não
será legítima nenhuma ilação que aponte para uma atitude redutora da dignidade
que assiste ao agente policial mas, pelo contrário, considerando o seu duplo
papel de respeitador da ordem e disciplina estabelecidas e, fiscalizador
rigoroso dessa mesma ordem e disciplina, ele deve ser aceite como o garante do
equilíbrio e da harmonia social, desde que de fato tenha a capacidade,
inteligência e humildade para assumir as seguintes atitudes:
Tolerância e Firmeza – O agente policial
procurará, em todas as circunstâncias: ser tolerante para com os
prevaricadores, esforçando-se em compreender os motivos e as condições
concretas que levaram estes à prática de actos ilícitos, dialogando com eles,
no sentido de os esclarecer das consequências das suas ações, não os condenando
à partida nem os marginalizando, só porque são acusados de práticas ilegais,
ainda não confirmadas por uma decisão judicial e, como tais, sancionadas e
transitadas em julgado;
Pedagógica e Competente – Ao titular de funções
policiais competirá implementar uma ação de transmissão de conhecimentos, de
esclarecimento, num incessante estudo, escolha e aplicação de métodos
educativos, empreendidos em determinados quadros institucionais, tendentes a
alcançar metas socialmente definidas em bases axiológico-filosóficas e
politico-culturais;
O agente policial será,
por isso mesmo, um difusor da educação cívica de massas, porque na sua
inevitável relação com a população, ele poderá assumir uma atitude de
conselheiro, no sentido de orientar as pessoas para a prática de atos legais,
consentâneos com os valores e normas que regem a sociedade, não temendo
quaisquer usurpações de competências, por parte daqueles que, ocasionalmente,
se digam conhecedores das leis, até porque, ele, o agente policial, deve ter
sempre presente que quanto mais elevado for o nível educacional e os
conhecimentos de um povo, mais agradável e fácil se torna o relacionamento;
Cooperante e Persuasiva – Se se quiser,
etimologicamente, aceitar a cooperação como um gesto de atuação de pessoas
conjuntas, que prosseguem os mesmos objetivos, então não repugnará admitir a
intervenção policial, no seu sentido pedagógico, como uma solidariedade com os
cidadãos em geral, porque se o indivíduo e a sociedade desejam colaborar com as
Autoridades, então, não é menos verdade que o agente policial coopere com
aqueles, a fim de ajudar a resolver situações de natureza legal, justamente com
a intervenção cooperante dos interessados.
Esta cooperação recíproca
é salutar para a estabilidade da sociedade, e não deixa de provocar reações
benéficas, quanto ela parte espontânea e desinteressadamente do agente da
Autoridade e que pode, inclusivamente, conduzir à ideia de irmanação na defesa
dos direitos que a todos assiste.
Diamantino
Lourenço Rodrigues de Bártolo
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